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ARTES PLÁSTICAS
Pernambucano expõe trabalhos na Pinacoteca do Estado
Artista do mundo, Gilvan Samico sai à "caça" em SP
FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A OLINDA
Diz uma lenda esquimó, sobre a
história de um famoso caçador de
renas, que um dia foi abordado
por uma ave de rapina: "Se você
não parar de matar, eu vou acabar
com você, a não ser que você dê
uma grande festa". A partir dessa
temática, Gilvan Samico, 76, realizou sua mais recente gravura, "A
Caça", peça central da mostra que
a Pinacoteca inaugura hoje. Além
da própria gravura, cerca de 30 estudos, dos 50 realizados, estarão
expostos em São Paulo.
Pois é, Samico não se inspira
apenas na temática brasileira. "Li
a lenda em "Memórias do Fogo",
organizado pelo [ensaísta uruguaio] Eduardo Galeano. Isso foi
uma inspiração", diz ele, em sua
casa-ateliê em Olinda, a poucos
passos do Mosteiro de São Bento,
de onde saiu o altar para a mostra
"Brasil, Body & Soul", no Guggenheim de Nova York (2001).
Os estudos para "A Caça" fazem
um diálogo com desenhos do artista dos anos 50, quando Samico
viveu em São Paulo e no Rio. "Em
1998, tive uma grande mostra no
Rio, com as gravuras. Quis levar
algo novo para a Pinacoteca."
Foi em 1957 que Samico deixou
seu posto de funcionário público
em Recife, com uma carta do amigo e multiartista Aloisio Magalhães (1927-82), indicando-o para
o gravador Lívio Abramo (1903-92), que vivia em São Paulo. Ganhou de Abramo uma bolsa de estudos. "Ele foi um mestre e um
amigo", relembra-se Samico.
Depois de alguns meses, o artista ruma ao Rio, em busca de emprego. Lá, chega com nova carta,
dessa vez de Abramo para Oswaldo Goeldi (1895-1961), que dava
aulas na Escola Nacional de Belas
Artes. Samico ganha nova bolsa
de estudos, mas abandona o curso para trabalhar em dupla jornada: como desenhista num escritório de arquitetura e em outro de
comunicação visual.
Aos 30 anos, Samico já havia estudado com os dois mais importantes gravadores vivos no país,
Goeldi e Abramo, mas não estava
satisfeito com sua obra. "Eu achava muito noturna, muito européia", conta. Numa das viagens de
férias em Recife, ele se encontra
com o escritor Ariano Suassuna.
"Foi dele a sugestão para observar a literatura de cordel, mas eu
não sabia por onde começar, já
conhecia gravadores populares e
não queria imitá-los. Li os folhetos e vi que, no texto sim, havia
inspiração, em como eles extrapolam o mundo real, foram as
narrativas que me interessaram",
diz Samico, em sua cozinha de
azulejos azuis, desenhados por ele
mesmo. Com "O Boi Feiticeiro e o
Cavalo Misterioso" (63), o artista
passou a usar narrativas populares como inspiração.
Samico encontrava uma fonte
de idéias, mas formalmente continuava insatisfeito. Veio então seu
eureca: "Observei as capas dos folhetos de cordel, com estruturas
rígidas, e abstraí as imagens me
utilizando das organizações gráficas". "Suzana" (66) é a obra que
marca essa mudança.
Finalmente, em 69, na Europa,
graças ao prêmio recebido no Salão Nacional, a obra de Samico
chega ao formato atual. "Buscava
papéis de grande dimensão, e os
encontrei em Genebra. Comprei
os 20 que havia lá e, desde então,
as gravuras têm esse formato."
Após a Europa, Samico, que
produzia dezenas de gravuras por
ano, passa a realizar apenas uma,
com tiragem de 120 cópias, a partir de dezenas de estudos. "Eu não
posso errar, é uma gravura que
me tortura", justifica. Com tal
método, Samico se tornou um
dos artistas mais importantes dos
últimos cem anos, segundo Ivo
Mesquita, no catálogo da mostra.
O jornalista Fabio Cypriano viajou a
convite da produção da exposição
SAMICO, DO DESENHO À GRAVURA.
Curadoria: Ronaldo de Brito. Onde:
Pinacoteca (pça. da Luz, 2, SP, tel. 0/xx/
11/3229-9844). Quando: abertura hoje,
às 11h; de ter. a dom., das 10h às 17h30;
até 3/10. Quanto: R$ 4 (grátis aos sáb.).
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