São Paulo, sábado, 7 de novembro de 1998

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Livro é biografia de um atrapalhado

especial para a Folha


A megaexposição do humorista Jô Soares atrapalha a leitura de seu novíssimo "O Homem Que Matou Getúlio Vargas"? É difícil evitar as aparições do meeiro gordo e engraçado de tantas noites de insônia e que agora é também biógrafo?
O sucesso de "O Xangô de Baker Street", que vendeu um número sem parâmetros no mercado, pode ser creditado à indireta promoção que o mesmo fazia em seu programa. O segundo livro, como todo segundo livro, é a prova dos nove.
O sucesso sempre deixa a crítica amarga. Muitos elementos conspiram contra o novo livro. Mas ele é ótimo, original. Difícil encaixá-lo num gênero conhecido. É uma biografia sem ser de um personagem tolo, atrapalhado, obsessivo.
Jô não é bobo. Procurou se esbater, deixando intervenções para seu programa, e tascou pau numa narrativa cativante sobre os lapsos de Dimitri Borja Korozec, o anarquista biografado, evitando as piadas fáceis. Dimitri nasceu na Bósnia com um dedo a mais nas mãos. Teve a parte direita do saco extirpada na infância -para ser sempre de esquerda, segundo seu pai.
Em alguns momentos, há um certo excesso de material pesquisado, um "enciclopedismo" que dispersa. Mas, pouco a pouco, as andanças e atropelos de Dimitri vão envolvendo o leitor. O truque é fazer com que o personagem da ficção não reescreva a história. Apenas testemunhe. Afinal, o que passou é fato.
O autor não abre o cofre de seu repertório imenso de piadas. Os escorregões de Dimitri é que são engraçados -como quando é enviado por Al Capone para subornar os jurados e, depois de escalar as paredes do tribunal, invade a sala errada e suborna os que estão julgando o caso de um acidente de trânsito.
Em 1914, Dimitri quase assassina o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono austro-húngaro; a deformidade nas mãos o atrapalha na hora de puxar o gatilho. Encontra-se num trem com a espiã Mata Hari. Depois de uma noite de amor, acaba entregando-a sem querer às autoridades alemãs. Em 1925, em Hollywood, figurante da primeira produção de "Ben-Hur", atrapalha as filmagens colocando abaixo o caríssimo cenário. Envolve-se com Al Capone. (MRP)
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Livro: O Homem Que Matou Getúlio Vargas Autor: Jô Soares Lançamento: Companhia das Letras Quanto: R$ 25 (342 págs.)



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