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São Paulo, sábado, 08 de fevereiro de 2003

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LIVROS/LANÇAMENTOS

DIPLOMACIA

Alfonso Reyes cultivou laços de amizade com a elite cultural do país enquanto foi embaixador no Rio nos anos 30

Obra revela um brasileiro sob mexicano

DA REPORTAGEM LOCAL

Se as borrachas do tempo e da ignorância deixaram quase invisível no Brasil a idéia de que o mexicano Alfonso Reyes foi "o grande estilista da língua espanhola", no dizer de Jorge Luis Borges, ou um dos maiores intelectuais da história latino-americana, como sustenta Carlos Fuentes, apagado mesmo ficou o fato de que viveu por sete anos, e apaixonadamente, no mesmo Brasil.
Diplomata, além de poeta, romancista, contista, ensaísta e por aí afora, o senhor rechonchudo da cidade de Monterrey foi embaixador do México no Rio de Janeiro de 1930 a 1936, com mais um ano brasileiro em 1938.
A experiência brasileira de Reyes agora ressurge nas livrarias daqui em grande estilo. Depois de sair nos Estados Unidos e no México, está sendo lançado no Brasil o livro "Alfonso Reyes e o Brasil -°Um Mexicano entre os Cariocas", de Fred P. Ellison.
Professor emérito da Universidade do Texas, o brasilianista e estudioso da América Latina vem pesquisando a passagem de Reyes pelos nossos trópicos desde os anos 70. Escarafunchando pelos arquivos do intelectual mexicano e pelos 24 volumes de suas "Obras Completas", Ellison descobriu que Reyes não "apenas" escreveu em terras cariocas 35 poemas de diversos tipos, 50 crônicas ou outros ensaios e oito ou dez contos de temas brasileiros. No Brasil, ficaram laços profundos de amizade -e de mediação intelectual- com uma respeitável elite cultural brasileira.
Homenageado por Manuel Bandeira no célebre poema "Rondó dos Cavalinhos" (que começa com "Os cavalinhos correndo,/ E nós, cavalões, comendo..." para chegar a "Alfonso Reyes partindo,/ E tanta gente ficando"), o escritor do importante "Os Romances do Rio de Janeiro" (sem tradução em nossas prateleiras) também teve importante bate-bola intelectual-afetivo com nomes como Cecília Meirelles e Di Cavalcanti.
Com a primeira, por exemplo, que o tinha como mentor, chegou a formular projetos conjuntos como o de uma biblioteca infantil latino-americana; com o segundo, manteve boa correspondência.
Uma delas, na qual o artista pedia que Reyes conseguisse um convite para ele do governo mexicano, trazia uma saborosa lista de motivos, que começava com "o PC acha que minha linha é confusionista" e "a polícia acha que eu sou comunista", passa por "minha mulher acha que vivo com amantes" e "não tenho amantes para poder fazer arte" e termina com "cansado de ver filmes americanos imbecis".
Outra carta célebre de Reyes foi uma trocada com o também diplomata e escritor Ribeiro Couto, seu amigo. Nela aparece, anos antes do livro "Raízes do Brasil" -que a consagrou-, a expressão "homem cordial". "Não tenho evidência documental de que Buarque de Hollanda tivesse conhecimento dessa carta. Ainda assim considero a hipótese de que Hollanda tenha tirado a expressão daí", afirma Ellison, em entrevista por e-mail à Folha.
Independentemente disso, "homem cordial" foi um dos termos que Ellison considera mais apropriados para definir a personalidade de Reyes.
"O principal legado dele foi o próprio exemplo de como deve comportar-se o homem de letras como humanista", escreve.
O "humanista" em questão é calcado não apenas na qualidade, como na vastidão do trabalho de Reyes. "Foi grande em quase tudo: poesia, ficção, ensaio, além de filologia, história e filosofia clássica, teoria literária etc.", crava.
Se deixou marcas no Brasil, sustenta Ellison que o país também reverberou em sua escrita. "O Brasil marcou profundamente o espírito do mexicano."
(CASSIANO ELEK MACHADO)


ALFONSO REYES E O BRASIL - UM MEXICANO ENTRE OS CARIOCAS.
Autor: Fred P. Ellison. Editora: Topbooks (tel. 0/xx/21/2233-8718). Quanto: R$ 33 (276 págs.).



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