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Gonzagão ganha disco, filme e museu
Vinte anos após morte, o compositor pernambucano tem a obra resgatada e ganha série de parcerias póstumas
Dirigido por Breno Silveira, longa de ficção a ser lançado em 2011 conta a história do Rei do Baião filtrada pelo olhar do filho Gonzaguinha
JOSÉ ORENSTEIN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Já fui sanfoneiro, rei do
baião, quase sumi na poeira.
Agora, sou lúdico, autêntico.
Virei um tal de folclore." Assim
Luiz Gonzaga, então com 60
anos de vida, se definia no encarte da série Disco de Bolso do
"Pasquim", em 1972.
Agora, 20 anos após sua morte, o "folclore" em torno da figura de Gonzaga pode ser redimensionado. A data redonda
reacende, ainda que timidamente, as luzes sobre o artista
-raiz da formatação da música
popular brasileira no século 20.
Em termos musicais, surgem
agora alguns -poucos- lançamentos em que seu nome está
envolvido. O principal é um disco com regravações de valsas
que Gonzaga compôs na década
de 1940 -algumas ganharam
letras inéditas por artistas como Zeca Baleiro, Abel Silva,
Fernando Brant e Capinan.
Projetos maiores, no entanto, estão previstos para mais
adiante. Ainda sem data definida, um museu dedicado à obra
do artista deve ser inaugurado
em Pernambuco.
E um longa contando parte
de sua história tem estreia programada para 2011 -um ano
antes daquele que seria o centésimo aniversário do músico.
Baseado na biografia da jornalista Regina Echeverria, o
longa "Gonzaguinha e Gonzagão - Explode Coração" já está
em processo de pré-produção.
A direção fica aos cuidados de
Breno Silveira, o mesmo de "2
Filhos de Francisco".
Como fez no trabalho dedicado a Zezé Di Camargo e Luciano, Breno vai partir da vida real
para criar um filme não documental, que pode incluir licenças poéticas. O roteiro, que já
está pronto, parte do olhar do
filho Gonzaguinha para contar
algumas das histórias do pai.
"Gonzaga é nosso primeiro
artista pop", diz o diretor.
"Com sua música, emendou pela primeira vez as pontas desse
país, Nordeste e Sudeste."
Líder da banda Cordel do Fogo Encantado, o pernambucano Lirinha concorda com esse
conceito. "Ele era o nosso Elvis
Presley", diz. "Antes dele, ninguém por aqui ainda tinha pensado em criar um personagem
para fazer música, com conceitos definidos de figurino e tudo
mais. Ele inventou isso."
Lenine também considera
Gonzaga o precursor do "artista vestido, com música e com
luz num ginásio". Além disso,
lembra, ele e o letrista Humberto Teixeira "botaram o Nordeste no centro da atenção, no
mapa do Brasil". "É um débito
que temos com ele", diz.
Rei do Baião
Gonzagão foi realmente popular, de Norte a Sul do país.
Mas, entre 1941 e 1945, era
proibido de cantar nos próprios
discos. Exigência das gravadoras, que então só admitiam cantores "de vozeirão" no primeiro
plano. Sua voz foi gravada pela
primeira vez em um 78 rotações de 1945. A canção era
"Dança Mariquinha", parceria
dele com Miguel Lima.
Ainda assim, o baião formatado por ele se manteve entre
os ritmos predominantes na
música brasileira entre aqueles
anos 40 e o surgimento da bossa nova (de que, aliás, Gonzaga
também foi influência), no final
da década seguinte.
"A bossa nova era coisa da elite, não reunia milhares de pessoas em uma praça como acontece com o baião e a música de
Gonzaga até hoje", diz o pesquisador Paulo Vanderley, criador
de site dedicado ao artista
(www.luizluagonzaga.com.br). "Aqui, no Nordeste, todo
ano tem missa em homenagem
a ele no dia de sua morte."
Já no Sudeste, a importância
de Gonzaga, ainda que jamais
negada, parece ser subestimada. Seu nome nunca aparece
antes de outros "gênios" como
Tom Jobim, João Gilberto e
Heitor Villa-Lobos.
O momento de maior baixa
aconteceu nos anos que se seguiram ao surgimento da bossa
nova. Quando, em 1968, o agitador cultural Carlos Imperial
criou o boato de que os Beatles
gravariam "Asa Branca", Gonzaga voltou à mídia. Essa é, até
hoje, a música mais emblemática criada pelo artista.
"É importante para a minha
geração rever "Asa Branca" como hino do Nordeste", diz Lirinha. "Não nos identificamos
mais com versos como "Que
braseiro, quer fornalha, nenhum pé de plantação". Precisamos mudar essa imagem."
Valsas
Com 32 anos, Lirinha é o
mais novo dos "parceiros" de
Luiz Gonzaga escalados por
Gereba, cantor e violonista
baiano, para o CD que ele organiza em homenagem ao Rei do
Baião. Integram o time nomes
ligados à trajetória de Gonzagão, como Gil, Dominguinhos,
Elba Ramalho e Fagner.
O projeto nasceu em 1985,
numa visita que Gereba fez ao
sítio de Luiz Gonzaga em Exu,
terra em que nasceu. "Ele me
mostrou todas as suas gravações em 78 rotações", lembra.
"Fiquei encantado com a sofisticação daquela música."
Passados mais de 20 anos, a
ideia de recuperar aquele material amadureceu. Gereba reuniu -com a ajuda de pesquisadores- aquelas antigas gravações e, aos poucos, fez os convites para letristas, cantores e
sanfoneiros trabalharem as
canções de Gonzagão.
Com lançamento previsto
para o começo do ano que vem,
o álbum vai se chamar "Luas do
Gonzaga". Por ser um disco de
valsas, pode ajudar a resgatar
Gonzaga da imagem "regionalista" que ainda o persegue.
A partir daí, quem sabe, o tal
"folclore" que o próprio artista
já disse ter se tornado pode finalmente dar lugar ao gigante
da música que ele de fato foi.
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