São Paulo, quinta-feira, 07 de julho de 2005

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MÚSICA

Projeto que começa amanhã no Sesc Vila Mariana tem exposição, shows e debate sobre o poeta da dor-de-cotovelo

Boemia de Lupicínio ganha roteiro em SP

MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL

Sobre ele, o poeta Augusto de Campos dizia que se caracterizava "pelo uso explosivo do óbvio, da vulgaridade e do lugar-comum", e o comparava a Shakespeare.
Depois de ter suas composições gravadas por todas as grandes vozes da era de ouro do rádio (Orlando Silva, Linda Batista, Francisco Alves etc.), ele passou pelo ostracismo até ser resgatado na década de 1970 por uma nova geração de brilhantes da MPB -João Gilberto, Paulinho da Viola, Caetano Veloso etc.
"Ele" é o compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues (1914-1974), homenageado do projeto "Roteiro de um Boêmio", que começa amanhã no Sesc Vila Mariana, no bairro homônimo em São Paulo.
Além de uma exposição com fotos e cartuns criados por Jaguar a partir de clássicos de Lupicínio, como "Brasa" e "Vingança", o evento terá duas séries de shows -com cantores como Cauby Peixoto, Arrigo Barnabé e Virgínia Rodrigues- e um debate reunindo o crítico musical e colaborador da Folha Carlos Calado, a professora Maria Izilda de Matos (PUC-SP) e a cantora Ivete Matos (veja quadro ao lado).
Planejado para o ano passado, quando aconteceu a dupla efeméride relacionada ao compositor (80 anos de seu nascimento e 30 anos de sua morte), mas adiado por questões diversas, o projeto dá destaque à faceta mais conhecida da obra do gaúcho, aquela associada à boêmia e à expressão "dor-de-cotovelo", criada por Lupicínio para simbolizar o efeito das mágoas de amor.
O título escolhido, "Roteiro de um Boêmio", faz referência à coluna de mesmo nome que Lupicínio assinava no jornal "Última Hora" na década de 60, onde comentava a origem de suas letras, verdadeiros retratos dos estereótipos de sua época -do malandro boêmio às damas da noite.
As histórias de traição, abandono, vingança e rancor, inspiradas na tradição do tango e do bolero argentinos, fizeram a fama que eternizou o compositor e que o leva a ser lembrado nas situações mais inusitadas, como no debate político (veja texto ao lado). Sua passionalidade está bem definida em pérolas como "Ponta-de-Lança", onde diz: "Uma pessoa prestando atenção / Vê que as rimas dos versos que eu faço / Trazem pedaços do meu coração".
Para recriar os clássicos lupicinianos -"Nervos de Aço", "Felicidade", "Esses Moços" etc.-, o evento reúne Cauby Peixoto, Carlos Fernando e Paula Lima, no primeiro fim de semana de shows, e Jamelão, Arrigo Barnabé e Virgínia Rodrigues, no segundo. A idéia, segundo o produtor Nelson Valença, é misturar intérpretes tradicionais da obra do gaúcho (como Cauby e o puxador da Mangueira) com artistas mais jovens e versados em outros estilos.
Já para explicar a obra de Lupicínio foi armada a exposição "O Poeta da Dor-de-Cotovelo", organizada pelo jornalista e pesquisador Carlos Rennó. Ela contextualiza as letras do gaúcho com pequenos textos explicativos acompanhando as ilustrações do cartunista Jaguar para cada música.
O visitante aprende, por exemplo, que a cruel "Vingança" ("Eu gostei tanto / Tanto quando me contaram/ Que te encontraram bebendo e chorando na mesa de um bar") foi composta para uma carioca que Lupicínio abandonou ao descobrir que fora enganado -e para a qual dedicou eficientemente "a maior praga que eu roguei na minha vida".

História
Para analisar o momento histórico em que Lupi criou suas obras e a influência da época em sua produção foi montada a mesa "Melodia e Boêmia em Lupicínio", que acontece no dia 16/7.
Nela, Carlos Calado e Maria Izilda de Matos discutem o cotidiano de homens e mulheres nas décadas de 1930, 40 e 50 através das letras do gaúcho -que serão interpretadas pela cantora Ivete Matos. À parte o recorte temporal, não custa lembrar que, como prova o deputado Roberto Jefferson, Lupicínio serve como espelho dos sentimentos e dos comportamentos humanos em qualquer tempo.


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