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São Paulo, sexta-feira, 07 de novembro de 2003

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CINEMA/ESTRÉIAS

"SEGUNDA-FEIRA AO SOL"

Diretor espanhol faz seu primeiro longa de ficção

Aranoa desenha com precisão os sentimentos do desemprego

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

O desemprego como tragédia da Europa neoliberal tem sido fartamente explorado pelo cinema: já rendeu desde comédias tolas e divertidas (como "Ou Tudo ou Nada", de Peter Cattaneo) a um dos melhores filmes políticos recentes ("Rosetta", dos irmãos Dardenne).
O tema, porém, ainda não havia sido tão diretamente atacado como neste "Segunda-Feira ao Sol", do espanhol Fernando Leon de Aranoa, que se concentra no cotidiano de um grupo de homens sem trabalho.
É um desafio e tanto para um cineasta estreante em ficção (Aranoa já tem alguma experiência como documentarista e roteirista) narrar dias vazios e desesperançados, mas o diretor conseguiu transformar essas características na potência de seu filme.
"Segunda-Feira ao Sol" não é um "road movie", mas tem um caráter errante. Acompanha seus personagens sem apontar para eles qualquer possibilidade de destino certo (feliz ou não). O tom é absolutamente lacônico, mas a falta de definição é parte dos objetivos de Aranoa.
A ação se passa em Vigo, cidade litorânea da Galícia, na Espanha, onde um estaleiro fechou suas portas deixando milhares sem salário no fim do mês. Entre eles está Santa (Javier Bardem, quase irreconhecível e em interpretação memorável), que ainda por cima está sendo processado pela empresa por ter quebrado uma luminária durante um protesto.
Do grupo que todas as noites frequenta o mesmo bar, Santa é o único que ainda se permite arroubos de indignação. Os outros são dominados por um terrível sentimento de impotência diante de algo que lhes parece incontornável.
A postura de Santa o põe em conflito direto com o único dos frequentadores do bar que ainda guarda um emprego, como vigia noturno. Mas Santa sempre perde as discussões, irritando-se e partindo para ofensas pessoais.
"Segunda-Feira ao Sol" desenha com precisão os sentimentos do desemprego, a humilhação do ócio involuntário e a exclusão de homens ainda presos a um modelo de trabalho, que não souberam se reinventar diante de uma nova realidade (um dos personagens toma lições de informática do filho). Mais terrível, porém, é dar-se conta da própria irrelevância diante de um mundo que ignora seus excluídos, e dar-se conta, também, que tentar resistir a essa situação tornou-se algo igualmente irrelevante.


Segunda-Feira ao Sol
Los Lunes Al Sol
   
Produção: Espanha/França/Itália, 2003
Direção: Fernando León de Aranoa
Com: Javier Bardem e Luis Tosar
Quando: a partir de hoje nos cines Frei Caneca Unibanco Arteplex, Market Place Cinemark e circuito



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