São Paulo, quarta-feira, 08 de julho de 2009

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Rodin à baiana

Museu Rodin abrirá em outubro na Bahia com três anos de atraso e peças emprestadas

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Bahia virou motivo de piada ao criar um museu Rodin que tinha só quatro peças em bronze do escultor francês. O governo baiano, que bancara o projeto, prometera trazer 62 esculturas para a inauguração do museu, em dezembro de 2006, que nunca chegaram.
Agora a piada pode perder a validade. O museu deve ser inaugurado na primeira semana de outubro, segundo o secretário de Cultura do governo da Bahia, Márcio Meirelles.
Entre as peças que virão para Salvador estão edições em gesso de "O Pensador", de "O Beijo" e estudos feitos para a "Porta do Inferno", um dos trabalhos mais famosos de Rodin (1840-1917). O governo baiano queria ter uma versão em bronze da "Porta", mas o preço inviabilizou a ideia: custaria 15 milhões, o equivalente a cerca de R$ 41 milhões. O conjunto monumental custaria mais do que o prédio do museu, que custou R$ 15 milhões.
Para quem torceu o nariz para o fato de as edições serem em gesso, o artista plástico e curador Emanoel Araújo avisa que era esse o material que Rodin escolheu para a versão duradoura das esculturas, já que o material original, a terracota, esfacela com o tempo.
O atraso de três anos tem pelo menos três razões, segundo Meirelles. No projeto original, o governo baiano se comprometia a comprar as peças de Rodin -o que não aconteceu. A secretaria de Cultura gastará cerca de R$ 700 mil no transporte e no seguro das obras. As peças foram emprestadas pelo governo francês por um prazo de três anos: depois disso, terão de vir outras esculturas.
As outras razões são mais comezinhas: o museu não tinha um diretor com formação em museologia, como exige a legislação francesa, e a climatização não foi aprovada pelos técnicos daquele país.

Sucesso de público
A ideia de abrir uma espécie de filial do museu Rodin em Salvador partiu de Jacques Villain em 2001, quando ele dirigia o museu francês, segundo Emanoel Araújo. À época, contra todas as previsões, Rodin tornara-se um artista popular no Brasil -uma exposição na Pinacoteca, em 1995, atraiu 150 mil pessoas. Cinco anos depois, outra mostra de Rodin rodou o Nordeste (Recife, Fortaleza e Salvador), com um público final de cerca de 500 mil.
"Em 2001, havia aquela discussão de fazer uma filial do museu Guggenheim no Rio. O Jacques ficou encantado com Salvador e falou: "Bem que a gente podia fazer um museu Rodin aqui". Falei com ACM [o senador Antonio Carlos Magalhães] e ele adorou a ideia".
No ano seguinte, foi assinado um acordo de cooperação entre a França e a Bahia para a construção do museu. Um casarão neoclássico francês, construído em 1912, foi escolhido como sede. Um projeto arquitetônico de Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci restaurou o palacete e o que era para ser um depósito acabou virando uma ala contemporânea, feita em concreto -o projeto levou o primeiro prêmio na Bienal de Arquitetura de São Paulo de 1997.
"Esse museu demorou tanto para sair do papel por causa do chauvinismo dos baianos", diz Araújo. "Eles acham meio estranho ter um museu Rodin na Bahia".

Novo projeto
A demora na abertura provocou mudanças no projeto do museu. Originalmente, deveria abrigar obras de Rodin e de escultores brasileiros do século 19, "que estão completamente esquecidos", segundo Araújo.
O foco agora é outro. Segundo Meirelles, o museu tem três objetivos pelo menos: formar público, fazer com que Rodin faça sentido para quem vive na Bahia e reconectar a arte baiana ao resto do mundo. "A Bahia vive isolada, como se fosse uma ilha autossuficiente. Isso não faz sentido".
A diretora técnica do museu, a museóloga Heloisa Helena Costa, diz que pretende enfatizar o caráter social e pedagógico da instituição. "Será um museu que vai privilegiar o aspecto pedagógico com o objetivo de construir uma cultura da paz".
Costa afirma que seria equivocado pensar que uma cidade que tem laços óbvios com a África, como é o caso de Salvador, não possa se interessar por um artista francês do final do século 19 como Rodin.
"O fato de Rodin trabalhar com o corpo apaga essas diferenças", diz a museóloga. "Há um culto ao corpo aqui que remete a Rodin. Dá para ver nas ruas de Salvador vários Rodin de carne e osso".



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