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LIVRO/LANÇAMENTO
Cineasta apresenta em obra o dia-a-dia das filmagens do longa e suas reflexões sobre o cinema
Diegues revela em textos a intimidade de "Deus É Brasileiro"
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O diretor Cacá Diegues, 63, conta 71 dias na vida de um filme, em
"O Diário de Deus É Brasileiro",
que chegou neste mês às livrarias,
em edição da Objetiva.
O propósito inicial do cineasta,
ao construir um diário de filmagens de seu 16º longa-metragem
-"Deus É Brasileiro", que estreou em janeiro deste ano e foi
visto por 2,6 milhões de espectadores-, era preencher uma lacuna no mercado editorial no país.
"A literatura de cinema no Brasil tem uma bela tradição acadêmica e ensaística, mas poucos
exemplos de textos de realizadores sobre seus próprios filmes,
uma literatura testemunhal de experiências práticas", diz Diegues.
"O Diário de Deus É Brasileiro"
contorna sem dificuldades o desafio de transportar o leitor para o
cotidiano da produção de um filme, na ótica de seu diretor.
Está lá o xadrez emocional e
profissional de Diegues com seus
atores (os protagonistas Antonio
Fagundes, Wagner Moura e Paloma Duarte, sobretudo), como
neste exemplo: "Às vezes sinto
que Fagundes não está totalmente
convencido do que lhe peço, tenho a impressão de que ainda me
testa, a seu personagem e ao próprio filme", anotado em 18/10.
Surgem também as questões
técnicas das cenas mais difíceis,
como as filmagens aquáticas e os
sucessivos deslocamentos num
filme-de-estrada que percorre
milhares de quilômetros, à margem esquerda do São Francisco.
Mas o volume ultrapassa o caráter de diário de filmagens ao incorporar memórias e reflexões
atemporais de seu autor. Tem-se
o relato do último encontro de
Diegues com Joaquim Pedro de
Andrade (1932-1988), depois que
uma discussão pública sobre os
(des)caminhos do cinema brasileiro provocou um abalo permanente na amizade dos dois cineastas. "Joaquim estava muito fraco,
quase não falava mais. Segurei sua
mão, e nós ficamos de mãos dadas, em silêncio. Acho que não
percebeu que eu chorava."
Para Diegues, extrapolar em seu
livro os acontecimentos específicos das filmagens é uma consequência natural de seu modo de
se relacionar com os próprios filmes. "Quando faço um filme, ele
está impregnado de idéias anteriores a ele, e ele mesmo gera novas idéias em mim. É disso que o
livro trata, sem nenhum proselitismo ou vontade de convencer
ninguém de nada", afirma.
Tome-se, então, como exemplo
de uma convicção particular de
Diegues, revelada em seu diário, o
seguinte trecho:
"Não precisamos fazer filmes
para que os pobres tenham consciência de sua miséria, porque
eles já acordam todo dia no seio
dela, os filmes "engajados" são, em
geral, dirigidos aos que não são
pobres e não têm com que se revoltar. Se quisermos fazer filmes
para os pobres, solidários com
eles, úteis a eles, temos que fazer
algo como os comerciais de televisão, propaganda para lhes vender
o produto que precisam consumir, alguma coisa que colabore
com sua redenção social. A violência, por exemplo".
O DIÁRIO DE DEUS É BRASILEIRO. De:
Cacá Diegues. Editora: Objetiva. Quanto:
R$ 44,90 (296 págs.).
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