São Paulo, sábado, 07 de maio de 2011 |
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CRÍTICA ROMANCE "Apego" tem história comum narrada de forma enfadonha O LEITOR TERÁ QUE ACOMPANHAR 344 MAÇANTES PÁGINAS DE RUMINAÇÕES PARANOICAS E PEQUENAS VINGANÇAS, POIS JEAN DECIDIU SOFRER CALADA. ALÉM DISSO, HÁ A OBESIDADE VERBORRÁGICA DO NARRADOR NELSON DE OLIVEIRA ESPECIAL PARA A FOLHA Nas mãos de um bom romancista, vidas comuns e tediosas sempre rendem narrativas intensas e surpreendentes. Mas "Apego", segundo livro da norte-americana Isabel Fonseca, não pertence a esse time. Protagonizado por uma jornalista superficial levando uma vida superficial, a narrativa resultou burocrática e enfadonha. Já vai longe o tempo em que a literatura ocupava-se apenas de indivíduos incomuns: deuses, reis, príncipes e grandes estadistas. A morte do poema épico e o triunfo do romance foram a causa e o efeito de uma mudança de foco: saiu de cena o sujeito extraordinário e entrou o homem comum, sem qualidades visíveis. Há mais de 150 anos essa nova força política e literária -o indivíduo comum- vem protagonizando a totalidade dos romances relevantes. Não importa se esse protagonista é um jagunço, um favelado, um estudante, um funcionário público ou uma dona de casa. O autor mostrará que atrás de uma fachada modesta há um vasto palácio existencial, um universo rico de experiências. O problema é que, depois de milhões de romances empenhados em demonstrar que as pessoas simples é que vivem crises complexas, está cada vez mais difícil surpreender o leitor. CIRANDA CHATA A situação fica pior quando o autor esquece que uma vida sem graça não pode resultar num romance sem graça, que uma narrativa sobre o tédio não pode ser tediosa. Foi o que aconteceu com Isabel Fonseca e seu "Apego". O tema é o adultério e o ciúme. Jean, uma jornalista de meia-idade, intercepta uma carta endereçada ao marido publicitário, Mark, e descobre que ele está se relacionando com uma garota 20 anos mais jovem. Jean entra em crise e passa a investigar o adultério. Em vez de confrontar o marido e tirar a história a limpo, ela decide guardar segredo. É nesse ponto que o romance desanda. No contexto da trama, "decidir guardar segredo" não faz o menor sentido. EXCESSOS O leitor terá que acompanhar 344 maçantes páginas de ruminações paranoicas e pequenas vinganças, pois Jean decidiu sofrer calada. Além disso, há a obesidade verborrágica do narrador. O resultado teria sido outro, certamente mais positivo, se o editor tivesse sugerido à autora repensar a inverossímil recusa de Jean. E, é claro, podar boa parte de sua ciranda de frívolas elucubrações. De interessante há o trabalho do tradutor, que encontrou soluções muito boas para, entre outras coisas, gírias e expressões chulas. O livro de estreia de Isabel foi a bela reportagem "Enterrem-me em Pé: A Longa Viagem dos Ciganos" (1996). O primeiro leitor de "Apego" certamente foi o marido da autora, o escritor inglês Martin Amis. Pena que isso não ajudou a salvar o romance. NELSON DE OLIVEIRA é autor de "Poeira: Demônios e Maldições" (Língua Geral), entre outros livros APEGO AUTORA Isabel Fonseca EDITORA Companhia das Letras TRADUÇÃO Alexandre Barbosa de Souza QUANTO R$ 41 (344 págs.) AVALIAÇÃO regular Texto Anterior: Crítica romance: Vila-Matas relaciona Gutenberg com Google Próximo Texto: Argentina estuda pensão a escritores Índice | Comunicar Erros |
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