São Paulo, quinta, 7 de maio de 1998

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Salmaso persegue a "alma lírica brasileira"

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Embora seja pouco conhecida, a paulistana Mônica Salmaso, 27, não é nenhuma iniciante. Trabalhando profissionalmente com música há nove anos, desde que estreou cantando na peça teatral "O Concílio do Amor" (89), de Gabriel Villela, só agora chega ao primeiro CD solo, "Trampolim".
É estréia solo a rigor, porque antes sua voz solou em "Afro- Sambas - Baden Powell e Vinicius de Moraes" (96), CD de parceria com o violonista Paulo Bellinati; participou, também, de "Notícias do Brasil" (95), de Eduardo Gudin, como uma das quatro solistas.
Mônica afirma que "Trampolim" -que ela apresenta hoje com show no Sesc Ipiranga- dá sequência a um projeto de investigação da "alma lírica brasileira" -definição cunhada pelo produtor do CD, Rodolfo Stroeter.
Tal projeto contempla cantos de trabalho de escravos, reisados, temas de domínio público, canções amazonenses, canções praieiras.
"É um olhar sobre o Brasil, sobre suas regionalidades, mas de quem está vendo de fora. O filme "Central do Brasil', de Walter Salles, é um pouco isso -ele não viveu aquilo, mas me toca, me faz chorar. Sou paulistana, nunca saí daqui, não vivi as coisas que canto -por isso é um olhar de fora."
Não se trata, porém, de um trabalho de tez regionalista: "Não queria que tivesse sonoridade regional, soaria falso. Zabumba, sanfona e triângulo não podia, ia ser mentira da boa".
Aí entrou o percussionista Naná Vasconcelos, presente em seis das 13 faixas. "Naná era justamente o que a gente precisava, é um cidadão do mundo."
Rebento de família sem tradição musical ("resolvi ser cantora aos 18 anos, mas não sabia a quem recorrer, não tinha parente, nem amigo nem primo de quinto grau fazendo música"), andou pelas aulas de canto -algumas até com Cida Moreira-, sempre sem muita pressa, segundo ela.
"Nunca tive pressa de gravar, tenho medo que saia de qualquer jeito. Minha responsabilidade é maior que minha vaidade. Hoje, acho que os selos pequenos aos poucos estão ganhando consistência, vão ficando viáveis."
A artista demonstra certo grau de "alergia" ao estrelato. "Pelo senso comum, artista é aquele que é superfamoso, que todo mundo conhece, que está na multinacional. O que me encanta é muito menos isso que o amor à música."
Ela aprofunda a reflexão sobre o relacionamento com o mercado: "As pessoas que dominam hoje a MPB são perenes, vieram por essa via do mercado e lá estão. Devem ter um jeito de se manter, que eu não sei qual é. Para os novos, para mim em particular, ficar tentando entrar é suicida".
"O mercado é um só, pequeno, não há a prática das pessoas passarem a bola, impulsionarem outros artistas. Já deve ser uma grande dificuldade se manter no lugar."
Passa, então, à contemporânea MPB. "Essa "nova MPB' me parece uma boa notícia, até há pouco estava Olimpo demais, ou você era Olimpo ou era bicho. Mas já vou sentindo que está caindo num padrão repetitivo. Vão se formando turminhas que acabam fazendo tudo parecido, o espaço recém-aberto já começa a se fechar. As padronizações agem contra a construção de identidades próprias".
Mesmo admitindo a coerência entre os dois CDs, diz que eles não bastam para definir Mônica Salmaso. "Não sinto que esses discos sejam eu. Tenho total liberdade para buscar outro caminho de repertório, se quiser. Por enquanto nem eu sei que cara tenho."

Show: Trampolim Artista: Mônica Salmaso Onde: Teatro Sesc Ipiranga (r. Bom Pastor, 822, tel. 011/3340-2000) Quando: hoje, às 21h Quanto: R$ 10


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