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Crítica/Arte
Waltércio Caldas ilumina o mistério do desconhecido
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
E se o "possível" não fosse algo que ainda não é,
mas sim o próprio ser?
E se o "ainda" não fosse o inconcluso, mas fosse o estado
mesmo das coisas? O livro de
Waltércio Caldas, "Notas, ( )
etc.", mostra esse lugar, "entre
as nuvens e as dízimas periódicas", um lugar cujo nome está
no "espaço entre as coisas".
A começar pelo nome do livro -nome, e não título, porque o nome também parece
emanar das próprias coisas, enquanto o título é exclusivamente externo- "Notas": pistas, sinais; "( )": intercalação, intervalo, a importância do que não é
tão importante; "etc.": o restante, o além. Três marcas intervalares, não essenciais, transformadas em protagonistas. É como dar voz ao vazio, ao silêncio,
ao intervalo. Não fazer barulho
para não interromper ou para
não acordar o sono das coisas.
Por isso, pode-se dizer que há
um idealismo na materialidade
dos objetos, dos desenhos e das
frases de Waltércio. Um desejo
de encontrar uma verdade na
existência dos objetos e em
seus nomes; de encontrar a
coincidência perfeita entre
eles, como se aquele nome daquela coisa fosse sempre necessário e não arbitrário. Um espaço onde as coisas são como
idéias delas mesmas e uma tentativa de transformar o visível
em invisível e o invisível em visível.
Essa busca de uma verdade
nem por isso se traduz em certezas; ao contrário, ela solicita a
dúvida para poder se realizar
plenamente: "Há uma dúvida
que pertence à clareza"; "(ver,
inacabando...)". O gerúndio, os
parênteses, as reticências, a
brevidade das frases no espaço
branco da página, tudo aponta
para aproximações por hipótese, por tentativa e não por tiros
certeiros. O que tampouco
ameaça a sensação permanente
de pureza que os trabalhos e as
frases de Waltércio suscitam; é
exatamente o oposto. Trata-se
de uma clareza que comporta,
ou melhor, que se constrói em
razão da dúvida, do vir-a-ser. As
coisas, em seu estado puro, estão sempre vindo-a-ser.
A dúvida, a perplexidade
-"Algumas respostas sentem
uma falta imensa de perguntas"- são também co-responsáveis pelo humor das frases e
dos trabalhos do artista. Por
mais que se apresente o silêncio das coisas, é um silêncio
sem gravidade, justamente por
tratar-se de um silêncio intervalar e parentético e não um silêncio definitivo.
É daí que vêm
imagens como: "Uma visão
clássica da eternidade: o infinito de pijamas". É isso mesmo; o
infinito, assim como a eternidade, deve entediar-se por ser
tão pleno. É melhor a instabilidade da dúvida, "que avança
quando aperfeiçoa a suspeita
que a alimenta".
O artista deve trabalhar com
perguntas, tanto as próprias como as do espectador/leitor. É o
leitor cheio de suspeitas que
compõe, com seu olhar, o espaço do objeto que, de estritamente objetivo, ganha assim a
subjetividade de quem olha.
Basta ver a quantidade de referências das frases do livro ao espectador, tão importante para a
obra quanto o próprio objeto.
"Respirar com olhos; ver é onde; o olhar retifica o horizonte;
observar o movimento das coisas paradas."
"Notas, ( ) etc.", como uma
frase do livro sugere, "melhora
a qualidade do desconhecido".
E nós, que olhamos, recebemos, com esse livro, um holofote para enxergar melhor o tamanho do mistério.
Notas, ( ) etc
Autor: Waltércio Caldas
Edição: Gabinete de Arte Raquel
Arnaud (tel. 0/xx/11 3083-6322)
Quanto: R$ 180 (154 págs.)
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