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Mônica Bergamo
bergamo@folhasp.com.br
Crise? Credo!
Quatro mulheres de investidores financeiros se reúnem em um bar em São Paulo e contam ao repórter Paulo Sampaio os efeitos da quebradeira internacional em seu relacionamento conjugal
Caio Guatelli/Folha Imagem
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Mariana Campos Barbosa Lima, Ana Carolina Almeida, Fernanda Almeida e Lyna Carbone Jenner comentam a crise
Elas contam que "foi difícil".
A empresária e profissional de
marketing Mariana Campos
Barbosa Lima, 34, diz que seu
marido "head trader" (consultor financeiro) ficou "mudo". O
da joalheira Lyna Carbone Jenner, 30, um investidor do ramo
imobiliário, passou a tomar antiácido. O namorado da consultora Ana Carolina Almeida, 29,
captador de recursos para crédito externo, parou de mandar
a "flor mensal". O da estilista
Fernanda Almeida, 29, um corretor de títulos de valores mobiliários, repetia: "Você não sabe como eu tô pobre". Em Nova
York, a crise econômica levou
mulheres de financistas de
Wall Street a criar o Daba ("Dating a Banker Anonymous", ou
"Namoradas de Banqueiros
Anônimas"), um grupo de
apoio mútuo às desoladas garotas (leia box).
FOLHA - Como seus maridos e namorados reagiram à crise?
MARIANA BARBOSA - O meu [marido], que fala pelos cotovelos,
ficou mudo.
ANA CAROLINA ALMEIDA - O Cris
dormia e acordava com a TV na
Bloomberg [canal inglês que
transmite as variações do mercado internacional]. Começou
a tomar remedinho pra dormir,
apareceram alguns cabelos
brancos.
MARIANA - No Marcelo, teve
um agravante: ele perdeu o ânimo. A gente parou de sair. E
meu marido é "o incluído social". São três almoços todo sábado. Não que eu não goste de
ir, mas a gente vai por algo além
do prazer. Ele acha que precisa.
FOLHA - A crise levou a cortar gastos domésticos?
MARIANA - Temos uma regra
em casa. Tudo pode faltar, menos a babá.
FOLHA - Houve mudança no tratamento deles com os outros?
ANA - O Cris perdeu aquela
alegria. Nas férias, a gente viajou pra dentro do Brasil. Foi um
lugarzinho bárbaro, em Santa
Catarina. Era mais pra não gastar dinheiro.
MARIANA - Pra não gastar em
dólar, né, Aninha?
FOLHA - E o assunto entre eles?
ANA - Os homens se uniram.
MARIANA - O Marcelo nunca foi
de entrar em casa falando ao telefone, mas ele simplesmente
não esgotava o assunto.
FOLHA - E o humor?
ANA - De primeiro, o Cris até
ficou irritado; depois, carente.
FERNANDA ALMEIDA - O meu caso
era completamente diferente
de tudo o que eu tô ouvindo. Pelo menos em casa, ele dizia:
"Vamos evitar esse assunto".
TODAS - Nossa, que maravilha!
MARIANA - Amigas, nossas histórias são café pequeno perto
de outras. Tenho uma conhecida que a vida do marido acabou.
Ele perdeu dinheiro aplicado
da família inteira. Da irmã milionária, do irmão triliardário.
Esse cara é mais velho, quase
50, daquela fase que os nossos
meninos não pegaram, em que
um cara, com 30 anos, já tinha
feito US$ 2 milhões.
FOLHA - Mas hoje ainda existe esse
negócio de conquistar o primeiro
milhão?
MARIANA - Ôpa! A coisa mais
comum nesse meio é ouvir:
"Como assim, você vai ter um
filho antes de fazer o primeiro
milhão de dólares?".
FERNANDA - [Séria] É uma ideia
muito idiota!
AS OUTRAS - É, mas existe!
MARIANA - Eles falam sério! Te
chamam de irresponsável.
FOLHA - E eles têm esse dinheiro?
MARIANA - Têm...têm, têm.
FERNANDA - Mas quem inventou isso? Você faz parte de qual
porcentagem do PIB nacional?
MARIANA E ANA - Não, Fernanda,
isso é conversa de roda no mercado financeiro.
LYNA JENNER- É papo de menino. É o equivalente a: "Como
você não tem uma enfermeira,
só uma babá?".
FOLHA - Costuma-se dizer que o investidor do mercado financeiro valoriza o status proporcionado pelo
que é caro.
TODAS - Ôpa, sem dúvida!
MARIANA - O carro, o relógio, o
sapato.
ANA - Principalmente o carro.
FOLHA - Qual o carro do Cris?
ANA - [Rindo] Ele comprou
um Freelander [Land Rover].
LYNA - O Cris [são dois com o
mesmo nome] é bem consumista. Sapato, roupa... o carro é
uma BM[W].
MARIANA - Quando eu comecei
a namorar o Marcelo, achava
que ele era milionário. Eu nasci
bem, morei em Nova York,
mas, mesmo assim, ele me impressionou. Pensei: "Que sorte
encontrar um cara lindo, rico...". Ele morava sozinho em
um apartamento enorme, de
quatro quartos, na Vila Nova
Conceição, e era chiquérrimo
nos detalhes: na abotoadura, no
bico do sapato. Ele sempre diz:
"Para alguém colocar o dinheiro comigo, tem que acreditar
que eu sou muito rico, muito
próspero".
FOLHA - A crise mudou isso?
LYNA - O que mudou foram os
planos de comprar uma casa no
campo, fazer uma megaviagem
pra St. Barths, pra Europa.
FOLHA - Parece mais frustrante
ainda para quem costuma planejar
o que vai fazer com o dinheiro que
ainda não ganhou.
LYNA - A vida continua.
FOLHA - Fora ganhar dinheiro, do
que os rapazes gostam?
ANA - O Cris ama vinho. Tem
duas adegas, que deram uma
boa esvaziada. E, no auge, ele
não repôs. Só agora, recentemente.
FOLHA - Como é a casa de um investidor como o Cris?
ANA - Ele mora em um apartamento de homem, no Morumbi. São três quartos, mas ele
quebrou um com a sala e tem
um escritório.
FOLHA - Fernanda falou pouco...
FERNANDA - Meu namorado
não segue esse estereótipo, sapato, relógio. Ele se mudou
agora para um apartamento
melhor, comprou jipe.
FOLHA - Que jipe?
FERNANDA - Acho que é Santa
Cruz... [com expressão de quem
pede socorro] ou Veracruz?
MARIANA - Tem os dois.
FERNANDA - Veracruz, então.
LYNA - Mais de R$ 100 mil.
FOLHA - O.k., mas como foi então
que ele sentiu a perda de dinheiro?
FERNANDA - Ele dizia: "Você
não sabe como eu tô pobre!".
Eu o animava. Outro dia fomos
comer num japonês que é mais
carinho e vivia lotado, estava
vazio. Mas a gente tava lá.
FOLHA - Ele não é consumista?
FERNANDA - Não, gasta com vinho e comida.
MARIANA - É que o mercado financeiro tem as miniturmas. A
do polo, a do golfe...
FOLHA - Você conhece a "miniturma do polo"?
MARIANA - 90% do mercado financeiro faz polo. Na crise,
meu marido não jogou nenhuma vez. Custa uma fortuna.
Tem que ter sete cavalos. Então, nessas sutilezas é que você
sente a crise.
FOLHA - Os especialistas dizem que
é comum haver problema sexual em
homens que enfrentam crises.
TODAS - Siiiiim [mas ninguém
diz que aconteceu consigo].
LYNA - Eu estava de resguardo.
ANA - Eu só vejo o Cris no fim
de semana, então não mudou.
FOLHA - Uma amante faz parte do
arsenal de status do investidor?
FERNANDA - Claro, de todos.
ANA - Eu não penso nisso.
MARIANA - Não é coisa de investidor, é de homem.
FOLHA - Recentemente, entrevistei um psicanalista que acredita que
os investidores escolhem suas mulheres pensando mais em fazer uma
dupla social boa do que no amor.
MARIANA - Rola isso, sim. É até
feio falar, mas a ex-namorada
do Marcelo era uma "baianinha". Tenho certeza de que o
fato de eu ter morado no mundo inteiro, falar línguas, conhecer pessoas o levou a pensar:
"Vou ficar com esse fim de
mundo [a "baianinha"] ou fazer
essa troca?". E me escolheu.
ANA - O Cris tem pavor de mulher feia. Gorda? Não pode ver.
FOLHA - Como enfrentar a crise?
MARIANA - Quando a gente
pensava em abrir um vinho de
preço exorbitante, o Marcelo
dizia: "Não vamos abrir esse,
não. Vai que a gente precise
vender...".
Todas riem muito.
ANA - É cada coisa louca. A
gente ficava imaginando vender o carro e ter que andar num
"Unozinho", sei lá, vender a casa, sabe quando você começa a
pensar? Vender a mãe pra recuperar o que eu perdi e investir...
ENQUANTO ISSO, EM NOVA YORK
Namoradas de banqueiros desabafam em blog
Nada restou a namoradas,
mulheres e amantes de financistas de Wall Street, a não ser
fundar um grupo de apoio às
companheiras que, além da
atenção masculina, acabaram
sem os cartões de crédito, viagens às Bermudas e contas nas
mais exclusivas lojas de NY.
As garotas do grupo Daba
("Dating a Banker Anonymous", ou "Namoradas de
Banqueiros Anônimas")
contam em detalhes em um
blog (http://dabagirls.wordpress.com) a vida a.r. (antes da recessão) e d.r. (depois da recessão).
Criado pelas amigas Laney
Crowell, repórter de beleza, e
Megan Petrus, advogada,
ambas com 27 anos, o Daba
virou um fórum de desabafos, dizem elas, "sem o escrutínio de feministas". Nele,
Courtney, 24, narra uma briga recente com Charles porque o casal não viaja desde
setembro. "Querida, o dinheiro está curto e minha
mulher agora deu para checar a movimentação das contas." Mas Courtney insistiu e a
reação veio aos gritos: "Tenho
que demitir 20 pessoas nesta
semana. Vê se cresce!". Outra
garota diz que seu namorado
foi demitido com a quebra do
banco Lehman Brothers e
aceitou um emprego com salário menor. "Agora", conta J.,
"nunca o vejo e ele está muito
infeliz. O sexo é horrível. Sinto
a dor de vocês. Continuem escrevendo". Outra diz: "Estou
noiva de um FBF ("Finance
Guy Boyfriend", ou "Namorado Financista") e tudo o que
ele faz é chegar em casa e arrancar os cabelos em frente à
televisão".
"Ele passou de inatingível a
grudento. Agora eu tenho um
namorado completamente
devotado (...) e estou entediada", narrou outra. As meninas
passaram a checar as notícias
do mercado para prever o humor dos parceiros. O blog ajuda, tendo instituído um código com alertas em diferentes
cores. Na sexta, quando foi
anunciado que a contração do
PIB dos EUA chegou a 3,6%, o
código era laranja.
(ANDREA MURTA, DE NOVA YORK)
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