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Crítica/"Estados Unidos - O Novo Imperialismo"
Estudo da década de 70 sobre imperialismo permanece atual
Obra de autor escocês com prefácio de Eric Hobsbawm tem reedição no Brasil
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Um livro sobre o imperialismo americano
publicado em 1978, 11
anos antes da queda do Muro
de Berlim, por um acadêmico
marxista que pertenceu ao Partido Comunista britânico está
por certo parcialmente datado
-como reconhece no prefácio
Eric Hobsbawm, que compartilha as características acima
com o autor, Victor Kiernan.
Mas a reedição de "Estados
Unidos, o Novo Imperialismo"
faz sentido por pelo menos dois
motivos. Primeiro, porque o tema continua atual, como mostrou o discurso em que Barack
Obama, visando reaproximar
os EUA dos países de maioria
muçulmana, fez um mea-culpa
do golpe que depôs em 1953 o
premiê nacionalista Mohammed Mossadegh, do Irã. Segundo, porque Kiernan, morto neste ano, aos 95, como professor
emérito da Universidade de
Edimburgo (Escócia), não era
estudioso devotado a jargões.
Tendo deixado o PC após a
repressão soviética ao levante
democrático húngaro de 1956,
ele tinha a literatura como segunda fonte de estudos. Publicou um livro sobre Shakespeare e traduziu obras de poetas de
língua urdu.
Tanto a paixão pela literatura
quanto a experiência de Kiernan como professor, nos anos
30, no subcontinente indiano
(então colônia britânica), estão
presentes no livro. A obra dá
voz a escritores contemporâneos dos fatos, a partir da conquista do Oeste pelos desbravadores dos jovens EUA, e reflete
interesse pela perspectiva dos
asiáticos e latino-americanos.
Papel dos impérios
Ontem como hoje, o julgamento do papel dos impérios
depende tanto da orientação
ideológica quanto do ponto de
vista de quem o emite.
Em 2008, dois eminentes
professores de Harvard travaram polêmica sobre a herança
deixada pelos britânicos na Índia. O escocês Niall Ferguson
defendia a influência benigna
do liberalismo inglês nas instituições pós-coloniais. O indiano Amartya Sen citava as ondas
de fome causadas pela economia de exploração colonial.
Kiernan, do mesmo modo,
enfatiza que as conquistas imperiais, diretas ou indiretas, estão sempre revestidas de duas
características: a certeza de superioridade na escala civilizatória e o enunciado, às vezes
sincero, de boas intenções.
Tendo seu país resultado da
revolta contra um império europeu, os americanos sempre
relutaram em aplicar o rótulo a
si. A palavra teve um repique
durante a ocupação das Filipinas, no final do século 19, e só
foi retomada, pelos próprios
neoconservadores, durante o
governo Bush (2001-2009).
É essa dualidade que Kiernan ressalta o tempo todo. O
faz, muitas vezes, pela voz dos
americanos. Assim, diz, os africanos retratados por Edgar Rice Burroughs, autor de "Tarzan
dos Macacos" (1914), "exibem o
anticolonialismo e o racismo
lado a lado". Os vizinhos negros
de Tarzan, conta Burroughs,
são fugitivos da opressão dos
coletores de borracha "daquele
arqui-hipócrita, Leopoldo 2º da
Bélgica". Mas, prossegue, "seus
grossos lábios ressaltados
acrescentavam ainda mais brutalidade a sua aparência".
O historiador lembra também a tradicional rejeição de
dirigentes americanos ao militarismo, tanto que, pouco antes
da Segunda Guerra Mundial, "a
força regular ainda somava 250
mil soldados e o Ministério da
Guerra ficava espalhado a esmo
em alguns prédios".
Kiernan não entra na discussão teórica sobre imperialismo,
objeto de controvérsia. Opta
por definição economicista: a
"coerção exercida pelo exterior, por um ou outro meio, para extorquir lucros além dos
que são garantidos pelas simples trocas comerciais". Ele ignora os estudos sobre hegemonia, em que a potência também
se impõe pela capacidade de
produzir bens coletivos. Erra
ao prever que a saída da estagnação dos EUA nos anos 70 seria promover o aumento do
consumo nos países pobres.
Como se sabe, o que se seguiu
foi a "década perdida", graças
em parte ao aumento dos juros
americanos. Só com a ascensão
da China, a partir de suas próprias reformas capitalistas, haveria uma nova fase de crescimento e redução da pobreza.
ESTADOS UNIDOS, O NOVO IMPERIALISMO
Autor: V.G. Kiernan
Tradução: Ricardo Doninelli-Mendes
Editora: Record
Quanto: R$ 62 (490 págs.)
Avaliação: bom
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