São Paulo, quarta-feira, 08 de março de 2000


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TV digital mostra a sua cara (e a imagem continua ruim)

Reuters
Um dos modelos de TV digital, que combina sinais de TV, Internet e telefone celular, é apresentado em uma feira na Alemanha



Primeiros testes no Brasil reprovam padrão americano, que prioriza a alta definição; sistemas europeu e japonês são os favoritos para a nova era da televisão no país, que começa em 2001


MÍDIA
TV digital define padrão no Brasil até abril

NELSON DE SÁ
da Reportagem Local

Estados Unidos ou União Européia? Ou, quem sabe, Japão? Na escolha do padrão de TV digital a ser usado no Brasil, a partir de 2001, a parceria com os americanos já está quase descartada. Mas eles começam a reagir.
Um relatório que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) disponibilizou na Internet é categórico. A modulação usada no padrão americano, chamado ATSC, é menos "adequada às condições brasileiras" e "tecnicamente" inferior à modulação usada nos padrões europeu (DVB) e japonês (ISDB).
"Não há possibilidade de outra tecnologia", diz o presidente da Anatel, Renato Guerreiro.
O grupo técnico formado por Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão) e SET (Sociedade de Engenharia de Televisão), que elaborou o relatório para a Anatel, continua em testes com os padrões europeu e japonês. O relatório final será entregue até o mês que vem.
A troca da TV analógica pela digital no Brasil, segundo a Anatel, deve tomar dez anos e consumir US$ 90 bilhões.

Alta definição
O ATSC, sigla para Advanced Televison Systems Committee, comitê que indica padrões de TV digital para o governo americano, reage com argumentos que beiram a acusação. "Estamos muito desapontados e muito surpresos", diz Robert Graves, presidente do ATSC.
Ele dá razões que chama de econômicas. "Nós sabemos que a alta definição é essencial para o Brasil", diz. "A alta definição é a aplicação central da TV digital como ela está sendo implantada nos EUA. Mas não existe nenhum plano, de nenhum tipo, para oferecer alta definição em qualquer lugar da Europa."
TV digital não é sinônimo de alta definição. A TV digital oferece duas possibilidades centrais: alta definição, com melhor imagem, ou multiprogramação, com várias programações sendo transmitidas na baixa definição usada hoje (leia textos abaixo).
O coordenador do grupo Abert/SET, Fernando Bittencourt, questionado sobre limitações dos padrões europeu e japonês, respondeu num e-mail lacônico que "todos os sistemas podem transmitir TV em alta definição ou múltiplos programas em definição convencional".

Efeito PAL-M
Outro contra-argumento "econômico" do ATSC acena com a possibilidade de se repetir o que ocorreu na definição do padrão de TV colorida no país, nos anos 70. O PAL-M escolhido foi superado aos poucos pelo NTSC americano, deixando o Brasil com um padrão obsoleto.
Olímpio José Franco, presidente da SET e também envolvido nos testes, dá um argumento técnico, em resposta: "Nós não corremos o risco do passado. O padrão (na época) passava pelas etapas de produção, exibição, transmissão e recepção. Na TV digital, o padrão só vai do transmissor até o televisor".
Mas o risco existe. Segundo Robert Graves, do ATSC, um problema, nesse sentido, é a banda de transmissão: "Toda a América do Norte e do Sul usa canais de 6 MHz. Há especialistas em TV digital no próprio Brasil que não querem trabalhar com a versão adaptada para 6 MHz de um padrão europeu que, originalmente, usa canais de 8 MHz".

Recepção
O grupo Abert/SET oferece um argumento técnico central contra o ATSC. "A grande diferença detectada nos testes, entre os sistemas, está na capacidade de cobertura", diz Bittencourt.
A modulação usada no padrão DVB europeu conseguiu 100% de sucesso de recepção (cobertura), num raio de dez quilômetros a partir da antena da Cultura, em São Paulo. A modulação do ATSC conseguiu apenas 80%. "O desempenho do ATSC nos testes foi pior do que o da TV analógica atual", diz Bittencourt.
Um dos problemas seria a dificuldade de recepção por aparelhos de TV que têm somente antena interna. O resultado dos testes brasileiros reafirma obstáculos que haviam sido apontados em testes feitos nos Estados Unidos -e que levaram a pedidos formais de troca da modulação ao governo americano. Os pedidos foram negados.
Questionado se planejava pedir o apoio do governo americano, na disputa pela definição do padrão brasileiro, o presidente da ATSC respondeu, inicialmente: "Bem, nós tentamos deixar o governo americano consciente do que estamos fazendo".
Depois, qualificou sua resposta: "É importante para as pessoas nos Estados Unidos que o Brasil adote o mesmo padrão, porque isso vai significar mais investimento, mais pesquisa e desenvolvimento do padrão e isso vai se traduzir em mais equipamentos, a preços mais baixos. Mas nós esperamos que o Brasil tome a sua própria decisão".


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