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CRÍTICA
Obra de Naum Alves de Souza cabe no mundo sem se acanhar
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
O volume impressiona. As
quase 1.500 páginas em papel bíblia, com capa elegante,
apresentam as 14 peças de Naum
Alves de Souza para todos os leitores da língua portuguesa. Completa-se com uma cuidadosa
apresentação de Alberto Guzik,
que apresenta sua trajetória desde
o início quando o grupo Pod Minoga dava os primeiros passos
num teatro improvisado em sua
própria casa, e uma auto-avaliação do dramaturgo sem auto-indulgência nem falsa modéstia.
Chega a acanhar. Estaria o teatro brasileiro tão abandonado que
dependa de uma editora portuguesa, a Cena Lusófana, para ter
seu mérito reconhecido? Mas o
mal-estar logo passa: a importância da obra de Naum é de caber no
mundo sem se acanhar com sua
aldeia.
O universo de Naum se equilibra entre a ironia agressiva de
Fellini e a terna amargura de Tenessee Williams. Partindo sempre
das mesmas feridas autobiográficas (como costuma acontecer
com os grandes dramaturgos),
seu imenso dom para o diálogo,
que combina o trivial com o poético, arrasta imediatamente quem
o ouve para o olho do furacão, no
qual adultos-crianças cruéis expõem sua vida solitária com agilidade cinematográfica.
Visão dos ciclos
O volume abre com um Ciclo
Memorialista constituído pela
consagrada trilogia "No Natal a
Gente Vem te Buscar", "A Aurora
da Minha Vida" e "Um Beijo, um
Abraço, um Aperto de Mão" (em
suas duas versões: a masculina e
paulista, escrita para J.C. Violla, e
a feminina e carioca, para Marieta
Severo). Tendo sempre o cuidado
de apresentar antes de cada texto
a ficha técnica completa da encenação inaugural, no Brasil e em
Portugal. Naum não deixa nunca
de agir enquanto dramaturgo encenador, ou seja, aquele que vê
seu texto antes de tudo como matéria-prima para a encenação,
nunca deixando de advertir os
atores contra os perigos do riso
fácil, em preciosas e precisas indicações para a construção dos personagens.
O ciclo se completa com peças
inéditas ("Aquele Ano das Marmitas" e "Ilmo. Sr."), o que tem o
mérito de desfazer a impressão
que o melhor já foi escrito. É sucedido pelo Ciclo Urbano, de peças
menos autobiográficas. Peças de
menor prestígio crítico também,
com exceção de "Suburbano Coração", com Fernanda Montenegro e músicas de Chico Buarque, e
"Nijinsky", bem-sucedido teatro-dança para o eterno parceiro Violla. Ao lado dessas, peças como
"Auto de Natal" e "Strippers" ganham com a releitura.
Um recomeço
Embalado com o cuidado devido, o volume faz com que o caminho que Naum fez ao caminhar
pareça uma estrada reta e coerente: "Medalhas, flores e prêmios
para os que chegam à reta final",
como diz o Diretor de "Aurora...".
Virou monumento o seu tatear?
Esgota-se na consagração? Não:
assim aberto para a cena lusófona, o que se vê aqui é um recomeço. Vivo para a arte, mais vivo do
que nunca, ninguém fecha o pano
de Naum Alves de Souza.
Teatro
Autor: Naum Alves de Souza
Editora: Cena Lusófona
Quanto: R$ 91,39 (1.485 págs.)
Lançamento: hoje, às 19h, na Livraria
Cultura do shopping Villa-Lobos (av.
Nações Unidas, 4.777, SP)
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