São Paulo, quarta-feira, 08 de agosto de 2007

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Mostra revisita passado portenho

Fotos de Horacio Coppola estão em exposição no Instituto Moreira Salles

Imagens tiradas para comemorar os 400 anos da cidade refletem mudanças sociais e políticas na Argentina da década de 30

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Numa tarde chuvosa do final dos anos 20, o fotógrafo Horacio Coppola e o escritor Jorge Luis Borges faziam um de seus usuais passeios pelas ruas da capital portenha. Coppola parou diante de uma poça. Ajustou a câmera e disparou. No espelho d'água, estava refletida a silhueta de uma casa do bairro de Palermo. Quando viu a foto do amigo revelada, Borges pontificou: "Isso é Buenos Aires".
A mostra "Visões de Buenos Aires", que será inaugurada amanhã no Rio de Janeiro e virá a São Paulo em novembro, reúne as melhores imagens do fotógrafo e cineasta Horacio Coppola, hoje com 101 anos.
A maior parte das fotos foi tirada entre os anos 20 e 30 e integrou um álbum comemorativo dos 400 anos da cidade, feito por encomenda para o governo argentino, em 1936.
Estão ali o célebre bairro da Boca, a avenida de Mayo, o paseo Colón e a calle Corrientes, num momento especial da história argentina. A retomada do crescimento industrial e a chegada de migrantes transformavam Buenos Aires em uma fervilhante metrópole. Nela se vêem ruas de comércio apinhadas, gente elegante subindo e descendo de bondes ou simplesmente parada na frente de teatros, na beira das fontes ou no fundo dos cafés.
"Coppola tinha uma vocação para a síntese, uma preocupação com a geometria que são sinais de sua modernidade estética", disse à Folha o professor de literatura hispano-americana da USP Jorge Schwartz, curador da exposição. "Vistas hoje, as fotos mostram como Buenos Aires sempre foi uma cidade atípica, que captou o tempo vivido", diz o estudioso, que também nasceu na Argentina.
Os personagens retratados por Coppola refletiam a intensa transformação da sociedade, numa década que começara com um golpe militar, mas mostrava uma surpreendente recuperação econômica.
A cidade via crescer a agitação de grupos sindicais e de militantes anti-fascismo, que se alimentavam da repercussão dos resultados da Guerra Civil Espanhola. Enquanto surgiam editoras, revistas, e a vida intelectual ganhava novo fôlego diante do fantasma dos totalitarismos, morria Carlos Gardel, encerrando um ciclo no universo cultural do país.
Coppola passou um tempo na Europa, onde estudou na Bauhaus. De volta à sua cidade natal, passou a integrar o grupo de artistas que se reunia em torno da figura de Victoria Ocampo e da revista "Sur".
Foi então que passou a conviver mais com Borges. "A influência do escritor foi marcante para que ele passasse a prestar mais atenção aos subúrbios, aos bairros afastados do centro", diz Schwartz. Parte dessa preocupação também está nas imagens da mostra: esquinas silenciosas, os barcos ancorados na Boca ou as luzes da noite portenha refletidas na água esparramada pelas chuvas. Coppola mora hoje em seu velho apartamento na calle Esmeralda, e sai pouco de casa.
Fez questão de comparecer, porém, à homenagem que o Malba (Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires) lhe fez em julho do ano passado, no seu aniversário de cem anos. Na ocasião, o fotógrafo explicou sua fórmula de longevidade em entrevista ao jornal "La Nación". "Vivo num estado de permanente contemplação, essa é uma das razões da minha existência e, sobretudo, da minha felicidade."


HORACIO COPPOLA
Onde:
Instituto Moreira Salles (r. Marquês de São Vicente, 476, Gávea, Rio, tel. 0/xx/21-3284-7400)
Quando: abertura para convidados amanhã, às 19h30; ao público, a partir do dia 10; de ter. a dom., das 13h às 20h; até 28/10
Quanto: entrada franca


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