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CINEMA/ESTRÉIA
"O AMOR NA CIDADE"
"Revista" traz Antonioni e Fellini, entre outros, e mostra vitalidade da produção italiana da época
Episódios revelam embate com o real
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
A idéia de "O Espectador"
era compor uma ambiciosa
"revista cinematográfica", tendo
por objetivo retratar a vida realisticamente, sem maquiagem.
Não é preciso dizer qual o tema
de "O Amor na Cidade", primeiro
(e aparentemente último) número dessa revista. O essencial, no
caso, é o desfile de cineastas relevantes do período: Carlo Lizzani,
Michelangelo Antonioni, Dino
Risi, Federico Fellini, Francesco
Maselli, Alberto Lattuada.
Como em todo filme de episódios, o resultado tende a ser desigual, e não surpreenderá a ninguém que os episódios de Antonioni, Dino Risi e Fellini sobressaiam claramente no conjunto.
São, do grupo, os cineastas que
melhor resistiram ao tempo. E o
que o filme nos dá é a oportunidade de observar temáticas e modos
de abordagem do cinema a que
voltariam mais tarde.
Antonioni trabalha sobre uma
geração entre o ser e o não-ser,
que toma as rédeas da própria vida, uma vez terminada a guerra, e
chama a si a responsabilidade de
decidir se deve ou não viver.
Fellini se mostra auto-referencial, como de hábito, ao tratar de
um repórter que visita uma agência matrimonial e busca descobrir
o que levaria uma jovem a se casar
com um imaginário homem rico
que, às vezes, se transforma numa
espécie de lobisomem.
Risi descreve as atividades de
uma danceteria, os encontros e
desencontros que ali se produzem. É o mais feérico dos episódios e anuncia em alguns aspectos
seu filme mais célebre: "Aquele
que Sabe Viver" (1962).
Se Antonioni investe na tênue
distância que separa o real do
imaginário, Fellini mostra sua
perplexidade diante de um mundo em transição e, à sua maneira,
investe na ausência de linha divisória entre mundo real e mundo
sonhado. Risi, por fim, constata a
capacidade (ou não) de cada pessoa para enfrentar o mundo.
Há ainda um aspecto a relevar
nesse conjunto interessantíssimo:
a preocupação expressa pelo locutor de que se está mostrando
um mundo real, desprovido de
estrelas, feito de gente comum.
Tanta atenção ao assunto revela
bem como o neo-realismo já duvidava nessa altura da capacidade
do cinema de captar e absorver algo definível como real.
Justamente por se tratar de um
filme de episódios, fica mais fácil
notar a diferença entre o real que
de fato interessa (pois formula
uma verdade cinematográfica) e
um puramente descritivo. É impressionante a vitalidade do cinema italiano do período, o que torna estranha sua decadência atual.
O Amor na Cidade
L'Amore in Cittá
Direção: Michelangelo Antonioni,
Federico Fellini, Marco Ferreri e outros
Produção: Itália, 1953
Com: Rita Josa, Rosanna Carta
Quando: a partir de hoje no Studio
Alvorada
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