São Paulo, sexta-feira, 07 de outubro de 2005

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CINEMA/"O CORONEL E O LOBISOMEM"

Fiel ao original, Maurício Farias estréia na direção com adaptação de livro

Comédia aposta em humor no jeito de falar

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Co-autor com Milton Nascimento da trilha sonora de "O Coronel e o Lobisomem", Caetano Veloso foi quem melhor apontou, em entrevista coletiva, qual a diferença básica entre esta adaptação do romance de José Cândido de Carvalho, anunciada como uma "comédia fantástica", e "O Auto da Compadecida" e "Lisbela e o Prisioneiro", dois bem-sucedidos produtos que, seja na direção, no roteiro ou na produção, levam a grife Paula Lavigne-Guel Arraes:
"São filmes baseados em clássicos da literatura moderna brasileira, com uma marca de comédia e, sem dúvida nenhuma, fazem uma trilogia neste sentido. Mas este filme é baseado num livro com mais trabalho de linguagem do que mera fabulação de peripécias", disse o cantor, explicando a ressalva da produção de que o filme não é uma comédia rasgada.
"A prosódia é belíssima e foi mantida no filme, que, em certa medida, é mais literário. A literatura é personagem, mais do que em "O Auto" ou "Lisbela"."
Usada sobretudo pelo protagonista coronel Ponciano (Diogo Vilela), a tal prosódia de que fala Caetano é parente próxima da empolada fala do prefeito Odorico Paraguaçu, de "O Bem Amado", de Dias Gomes, curiosamente o futuro projeto da grife. Para Vilela, que defendeu uma voz empostada, "envelhecida" para seu personagem, e suou para, de charuto na boca, pronunciar os neologismos criados, a fala pode ser inteiramente compreendida, apesar do estranhamento inicial.
"Sem querer ser ufanista, a brasilidade do filme está nessa linguagem. No começo você acha estranho, mas depois gosta de ouvir aquilo. Quando eu li o roteiro, achei que seria difícil. E é. Mas é o difícil que emancipa a gente."
Para Selton Mello, que vive o antagonista de Ponciano, o português rebuscado ajuda os atores a embarcarem na fantasia de Carvalho. Ana Paula Arósio, que vive a mocinha Esmeraldina, vai além: para ela, o público incorpora o código. "O espectador é um pouco como o leitor do livro. Você imagina: "Nossa, eu nunca ouvi essa palavra ou alguém falando isso". Mas, aos pouquinhos, você começa a antecipar que palavras essas pessoas vão usar e que colorido elas vão dar às falas", diz.
Esta é a terceira adaptação do romance de Carvalho -as outras foram feitas respectivamente por Alcino Diniz, em 1979, para o cinema, e por Chico de Assis, em 1982, para a TV. O desafio, no entanto, não estava no passado, mas no presente. Veterano na televisão, Maurício Farias estréia na direção com "O Coronel e o Lobisomem", tentando imprimir uma marca pessoal numa equipe com vasta capilaridade: dois produtores (Paula Lavigne e Guel Arraes) e três roteiristas (Arraes, João Falcão e Jorge Furtado).
Segundo ele, a repetição no cinema da parceria com Arraes na TV, que data dos anos 80 com o humorístico "TV Pirata", teria trazido liberdade. "O Guel é um artista com caminho bem definido, e os trabalhos de que ele participa como produtor levam a marca dele. Mas o elenco foi escolhido por mim, não por ele. A discussão com ele e também com a Paula foi de igual para igual. Considero o filme meu. O que não é meu é o texto ou a produção. Mas o ritmo, o enquadramento, a equipe são."
A experiência na TV, conta Farias, tem seus reflexos no seu début em longas. O diretor diz que a forma de narrar e dirigir de "A Grande Família", por exemplo, e o filme é a mesma. A diferença é que, em "O Coronel e o Lobisomem", ele teve mais tempo.
"Num certo sentido, a TV é uma forma sintética de fazer a mesma coisa, com particularidades, mas a linguagem é igual. Uso os mesmos elementos, só vario a escala."


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