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CRÍTICA
Deboche limita experiências em comédia
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Cláudia Rodrigues é uma
humorista ótima; em "A
Grande Família" há pelo menos
meia dúzia de atores com talento
muitíssimo acima da média para
a comédia e no entanto... Por que
ambos os programas são "quase
bons"? (Por "quase bons" entende-se aquela coisa que saiu há
tempos da precariedade, mas ainda não chegou exatamente lá.)
Não é a primeira vez que esta
coluna chama a atenção para um
certo desenxabimento dos roteiros de comédia. É o texto, ou seja,
roteiros e diálogos irregulares,
que mantêm "A Diarista" e "A
Grande Família" ainda no perfil
de "quase bons".
Em ambos, a qualidade do roteiro fica bastante aquém do que
outros elementos conseguiram
consolidar e aperfeiçoar. Cláudia
Rodrigues começou com uma interpretação meio caricata (ainda
que boa), mas evoluiu para um tipo paródico muito interessante.
Os coadjuvantes fixos encontraram personalidade. E olhar irônico para o mundo das "patroas",
mesmo que aqui e ali resvale no
populismo, conseguiu entrar
num território mais sutil de crítica.
Em "A Grande Família" deu-se
algo parecido, e, já há um certo
tempo, a atração se fixou como
uma alternativa simpática. O
elenco é, de fato, excelente e foi se
afinando com o tempo. O subúrbio estilizado, quase "camp", faz
uma espécie de síntese quase que
atemporal e ageográfica (as referências são embaralhadas de propósito) da universo da classe média baixa.
Ou seja, tanto "A Diarista"
quanto "A Grande Família", em
tese, teriam condições de realmente se destacarem na programação e, mais, inaugurar um formato brasileiro de comédia seriada. Só que para isso o roteiro teria
que dar realmente um bom salto.
Na verdade, dois: um técnico, do
modo de fazer, e outro, como dizer, ideológico.
As falhas de construção são várias, mas não graves, e se repetem
nos dois programas. Há, às vezes,
criatividade para criar a situação,
mas o desenvolvimento perde o
ritmo; a noção de absurdo resvala
no excessivamente inverossímil e,
portanto, quase infantil; diálogos
poderiam ser mais ácidos, mais
inteligentes, mais críticos.
Mas talvez o principal seja repensar que tipo de humor se faz, e
essa questão, além de mais complexa, não é exclusiva nem só desses
dois programas nem só da televisão.
Parece que pesa, sobre o humor feito no Brasil em geral, a obrigatoriedade de ser debochado e desaforado. Fora disso, arrisca-se muito
pouco e quem arrisca, como fazia a
"TV Pirata", corre o risco de ser tachado de elitista.
OK, deboche é uma possibilidade
de humor, sim, e muito constitutiva
da cultura brasileira, mas não deveria ser a única. O formato de seriado
exige uma variedade muito grande
de alternativas para ter fôlego e não
se tornar repetitivo. O problema do
deboche é que ele sempre faz rir do
outro e quase nunca de si mesmo,
que é uma fonte mais rica e variada
de situações humorísticas.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
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