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Memória
Melancolia marcou vida de William Styron
MOACYR SCLIAR
COLUNISTA DA FOLHA
Os antigos textos de psiquiatria falavam do
ômega melancólico,
uma ruga com o formato da letra grega que aparece na testa
de deprimidos. Estudante de
medicina e médico, nunca tinha visto este sinal até encontrar, numa feira do livro no México, o escritor norte-americano William Styron, morto na
última quarta, aos 81 anos. Ali
estava, em sua fronte, o ômega.
A melancolia marcou a vida
do grande escritor desde a infância. O pai sofria de depressão; a mãe morreu cedo de câncer. O próprio Styron passou
por um surto depressivo quando ia receber, em Paris, um prêmio literário. Aflitiva experiência que descreve no curto mas
dilacerante "Perto das Trevas"
("Darkness Visible", 1990).
Styron mostra como a depressão, longe de ser a "preguiça emocional" que aparenta, é
na verdade um tormento constante, uma "tempestade uivando no cérebro", para usar as
suas próprias palavras. Não por
coincidência, a primeira novela
de Styron, publicada aos 25
anos, logo depois que ele se graduou na Duke University, também fala em escuridão: é "Lie
Down in Darkness" (1951), a
história de uma infeliz família
da Virginia que culmina com o
suicídio da jovem protagonista.
"A Escolha de Sofia"
Mas Styron é mais conhecido
por dois importantes romances: "As Confissões de Nat Turner" ("The Confessions of Nat
Turner", 1967, premiado com o
Pulitzer), baseado na vida do
escravo que, em 1831, liderou
uma revolta no Sul dos EUA; e,
sobretudo, "A Escolha de Sofia" ("Sophie's Choice", 1979),
levado às telas com sucesso no
filme de Alan Pakula. O romance se passa nos EUA e gira em
torno de três personagens: a
católica polonesa Sophie, seu
amante judeu, Nathan, e o jovem Stingo, que está apaixonado por Sophie. A escolha do título refere-se a uma passagem
dramática: no campo de concentração, Sophie, que está
com o filho e a filha, recebe de
um guarda a "chance" de salvar
uma das crianças, mas só uma
(daí a escolha). Já em "As Confissões" há uma passagem polêmica, quando o escravo fantasia que está violentando uma
mulher branca.
Intelectual presente nos
acontecimentos de seu tempo,
Styron participou da Segunda
Guerra e da Guerra da Coréia e
viveu em Paris, onde fundou,
com Romain Gary, George
Plimpton, Peter Matthiessen,
James Baldwin, James Jones e
Irwin Shaw a influente revista
literária "Paris Review".
O ômega é a última letra do
alfabeto grego, e a expressão
"alfa e ômega" significa o começo e o fim. No caso de
Styron, o ômega foi melancólico, porque a melancolia marcou indelevelmente sua obra.
Obra significativa, que reflete
os grandes dilemas morais do
século 20, e que assegura o lugar de William Clark Styron na
literatura de nosso tempo.
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