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MÔNICA BERGAMO
bergamo@folhasp.com.br
Fotos Roberto Price/Folha Imagem
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Deborah Colker faz os últimos ajustes na coreografia de "Cruel", antes de estrear em SP
Ensaio com Deborah Colker
Primeira mulher a dirigir um espetáculo do Cirque du Soleil, a coreógrafa brasileira Deborah Colker divide-se entre o Canadá, para onde se muda em 2009, e o Brasil, onde acompanha a montagem "Cruel", que estréia em São Paulo no dia 12
Atrasada para a aula de balé
clássico junto à companhia de
dança que leva seu nome, na
quarta-feira, no Rio, a bailarina
e coreógrafa Deborah Colker
passa correndo pela sala de ensaio em direção ao escritório.
"Começa, começa. Não me espera, não." Três dias antes, ela
estava em Montreal, acertando
detalhes do primeiro espetáculo que dirigirá para o Cirque du
Soleil. Enquanto isso, seu corpo
de baile excursionava pelo nordeste brasileiro com a peça
"Cruel", que estréia no dia 12,
no teatro Alfa, em São Paulo.
No galpão espelhado e com iluminação natural, a primeira
bailarina do Teatro Municipal
do Rio, Nora Esteves, mostra
aos 16 dançarinos que se alongam nas barras móveis os primeiros movimentos que serão
trabalhados no dia. "E um e
dois e plié, relevé...estica." Deborah se incorpora ao grupo
para também fazer a aula.
A aluna-mestra tenta acompanhar a turma com movimentos exagerados. Perde o compasso do grupo. "Baixinho, Deborah. Não precisa saltar tão alto", orienta Nora. A seqüência
de exercícios é tão puxada que
uma bailarina cai no chão, zonza, após uma série de rodopios.
Deborah não sossega. Nos rápidos intervalos da aula, aproveita para preparar a aula que dará
em seguida. Emenda passos de
xaxado ao balé clássico, ondula
o corpo de forma sinuosa, contorce o braço por detrás da cabeça e faz movimentos bruscos
com as pernas. "Ela sempre cria
na hora", conta a assistente Karina Mendes. A música clássica
dá espaço a um rap americano.
Deborah assume o comando.
"Vai, abraça. Redondo! Balança, balança, pressão! Cresce",
orienta.
A filha, Clara, 24, coordenadora do Centro de Movimento
Deborah Colker -misto de escola de dança e centro cultural
que leva o nome da coreógrafa
no bairro da Glória-, aproveita
uma pausa do treino para pedir
um espaço na agenda da mãe.
"É difícil a gente conseguir conversar. Ela está sempre trabalhando", diz ela, que preferiu
estudar design a seguir a dança.
"Você passaria o dia todo rolando e suando? Eu, hein! É ralação demais! Fora que ser da
companhia da minha mãe não é
mole, não. Ela é uma carrasca."
Durante os ensaios de
"Cruel" e "Rota", espetáculo
criado em 1997, no qual os bailarinos se movimentam em
uma roda de ferro e que ainda
hoje excursiona mundo afora,
Deborah é só sorrisos. "Ela anda bem humorada", diz um bailarino. E um tanto distante do
dia-a-dia da própria companhia. Desde o começo de 2007,
quando aceitou o desafio de ser
a primeira mulher a dirigir um
espetáculo do Cirque du Soleil,
ela viaja mensalmente ao Canadá, para onde se muda em janeiro para acompanhar os três
últimos meses de ensaio.
"O espetáculo é uma coisa viva, como um bebê. Ele vai se
modificando com o tempo,
mesmo depois da estréia. A
gente precisa ficar atento", afirma Deborah, que contará com a
ajuda da ensaiadora Jacqueline
Motta para, digamos, incrementar o rebolado dos 44 acrobatas da trupe, "pouco acostumados a fazer movimentos diferentes de seus números".
Marcado para estrear no dia
23 de abril, em Montreal, o novo show do grupo circense, inspirado no mundo dos insetos, já
tem turnê programada. Primeiro, vai para Toronto e Quebec.
Depois, faz seis cidades americanas, entre elas Los Angeles,
NY e San Francisco, e parte rumo à Ásia. O Brasil, por enquanto, não faz parte dos planos. "Seria bom, né", diz ela,
sem saber ao certo por onde começar para fazer o lobby dentro da estrutura internacional.
"São tantos departamentos...".
Enquanto analisa no computador o DVD com o teste de um
dos últimos palhaços a serem
contratados, Deborah discorre
sobre seu "grande bebê", o Centro de Movimento. "A escola
não dá sucesso, não dá dinheiro, mas é uma cozinha que une
conhecimento com experiência criativa", afirma. Segundo
ela, mais de 70 alunos hoje são
bolsistas, sem que haja qualquer parceria com ONGs. "Não
viso só quem quer ser bailarino,
mas quem quer dançar. Porque
a dança está ligada à saúde do
corpo e do espírito."
No fim do dia, um fã pede para vê-la. Diz que é artista plástico, figurinista, maquiador e
que, mesmo sem saber "fazer
uma pirueta", adoraria ter
"uma bolsa de estudos porque
gosto de dança". Deborah não
perde o rebolado. "Olha só, eu
acredito no escambo. Temos
uma apresentação com 200
alunos da escola no fim do ano e
vamos precisar de mão-de-obra", dá a deixa. "Odeio mendigo, pedinte. As pessoas têm
que ter vontade de trabalhar."
"Faz uma semana que não
vejo "Cruel", fico com uma saudade!", diz a ex-jogadora de vôlei e pianista, que começou a
coreografar para o teatro nos
anos 80, a convite de Dina Sfat.
O início da temporada paulista
deixa Deborah tensa. "Parece
que estamos estreando de novo", diz, sobre a peça que de fato já excursiona pelo Brasil desde março. Segundo ela, "Cruel"
nasceu do espetáculo "Nó"
(2005), que falava do desejo.
"Fiz uma lista do que é cruel, a
vida, o amor. Tem coisa mais
cruel do que o espelho?", pergunta, citando um dos objetos
cênicos da montagem. Desta
vez, o espetáculo é cruel também para ela. Afinal, é o primeiro em que não estará no palco
como bailarina.
Reportagem de JULIANA BIANCHI
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