São Paulo, terça-feira, 07 de maio de 2002

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DANÇA

Temporada paulistana começa hoje à noite, mostrando as transformações dos 20 anos de trabalho do coreógrafo

Jones abandona política e mostra o lírico

ANA FRANCISCA PONZIO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Começa hoje, no teatro Alfa, a temporada paulistana da Bill T. Jones/Arnie Zane Dance Company, que faz parte da programação Antares Dança 2002. Completando 20 anos de atividades, o grupo fundado por Jones em parceria com Zane, que morreu em 1988, mostra as transformações que a linguagem do coreógrafo ganhou com o tempo.
Quando o público brasileiro conheceu Bill T. Jones, no Carlton Dance Festival de 1990, ele representava o vigor criativo de uma geração surgida nos anos 80 -a chamada "next wave", que sucedeu os pós-modernistas. Daquela época até meados dos anos 90, Jones ampliou sua projeção internacional com coreografias que somavam beleza e sofisticação formal à abordagem de temas inquietantes, como as segregações raciais e as inseguranças provocadas pela Aids.
Hoje, embora continue expressando o mundo que o rodeia, Jones diluiu o tom político e reivindicatório para se concentrar na estrutura coreográfica, na qualidade e eloquência dos movimentos. Essa nova postura pode ser observada no programa da atual temporada, que é composta por duas peças feitas em 1996 -"Power/Full" e "Some Songs"- e duas de 2001, "Verbum" e "Black Suzanne".
Com a inteligência e o carisma de sempre, Jones sintetiza como sua linguagem mudou: "Antes eu considerava mais importante quem eram as pessoas que dançavam minhas coreografias. Hoje é o contrário: o que essas pessoas dançam se tornou prioridade".
Ao enfatizar o movimento e se despir da encenação teatral, Jones volta a se inspirar mais intensamente em seu coreógrafo predileto: Merce Cunningham, o revolucionário que revelou novos conceitos de tempo e de espaço. "A dedicação ao gesto, a busca contínua por novas maneiras de se mover no espaço continuam fazendo de Merce um artista fundamental para as gerações que lhe sucederam", afirma.
Para Jones, no entanto, as "tradições" da dança moderna americana servem de âncora para a pesquisa de um caminho próprio. De Cunningham, por exemplo, ele não aceita a ruptura com a música nem a despersonalização dos bailarinos. "Minhas referências são diferentes. Cresci dentro das culturas pop e afro-americana. Eu era ator quando passei a me dedicar à dança, influenciado pelo cinema e pela literatura."
Jones ainda se diz interessado por poesia e por relações humanas, sendo que hoje ele procura transcender política e modismos para desenvolver uma comunicação emocional através do corpo. "Minhas criações continuam falando de poder e esperança, mas de uma maneira não muito específica. Para expressar o que nos cerca, preciso de um elenco sem a homogeneidade que lhes retiraria a chance de transmitir a diversidade do mundo."
A ligação cada vez mais estreita com a música também marca a fase atual de Jones. Nas obras recentes, as composições escolhidas assumem sentido à medida que as coreografias se desenvolvem. O lirismo peculiar de Jones é outro detalhe presente no programa da atual temporada, principalmente em "Verbum", dançado ao som do "Quarteto de Cordas em Lá Maior, opus 135", de Beethoven.
Contudo, na produção atual de Jones, se sente falta da contundência do passado. Como vem ocorrendo com muitas companhias consagradas, as inevitáveis mudanças de elenco parecem prejudicar o aprofundamento dos dançarinos nas verdades dos coreógrafos. Com isso, também no grupo de Jones pairam as lacunas deixadas por seus primeiros e impactantes intérpretes.


BILL T. JONES/ARNIE ZANE DANCE COMPANY. Quando: de hoje até quinta, às 21h. Onde: teatro Alfa (r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, SP, tel. 0800-558191). Quanto: de R$ 45 a R$ 110.



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