São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2008

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Vik Muniz cria imagem de Nossa Senhora de entulho

Obra será a primeira do acervo da sede da Casa Daros Latinamerica, que será inaugurada no Rio no ano que vem

Imagem é inspirada em estátua que fez parte do espaço; instituição quer dar mais visibilidade para os artistas latino-americanos

ANA CAROLINA DE SOUZA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, NO RIO

Um dos artistas brasileiros de maior reconhecimento no exterior, Vik Muniz escolheu brincar com o passado para criar a primeira obra do acervo da sede da Casa Daros Latinamerica, que será inaugurada em 2009 em um antigo casarão em Botafogo, zona sul carioca. A matéria-prima é simples, mas de significado forte.
É com todo tipo de entulho obtido nos dois anos de obras da casa que o fotógrafo paulistano está montando uma imagem de Nossa Senhora das Graças, espécie de padroeira da instituição suíça no Rio.
Toda a estrutura do prédio, erguido em 1866 e comprado por R$ 16 milhões pela Daros, passou por reforma. Mas um detalhe, no alto da fachada, permaneceu intacto. "Gerações e gerações passaram por ali e a estátua de Nossa Senhora das Graças sempre esteve presente. Visitei todo o terreno, mas a lembrança que ficou foi daquela santa, um ícone no lugar", explica Muniz, 47.
Inspirado na imagem, ele juntou restos da estrutura e da decoração do prédio para criar uma nova Nossa Senhora das Graças, de aproximadamente dez metros de extensão, num galpão em Parada de Lucas, bairro da zona norte do Rio, mais conhecido pelas guerras entre traficantes. Gavetas, molas, pequenas pilastras, tampas de garrafa, correntes de bicicleta e, principalmente, pedaços de parede formam a santa.
Muniz concluirá a obra daqui a um mês, fotografando a santa a partir do teto do galpão. "Gosto de mexer com o tempo, trabalhar com o reconhecimento, viabilizar a possibilidade de um reencontro com aquilo que você já conhece", diz.
Pintor, desenhista e fotógrafo, Muniz dedicou os últimos anos a usar materiais inusitados, como chocolate, cabelo e até lixo -usado num projeto em Jardim Gramacho (em Duque de Caxias, Baixada Fluminense)- para compor imagens sobre superfícies e, no final, transformá-las em fotografias.
A imagem de Nossa Senhora das Graças ocupará lugar de destaque no casarão onde funcionará, a partir do segundo semestre de 2009, a Casa Daros Latinamerica. Até lá, a coleção Daros Latinamerica, maior acervo de obras contemporâneas latino-americanas na Europa, continuará em Zurique, na Suíça.
Para Isabella Rosado Nunes, diretora-geral da instituição no Rio, o que está sendo feito em Parada de Lucas exemplifica a intenção da Daros, pois Muniz chamou todos os envolvidos no projeto da casa para participar do trabalho no galpão. "Uma característica muito forte nossa é o diálogo. Queremos interação, troca."
Eugenio Valdés Figueroa, diretor de arte e educação, afirma: "A gente não conseguiria perpetuar todo esse entulho, esse passado dentro da casa para sempre. Mas com o trabalho do Vik estamos conseguindo".
O convite para criar a primeira obra da Daros no Rio partiu de Hans-Michael Herzog, diretor-geral da Coleção Daros Latinamerica, velho conhecido de Muniz. "Posso dizer que sou o artista brasileiro há mais tempo na coleção", diz o brasileiro.
De acordo com Figueroa, o principal objetivo da instituição é dar maior visilidade aos artistas da região. "Queremos reposicionar a arte latino-americana na cena internacional. O que é produzido por aqui não está suficientemente representado na história", diz ele. A primeira grande exposição do local será a coletiva "Cantos Cuentos Colombianos", com artistas da Colômbia.
Antes da inauguração da Casa Daros Latinamerica, Muniz, que mora em Nova York há 26 anos, volta ao Brasil para inaugurar, em janeiro, uma exposição no Museu de Arte Moderna do Rio. "Vai ser a mostra mais completa que já fiz na vida, vou trazer tudo que der", adianta.


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