São Paulo, domingo, 08 de fevereiro de 2004

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CRÍTICA

"Contos da Meia-Noite" coloca texto na TV

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

É de não perder: na semana que entra, a TV Cultura solta mais um lote de "Contos da Meia-Noite" inédito. Talvez a mais inovadora e ousada aposta em teledramaturgia surgida na televisão do ano passado, a série dirigida por Éder Santos surpreende pela simplicidade.
São programinhas curtos, entre dez e 15 minutos, em que um ator faz a leitura de um conto. É tudo simples e, ao mesmo tempo, de resultados muito ricos.
Sentado em uma cadeia e colado ao texto, o ator/atriz usa seus recursos de voz, expressão, gestos da mão, movimentação do tronco e, é claro, retira do texto toda a ação e emoção. Santos coloca efeitos, a trilha sonora e edita. Um texto breve apresenta o conto e seu autor, e isso é tudo.
O ator/atriz interpreta, não entrando no papel de algum dos personagens, mas sim se colocando no lugar do narrador/ autor do conto. Aí reside a diferença de "Contos da Meia-Noite" para as dezenas de tentativas de usar literatura como matéria-prima já encetadas pela televisão desde seus tempos pré-históricos. Em vez de transpor para a TV o universo imaginado pelo escritor e transformá-lo em conteúdo, neste caso os recursos cênicos e da linguagem da televisão conseguem aproximar o espectador da experiência da leitura.
Ouvido, o texto parece mais compreensível e amigável. Ao mesmo tempo, a falta de cenário e de caracterização do ator/atriz exigem que a imaginação faça a sua parte.
Assim, o espectador de fato desprende-se daquilo ali que está acontecendo na sua frente e "vive" a narrativa com seus recursos internos. O mérito da série é transformar-se, de fato, numa ferramenta para o espectador olhar aquele texto em particular.
É, de fato, um achado. No sentido pedagógico, que sempre foi associado à idéia de usar textos da literatura para a televisão, talvez seja a experiência mais bem-sucedida de todas. Em vez de adaptar o texto para a televisão, o texto ganha uma possibilidade de aparecer na televisão e de ser fruído (quase que) como texto.
Além da idéia boa, outros elementos contribuem para o êxito da série: o time de atores reúne gente como Marília Pêra, Maria Luísa Mendonça, Antônio Abujamra; entre os contos selecionados há autores como Monteiro Lobato, Dalton Trevisan, João do Rio e, claro, há Éder Santos, dirigindo e montando.
Só é pena que vá ao ar muito tarde: com tanta reprise, a TV Cultura poderia ter pensado em mostrar os programas já exibidos em dezembro em horários menos inóspitos para quem acorda cedo.
A série começa amanhã com "A Sombra", de Coelho Neto, com Beth Goulart. Na terça, é a vez de "Luz na Varanda", de Dalton Trevisan, com Marília Pêra. Seguem-se "O Hotel", de Victor Giudice, "Bandeira Branca", de Luis Fernando Veríssimo, e "O Bebê de Tarlatana Rosa", de João do Rio.

E-mail: biabramo.tv@uol.com.br

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