São Paulo, sexta-feira, 08 de abril de 2005

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CDS

RAP

"El Kilo", terceiro CD do grupo, confirma química entre o hip hop e os latinos

Orishas ecoa confortável em terreno cubano-brasileiro

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Se o carioca Marcelo D2 encontrou no samba a sua batida perfeita para o rap, do lado de lá do Equador os cubanos do Orishas vêm usando a música caribenha para trilhar caminho semelhante.
"El Kilo", terceiro álbum do trio de rappers formado por Roldan, Ruzzo e Yotuel, aposta na mesma mistura que os consagrou em 2000, quando "A lo Cubano" foi lançado, arrancando elogios da crítica e tomando de assalto as pistas de dança do planeta.
"O negócio não está fácil/ sobra pouco pra inventar/ pra encontrar a melodia/ tem que ser natural (...) os Orishas confiam no que sempre te dão/ Cada qual com seu dilema/ Cada louco com seu tema", vão avisando, logo de cara, em "Nací Orishas".
Como em seus trabalhos anteriores, "El Kilo" é repleto de faixas dançantes, em que a percussão da salsa e os naipes de metais afro-cubanos comungam com os beats norte-americanos sem prejuízo para um ou outro.
"Que se Bate" é de retórica quase gangsta, mas, com uns scratches aqui e ali, passeia pelo dub, pela eletrônica e explode na mais pura tradição cubana; "Elegante" vai na mesma linha: aproveita o dub, flerta com o ragga, mas não esconde suas maracas e vocais "à Buena Vista Social Club", para ficar numa comparação óbvia.
Candidatas às pistas do próximo verão europeu -"El Kilo" foi gravado entre Paris, Madri e Nova York e já estreou entre os cem álbuns da "Billboard"-, "Bombo" e "Quien te Dijo", com o rapper americano Pitbull no vocal, investem em grooves mais modernos e no resgate recente do Miami Bass.
Mas, quando não estão em festa, os Orishas reduzem a marcha e mergulham, agora com o produtor de Yerba Buena e Macy Gray, o venezuelano Andres Levin, no rhythm'n blues.
É aí que surge a faceta mais politizada do disco, característica acentuada desde o anterior "Emigrante". A faixa-título, "El Kilo", atira contra "velhos embusteiros" e "el gobierno"; "Distinto" tenta vencer o preconceito que o rap, mesmo que quase maior de idade em Cuba, ainda enfrenta na ilha; "La Calle", por sua vez, cede aos violões da guajira para tratar dos problemas dos imigrantes ilegais:
"Muita democracia, e isto para que serve?/ Se de papéis careço/ se por ser negro eu sofro/ nesta sociedade corrupta, injusta".
A crítica é mais diluída -e construtiva?- em "Reina de la Calle", sobre a prostituição: "Só por dinheiro não vale a pena, menina/ Escuta, este é o teu drama (...) Escuta, dama, este teu drama de rua, passando de cama em cama/ Ave-Maria, por Deus /Não vale a pena dedicar corpo e alma a essa tortura que te queima".
Ou talvez mais bem-humorada na etílica "Al que le Guste", que abre com uma introdução digna de filme B: "Você, você, você/ Ponham-se de pé, companheiros, isto começa assim". E, mais adiante: "Fazia pose de bom, de sério e auto-controlado, de um sujeito são, sem drogas e sem álcool".
No lugar de correntes de ouro e prostitutas de luxo do rap americano, Orishas rima em terreno conhecido. Aos cubanos e aos brasileiros. Sejam "rapperos", neo-sambistas ou pagodeiros.


El Kilo
   
Artista: Orishas
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 35, em média


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