São Paulo, sábado, 07 de agosto de 2010

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8ª FESTA LITERÁRIA INTERNACIONAL DE PARATY

Moser vê Gilberto Freyre "mal resolvido"

Biógrafo de Clarice Lispector diz que FHC foi "elogioso" com pernambucano porque, como político, "mede as palavras"

Recebido com mimos na Flip, após ter vendido 30 mil livros, americano diz ser jovem e não estar acostumado ao assédio


Letícia Moreira/Folhapress
O escritor americano Benjamin Moser, 33, na pousada onde está hospedado em Paraty

FABIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A PARATY

Benjamin Moser é magro e tem 1,96 m, anatomia que torna ainda mais árduo caminhar pelas pedras irregulares de Paraty.
Mas o escritor e crítico americano diz que pegou o jeito. É, afinal, a sua quarta vinda à festa, a primeira como convidado -participa amanhã, às 16h30, da mesa "Nacional, Estrangeiro", com o professor e tradutor alemão Berthold Zilly.
De certo modo, a estreia na Flip, em 2005, pavimentou o caminho de Moser até o convite de agora. Daquela vez, às vésperas do início da edição que homenageou Clarice Lispector, ele foi convencido por um amigo que a viagem seria fundamental para sua pesquisa sobre a escritora.
"Imagine todos os clariceanos devotos numa cidade com três ruas. Voltei para casa com 50 kg de livros, só não paguei excesso porque a funcionária da companhia aérea era admiradora de Clarice", relembra.
Quatro anos mais tarde, em 2009, Moser lançou pela Cosac Naify a sua biografia da autora de "A Hora da Estrela", que já vendeu 30 mil exemplares, cifra maiúscula para obra do tipo.
E a relação do autor com o Brasil mudou. "Como dizem aqui, daquela vez vim como pessoa física. Agora estou aqui, nesse sofá, dando entrevista", disse anteontem à noite, no casarão alugado pela Cosac em Paraty.
"Sempre me senti muito em casa no Brasil, mas agora sou tratado de senhor, tenho carro me esperando em frente ao hotel, estou na mídia. Tenho 33 anos, não sou acostumado a isso. Sinto-me mais velho, porque as pessoas me tratam assim", reclama, com certo charminho.
Mas Paraty está fora disso. "Aqui não é um lugar cerimonioso, é muito gostoso. É a minha gente. São pessoas empolgadas pelo livro e pela literatura."
Moser afirma, entretanto, não se sentir muito à vontade como "embaixador da cultura brasileira" (aspas dele). "As pessoas vêm me falar de capoeira, não sei nada sobre capoeira. Perguntam por que não faço a biografia daquele que foi assassinado na Amazônia [Chico Mendes]. Não sou o Ministério do Turismo, minha ambição é menor."

FREYRE MAL RESOLVIDO
Nas últimas semanas, Moser mergulhou na leitura de Gilberto Freyre. Escreveu um ensaio no caderno Ilustríssima com fortes críticas ao conservadorismo do homenageado da Flip 2010.
E vai, também amanhã, mediar uma mesa sobre a atualidade do sociólogo.
Para quem acha que Fernando Henrique Cardoso pegou pesado com Freyre na abertura da Flip, Moser é muito mais áspero. Ele interpretou a conferência do ex-presidente como "elogiosa".
"Ele [FHC] é um político, que mede as palavras para não ofender ninguém", diz. "A ideia de miscigenação de Freyre era politicamente útil", sustenta.
"E a violência da escravidão é a mesma que o Brasil vive ainda hoje", diz o americano, para quem Freyre era um "mal resolvido".


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