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São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2003

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5ª Bienal traz Christian de Portzamparc, defensor da integração entre rua e edificações

Arquitetura de portas abertas

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em uma semana, São Paulo torna-se a capital da arquitetura. Durante 50 dias, mais de 300 arquitetos, brasileiros e estrangeiros, vão expor seus projetos mais ousados na 5ª Bienal Internacional de Arquitetura e Design (BIA), nos 26 mil m2 do pavilhão da Bienal, no parque Ibirapuera.
Como em qualquer bienal, há de tudo um pouco. De projetos de estudantes a obras de arquitetos consagrados como o inglês Peter Cook e a iraquiana Zaha Hadid. A concentração de Pritzker, o Nobel da arquitetura, não é pequena. Pelo menos seis dos 25 ganhadores do prêmio, criado em 1979, estarão presentes: Norman Foster (99), Oscar Niemeyer (88), Álvaro Siza (92), Christian de Portzamparc (94), Sverre Fehn (97) e Renzo Piano (1998).
Portzamparc participa com o projeto para a Cidade da Música, que deve ser inaugurado no Rio de Janeiro em 2005. A encomenda tem por base o sucesso de um projeto semelhante, a Cité de la Musique, no parque La Villette, em Paris, criada em 1984. Ele é o único dos que receberam o Pritzker a participar do fórum de debates da BIA, no dia 19, às 14h, no pavilhão da Bienal.
Na mostra, o arquiteto francês comparece com uma sala especial junto com a mulher, Elizabeth, brasileira que se dedica mais à área de design. Por isso, o casal participa no módulo de Arquitetura e Design, um dos oito da BIA. Na última terça, Portzamparc, responsável também pela torre do conglomerado LVMH, em Nova York, conversou com a Folha, por telefone, de seu escritório em Paris. Em português fluente, ele contou sobre o que vai apresentar na Bienal e o projeto no Rio. Leia a seguir os melhores trechos:
 
Folha - O que o sr. irá mostrar em São Paulo?
Christian de Portzamparc -
A exposição foi organizada a partir de outra mostra, feita no Paço Imperial, no Rio, no início do ano. Há três salas. Uma com obras minhas, outra com trabalhos de Elizabeth, e a terceira são projetos comuns. Indico que meu assunto é a relação entre arquitetura e urbanismo. Um dos ideais da arquitetura moderna é um desligamento entre a arquitetura e a cidade, o que acho um erro. Minha pesquisa sempre leva em conta a situação específica onde o projeto deve acontecer, pois, desde o início, percebi que a riqueza do contexto, seja geográfico ou histórico, não pode ser deixada de lado. Levei isso muito em conta no projeto do Rio e, por isso, é a primeira obra para quem entrar em minha sala.

Folha - E como o sr. criou a Cidade da Música, no Rio?
Portzamparc -
Lá a questão foi de filosofia estética. Sobrevoei a cidade junto com o prefeito [Cesar Maia] e constatei que a Barra não possui nenhuma marca especial, seja natural ou arquitetônica. Por isso, achei que o prédio deveria ter uma posição simbólica. Ele estará elevado a dez metros do chão, com um pé direito de 20 metros. Dele será possível observar as montanhas, criando um novo diálogo. Creio que será uma grande varanda brasileira, que pode parecer inspirado nas obras de arquitetos como Niemeyer, [Lúcio] Costa e [Affonso Eduardo] Reidy, mas não foi meu propósito. A obra surgiu a partir de minhas reflexões de vazio e do pleno, de uma geometria de curvas que se completam como o yin e o yang.

Folha - Joel Sanders, curador de Nova York na Bienal, afirma que a arquitetura é responsável por criar identidade na cidades, mas que também corre o risco de criar espetáculos, como o caso de Frank Gehry, em Bilbao. O sr. concorda?
Portzamparc -
Há sempre o risco do exagero da má arquitetura que tem uma presença forte e do arquiteto que faz a obra como espetáculo. Na Barra, por exemplo, há grandes volumes arquitetônicos, que são caixas sem preocupação externa. Isso não é espetáculo, mas não resolve o problema. O museu de Gehry deve ser bem visto, pois tem uma grande magneticidade e funciona no local. Em Nova York, isso já é mais difícil de ocorrer e, por isso, procurei fazer a torre da LVMH bem integrada àquela quadra. É uma questão de relação. No Rio, assumi uma presença forte e um pouco espetacular, pois, do contrário, o prédio não teria visibilidade. O importante é a relação com a cidade.

Folha - O sr. pode falar um pouco sobre o conceito de quadra aberta?
Portzamparc -
A origem dessa idéia vem da pesquisa que desenvolvo sobre a cidade. O urbanismo moderno recusou as ruas e quadras, valorizando os grandes edifícios. A idéia dos modernos estava centrada em retirar da cidade seu passado para transformá-la numa utopia total, na qual a cidade era um elemento funcional. Mas ela é muito mais complexa. A possibilidade de existência de vários conjuntos distintos é fundamental para entender a cidade como um processo e não como algo pronto. A quadra aberta é a possibilidade de inserir prédios isolados, mas que estejam conectados com a rua, com espaços como jardins, que garantem um espaço público que possa ser usado por todos os cidadãos.


5ª BIENAL INTERNACIONAL DE ARQUITETURA E DESIGN. Mostra com obras e projetos de mais de 300 arquitetos e designers. Curadoria: Pedro Cury e Ricardo Ohtake. Quando: abertura dia 14 (para convidados); seg. a qui., das 9h30 às 23h; sex. a dom., das 9h30 às 24h. Até 2/11. Onde: pavilhão da Bienal (parque Ibirapuera, portão 3, SP, tel. 0/ xx/11/5574 5922). Quanto: R$ 10.


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