São Paulo, domingo, 08 de março de 2009

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BIA ABRAMO

Uma bobagem cruel


Versão brasileira de "Esquadrão da Moda" soa postiça importando seus maneirismos

O NEGÓCIO funciona assim: uma pessoa acha você -digamos que você seja uma mulher- brega, cafona, démodé, dotada de um mau gosto insuportável. (Detalhe sórdido nº 1: essa pessoa é um parente ou um/a amigo/a). Daí, durante duas semanas vão filmá-la e entrevistá-la, para que a opinião daquela pessoa (lembre-se: alguém de suas relações) se transforme numa espécie de fato.
Em seguida, numa conspiração envolvendo sua família e seus amigos, vão colocá-lo numa situação em que, de alguma forma, fique evidente que você é brega, cafona, démodé. (Detalhe sórdido nº 2: essa situação implica algum nível de constrangimento, é claro). Vão te dizer isso na cara, inclusive.
Depois, você será convencida de que, além de aguentar a humilhação pela qual já passou, vão jogar suas roupas numa lata de lixo. Você, é claro, já está quase chorando, ou espumando de raiva, dependendo de seu temperamento. Mas, surpresa, vão te apresentar a recompensa: um cheque de R$ 10 mil e a promessa de que você, depois de uma semana de outros tantos momentos humilhantes e constrangedores, finalmente vai aprender a ter estilo, estar na moda, vestir-se bem, ficar bonita etc.
O cheque reluz e, claro, a promessa, idem. Você imediatamente começa a fazer fantasias malucas de consumo -"aquela calça que vi e não comprei, trocar todos os meus sapatos, finalmente poder entrar naquela loja com preços estratosféricos etc.". Você topa.
Esta é, em linha gerais, a trajetória daqueles que passam pelo "Esquadrão da Moda", programa criado pela BBC e que estreou nesta semana no SBT (às terças, às 20h). A versão brasileira, como de praxe, compra o pacote completo, o que significa não apenas usar o nome e toda a estrutura do programa, como importar seus maneirismos, como a truculência verbal no texto e o sarcasmo dos apresentadores.
Se a primeira transposição em geral dá mais ou menos certo, a depender da grana e do cuidado dispensado à produção, a segunda, em geral, soa postiça. O sarcasmo, ou "ironia cáustica" na definição do dicionário Houaiss, é uma modulação que exige uma enorme inteligência (de quem fala ou de quem escreve) e uma convicção agressiva. Em outras palavras, não é substituível por uma simples entonação venenosa...
Sem sarcasmo, ou seja, sem humor, o "Esquadrão da Moda" deixa de ser um jogo (meio sórdido, mas ainda um jogo) e quer soar convincente. E aí fica, simplesmente, uma bobagem meio cruel.

biabramo.tv@uol.com.br


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