São Paulo, domingo, 08 de julho de 2007

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comentário

Apresentador deixou de lado anarquia

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

Ele era ruidoso, desbocado, engraçado e anárquico. Bem, ruidoso e desbocado ele continua; eventualmente, até engraçado pode ser. Mas o que se perdeu, em algum momento, foi o espírito anárquico.
Era essa a marca de Fausto Silva, o humor anárquico, paródico e no limite da grosseria, quando começou na TV. A escola havia sido o rádio, no "Balancê", programa da Excelsior. Fausto Silva, ainda sem o aumentativo, voz já tonitruante e agilidade mental incrível para fazer piadas e soltar observações ácidas, comandou o show a partir de 1982.
E foi essa mesma mistura de agressividade verbal e sotaque paulistano pesado que ele levou para o "Perdidos na Noite", primeiro na TV Gazeta, depois na Bandeirantes.
Assim como os tropicalistas "adotaram" o Chacrinha nos anos 60, o "Perdidos na Noite" virou uma espécie de coqueluche entre os jovens universitários, muitos empenhados na reconstrução da democracia, mas a maioria apenas usufruindo o clima que começava a se desanuviar. Qualquer coisa que cheirasse a contestação de qualquer ordem estabelecida era bem-vinda.
Fausto e seu programa eram contestadores nesse sentido amplo, que caía bem para a sensibilidade da época. Contestava-se o padrão global de qualidade escancarando a precariedade da produção, criticava-se o "bom-gostismo" cultural levando para o programa o fino do brega -Rita Cadillac, Gretchen-, fazia-se oposição falando de eleições diretas. E havia Tatá e Escova, grandes imitadores.
No fim dos anos 80, justamente no ano em que se realizaram as primeiras eleições presidenciais, Fausto Silva foi para a Globo como arma para combater a hegemonia de Silvio Santos aos domingos. Lá, ganhou novo apelido, produção caprichada e todo o elenco da emissora. A responsabilidade pesou no programa -cada vez mais estridente, Fausto se dobrou aos imperativos da luta pela audiência.
Isso significou adotar estratégias arriscadas, como a de apelar, de forma sutil ou não, para a baixaria. Significou também se acorrentar ao esquema de divulgação da Globo e, de quebra, se levar a sério. Coisa que, em geral, se não acaba com o humor, o compromete.


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