|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Mestres das HQs, Dave McKean e Neil Gaiman experimentam o cinema com a fábula
"MirrorMask'; leia entrevista exclusiva com o ilustrador britânico
Caçadores de SONHOS
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
O traço etéreo, com toques surrealistas e góticos, do ilustrador
britânico Dave McKean, 41, deu
vida a uma série de obras que está
na lista de favoritos de qualquer fã
de quadrinhos adultos, como
"Orquídea Negra", "Asilo Arkham" e "Sandman" -histórias
premiadas e aclamadas pela crítica. Na visão do próprio artista, no
entanto, essas obras são "incompletas", "não funcionaram" e são
"coisas do passado".
A autocrítica apurada também é
aplicada a "MirrorMask", seu primeiro longa como diretor, que estreou nos EUA no mês passado e
ainda não tem previsão para chegar ao Brasil. A história criada por
McKean e seu parceiro mais constante, o escritor Neil Gaiman (assinam juntos o roteiro), é uma fábula que narra as aventuras da
adolescente Helena, vinda de uma
família circense, em um mundo
de sonhos e personagens fantásticos. Em entrevista à Folha,
McKean falou sobre o filme, sobre
sua carreira e sobre sua relação
com a crítica e com os fãs.
Folha - Como surgiu o projeto de
"Mirrormask"?
Dave McKean - Começou com
Lisa Henson [produtora do filme,
filha de Jim Henson e diretora da
companhia que leva o nome de
seu pai], que queria fazer outro
filme na linha de "O Cristal Encantado" (1982) e "Labirinto"
(1986). Ela conhecia Neil e tinha
visto meus curtas, que eu fiz praticamente sem orçamento. Nós três
começamos a conversar sobre como fazê-lo, Lisa estava interessada em um filme de fantasia para a
família. Era o que Neil e eu sempre quisemos fazer, tudo pareceu
se encaixar.
Folha - E você está satisfeito com
o resultado?
McKean - É muito difícil responder a isso, porque o filme se estendeu por muito tempo e eu me envolvi em cada etapa, então, bem
antes de acabar, eu estava realmente cansado dele. Ele tem algumas coisas boas e pouco comuns,
acho que fizemos o orçamento
render, a atriz principal [a jovem
Stephanie Leonidas] está maravilhosa. Acho que, só de ter conseguido completar um filme muito
difícil, estou em uma posição melhor para tentar de novo. Quanto
à reação do público, está fora do
meu controle agora, não há o que
fazer, não adianta pensar nisso.
Folha - A relação de um diretor
com seu público é comparável à de
um autor com seus leitores?
McKean - Acho que são duas coisas bem diferentes. O mais próximo que chego de meus leitores é
quando estou autografando livros
em alguma feira. As pessoas estão
passando, pegam um livro em exposição e compram ou não, dependendo do quão interessante
acham que ele é. Não é uma análise sobre seu trabalho, porque elas
só vão ler depois. Assistir a um filme junto da platéia é como participar de um júri, você é julgado a
cada momento, pela reação do
público. É massacrante.
Folha - E a relação com os críticos?
McKean - O mundo da literatura
é muito gentil -se você está lançando um livro, a menos que seja
um desses "blockbusters", geralmente os críticos que escrevem
sobre ele são pessoas que se interessaram, leram e decidiram comentar, então você geralmente
recebe críticas positivas. Mas a
crítica de cinema é completamente diferente: todo lançamento precisa ser visto e criticado, então os
críticos muitas vezes acabam vendo filmes que não os interessam e
suas críticas refletem isso.
Folha - Há semelhança entre criar
imagens no papel e na tela?
McKean - Sim, alguns aspectos
são idênticos. Trabalho com imagens, idéias e coisas de que gosto.
"Mirrormask" tem muita coisa
que já estava em "Cages", como as
cidades abandonadas, a relação
entre as pessoas, máscaras, chaves. Mas há também diferenças:
trabalho sozinho para criar um livro, não preciso me justificar todo
dia e, acima de tudo, posso fazer
isso sozinho. Em um filme, há
muita gente e muito dinheiro envolvido, então eu dependo de
mais pessoas, sou um empregado.
Folha - Vai haver um filme de
Sandman?
McKean - Não sei. Sei que já houve duas ou três tentativas de iniciar esse projeto e sei que, atualmente, não há ninguém trabalhando nisso. Acho que Neil prefere que não seja feito um filme de
Sandman, a menos que um diretor do tipo Peter Jackson, que fosse realmente apaixonado pela história e extremamente talentoso,
decidisse fazer outra trilogia de
US$ 1 bilhão [como "O Senhor
dos Anéis"], aí então valeria a pena. Não tenho uma opinião sobre
isso. Para mim Sandman é algo
que acabou há oito anos.
Folha - Você não se acha excessivamente autocrítico?
McKean - Acho que é preciso ser
honesto consigo mesmo sobre
seu trabalho. Não sou um perfeccionista ridículo que vive completamente infeliz com tudo o que
realiza, fiz algumas coisas que
acho realmente boas, que atingiram seu objetivo, como "Cages".
Se as pessoas lêem "Orquídea Negra" e gostam, ótimo, porque
houve muito trabalho e raciocínio
ali. Mas o fato dos leitores gostarem não tem nada a ver com o que
eu sinto sobre o trabalho -no caso, acho que não exploramos totalmente as possibilidades dos
quadrinhos ali. Pessoalmente,
não me imagino fazendo quadrinhos "mainstream" de novo, para
editoras como a DC. Acho que
histórias de super-heróis como
"Asilo Arkham" são basicamente
infantis, então, se for para fazer algo assim, prefiro criar histórias
para crianças mesmo, como fizemos em "Coraline" ou "The Wolves Behind the Walls".
Texto Anterior: Programação de TV Próximo Texto: Mônica Bergamo Índice
|