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Bush não é o bastante
Michael Moore elogia países que não apoiaram Guerra do Iraque e ridiculariza seu presidente
RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
Michael Moore está satisfeito
com o Brasil -ao menos em relação à Guerra do Iraque. E com os
espanhóis, é claro. De resto, se o
documentarista pudesse, mudaria o mundo inteiro.
"Obrigado ao povo do Brasil
por não fazer parte dessa coalizão", disse o cineasta americano
anteontem, durante entrevista coletiva para a imprensa não-americana, em Nova York. "Sei que
uma grande pressão foi posta sobre o Brasil."
Isso logo no início da conversa,
quase sempre descontraída, com
repórteres do mundo todo para
divulgar seu documentário "Fahrenheit 9/11" -o qual, diz, tem a
"missão" imediata de "tirar George W. Bush da Casa Branca".
Na hora e meia que se seguiu,
disse esperar que o filme, em que
ridiculariza o presidente americano e ataca sua empreitada militar,
tenha efeitos semelhantes em outros países -ajudando a tirar do
governo líderes que apoiaram
Bush-, recomendou aos chineses que lutem pela liberdade de
expressão, disse o mesmo para os
árabes, demonstrou sua decepção
com o Japão -afirmando que
seu primeiro-ministro trouxe
"vergonha" para o país ao apoiar
a invasão do Iraque- e defendeu
mudanças no sistema capitalista.
Segundo o diretor de "Tiros em
Columbine", é esse o objetivo
"profundo" de todos os seus filmes: mudar um sistema econômico que ele qualifica como "injusto e antidemocrático".
"Precisamos consertar o problema maior. Precisamos de um
sistema econômico democrático
que dê às pessoas controle e voz
sobre as decisões que nos afetam", declarou, para em seguida
brincar com a reação que imaginava estar criando entre os repórteres: "Ele começou com um papo
comunista. Não sei do que fala".
"Eu me recuso a pensar nessa
sociedade como sendo igualitária
enquanto os 10% do topo controlam a maioria da riqueza."
Outro desejo de Moore: que o
filme mostre ao mundo inteiro
que o problema é Bush, e não os
americanos. "Quero que as pessoas de outros países saibam que
não sou apenas eu. Estou com a
maioria dos americanos, que
nunca votaram nesse homem",
disse. "Sei que vocês gostam da
nossa simplicidade [risos entre os
repórteres]. É... Nós somos otimistas, falamos alto."
E fez uma sugestão de algo que
os EUA poderiam fazer para ajudar outros países. "Não seria ótimo dizermos que fomos o país
que trouxe água potável para todas as pessoas do mundo?"
Em respostas a repórteres de
países que apoiaram a Guerra do
Iraque, disse sempre não compreender o que levava seus líderes
a apoiar Bush e recomendou que
todos seguissem o exemplo da Espanha, que, nas eleições de março, tirou do poder o primeiro ministro José María Aznar.
"Os espanhóis começaram -tiraram seu primeiro-ministro, que
não ouviu os anseios de seu povo-, e é meu desejo sincero que
os australianos, os italianos e [os
líderes de] outros países que se
juntaram a Bush nessa guerra
também sejam removidos do poder pelos cidadãos. Espero que esse filme ajude a fazê-lo."
O desejo de conquistar "estrangeiros" para sua causa não impediu Moore de ser irônico. Caiu na
gargalhada quando um repórter
suíço disse trabalhar para uma revista financiada por bancos chamada "Neutralidade". "Você está
usando termos contraditórios,
certo?"
Instigado por um jornalista austríaco a mandar um recado para
seus compatriotas, afirmou, referindo-se a Arnold Schwarzenegger: "Em nome dos americanos,
gostaria de agradecer à Áustria
por nos ter dado o governador da
Califórnia. Poderemos vir a ter o
nosso primeiro presidente austríaco. Os alemães tiveram um
presidente austríaco, e agora nós
também podemos ter um".
O cineasta também atacou a imprensa americana, afirmando que
ela estava "na cama" ("in bed")
com Bush, fazendo um trocadilho
com a expressão usada em inglês
para os jornalistas "encaixados"
em tropas da coalizão durante a
guerra ("embedded").
"A parte boa da democracia é
que você pode fazer qualquer pergunta, qualquer uma, e não ser
preso por isso. Por que não perguntaram "onde estão as armas de
destruição em massa'?" O seu filme, disse, representou um constrangimento para a mídia americana, que não mostrou o que ele
diz ser a realidade da administração Bush e do conflito no Iraque e,
portanto, contribuiu para a guerra. "O sangue desses garotos está
nas mãos deles também."
Por fim, um "elogio" para seu
inimigo. Questionado sobre o fato
de ter aparecido menos diante das
câmeras em seu novo filme, respondeu: "Em geral estou lá para
ajudar no humor. Mas, quando
você tem George W. Bush como
personagem principal, isso não é
necessário".
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