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Existe mulher de verdade no cinema?
Abertura da temporada de verão, recheada de blockbusters e testosterona, explicita falta de bons papéis femininos em Hollywood
Meryl Streep, Angelina Jolie e as garotas de "Sex and the City" enfrentam exército de super-heróis e comediantes nas bilheterias dos EUA
MANOHLA DARGIS
DO "NEW YORK TIMES"
Homem de Ferro, Batman,
aquele homem verde sempre
zangado; a julgar pela nova
temporada dos filmes de ação, é
como se Hollywood tivesse
compreendido que a melhor
maneira de enfrentar suas dificuldades com as mulheres é
simplesmente ignorá-las -as
mulheres, quero dizer.
Não que os estúdios não tenham tentado dar destaque às
protagonistas, em filmes como
"Invasores", com Nicole Kidman, e "Valente", com Jodie
Foster. Mas depois que esses
dois lançamentos da Warner
micaram, a fofoca era que o
presidente de produção do estúdio, Jeff Robinov, havia jurado que nunca mais faria um filme liderado por uma mulher.
Um representante do estúdio
negou que isso tenha acontecido. E, francamente, é difícil
acreditar que qualquer um em
Hollywood fosse idiota a ponto
de dizer o que muita gente por
lá pensa: mulheres não são boas
diretoras, não servem como
protagonistas, são um nicho.
Ninguém gosta de admitir o
pior, mesmo quando está saltando aos olhos. Basta olhar para os filmes para perceber como nos tornamos irrelevantes.
Em momento algum, nossa
irrelevância se torna mais aparente do que no verão. Nos próximos meses, as telas vão reverberar com os estrondos de Homem de Ferro e Hulk. O sexagenário Harrison Ford estalará
o chicote como Indiana Jones.
Heróis de ação, como Will
Smith e Nicolas Cage, correrão
descontrolados, e o mesmo vale
para comediantes como Eddie
Murphy e Will Ferrell.
As garotas do verão são minoria, e as mulheres estão quase extintas. A jovem Emma Roberts interpreta uma menina
mimada em "Wild Child", e
Abigail Breslin está loira em
"Kit Kittredge". Meryl Streep
estrela a adaptação do musical
"Mamma Mia!", e o elenco de
"Sex and the City" chega à tela
grande, ainda que suas quatro
protagonistas, na verdade, sejam homens gays vestidos de
mulher. Angelina Jolie exibe
armas enormes em "Wanted".
E Cameron Diaz contracena
com Ashton Kutcher na comédia "What Happens in Vegas".
Idade de Hollywood
Em agosto, Anna Faris estrela uma nova comédia chamada
"The House Bunny", na qual vive uma coelhinha da "Playboy"
expulsa da mansão por estar
velha. Um trailer mostra Faris
reagindo com surpresa: "Mas
eu só tenho 27 anos", ela diz.
"Isso equivale a 59 em anos de
coelha", explica um amigo. Em
anos de Hollywood, também.
"The House Bunny" é produção da Sony Pictures, que, neste
verão, também lançará a mais
recente comédia de Adam Sandler, "Don't Mess With the Zohan" (co-escrita por Judd Apatow) e outros dois títulos da grife Apatow, "Step Brothers" e
"Pineapple Express".
O estúdio estréia ainda "O
Melhor Amigo da Noiva", uma
nova versão de "O Casamento
de Meu Melhor Amigo", que a
mesma casa lançou em 1997,
mas com Patrick Dempsey no
papel que foi de Julia Roberts.
Essas jogadas de reaproveitamento de material com inversão de sexo não são novidade,
mas chegaram à sua apoteose
em Apatow. Com sua corte de
comediantes talentosos, ele
contornou brilhantemente a
questão complicada das mulheres no cinema ao dar aos
seus protagonistas masculinos
os principais papéis femininos.
Só 3 no top 20
Em 2007, apenas três dos 20
filmes de maior audiência nos
EUA tinham tema feminino:
um deles envolvia uma princesa ("Encantada"), e dois outros,
histórias de gravidez ("Ligeiramente Grávidos" e "Juno").
Talvez existam mais mulheres trabalhando no setor hoje
em dia, mas ninguém adivinharia, tomando por base o que se
vê nas telas. Os motivos são
complexos: há quem aponte
para a falta de diretoras de cinema. Há quem culpe o público
feminino, ainda que o sucesso
de "Baby Mama", assim como o
de "O Diabo Veste Prada", dois
verões atrás, indique que, se algo decente estiver em cartaz, as
mulheres comparecerão.
Entre os prazeres do cinema,
estão não só os novos mundos
que ele nos abre mas os prazeres que já conhecemos, como o
de ver mulheres maiores, mais
ferozes e mais belas do que na
vida. E, quer estejamos falando
de Sigourney Weaver em
"Alien", Rosario Dawson em "À
Prova de Morte" ou Meryl
Streep em qualquer coisa, estarei lá para assistir.
O cineasta negro Tyler Perry
construiu seu sucesso em parte
sobre a verdade de que as audiências gostam de ver rostos
como os seus nas telas. Em
2008, quando temos uma mulher branca e um homem negro
disputando a presidência e
atraindo número inédito de
eleitores em parte por representarem grupos que por muito
tempo foram deixados de fora,
era de se esperar que Hollywood se tocasse.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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