São Paulo, terça, 8 de dezembro de 1998

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TEATRO
Leitura dramática de "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", do Prêmio Nobel José Saramago, é hoje, na Folha
Possi mostra Maria concebida com pecado

CYNARA MENEZES
da Reportagem Local

Maria, não a Virgem da Bíblia, mas a mulher que dorme com o carpinteiro José, abre a leitura dramática, hoje às 19h30, de "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", espetáculo dirigido por José Possi Neto baseado no romance de José Saramago, ganhador do Nobel de Literatura deste ano.
A leitura, que integra o projeto Quarta Função, acontece no auditório da Folha (al. Barão de Limeira, 425, 9º andar, Campos Elíseos, região central).
Raul Cortez (o Diabo), Tuca Andrada (Jesus), Lígia Verdi e Julia Catelli integram o elenco que fará a leitura, além de Suzana Faini como Maria.
Apesar de Cortez desejar fazer os dois papéis -"Estou entre Deus e o Diabo", brincou-, devido à estrutura dos diálogos outro ator será convidado para interpretar o "Todo-Poderoso" na peça, com estréia prevista para o primeiro semestre do próximo ano.
A idéia de fazer um espetáculo a partir do "Evangelho" de Saramago não foi uma escolha, segundo José Possi Neto. "Era um projeto sobre a "quaternidade' que em determinado momento chegou ao livro, e eu aceitei", disse o diretor.
A "quaternidade' é uma imagem que se opõe ao conceito cristão da "trindade' (pai, filho e Espírito Santo), ao incluir, também, como quarto elemento, o feminino e o mal. Com a adoção do "Evangelho', o texto tomou outro rumo.
Segundo Possi Neto, a própria dicotomia bem-mal não aparece, mas a mistura entre os dois elementos. "Saramago não deixa clara essa dicotomia. O Jesus dele é o homem que se indaga qual é seu destino, que tenta saber o que é verdade e o que é mentira", diz.
"Também se discute no texto a questão da responsabilidade e da culpa em José, por ter salvado o filho de Deus de ser morto pelos soldados de Herodes, mas não ter podido avisar às outras famílias", diz Possi Neto. Possi Neto conta que a figura de José, na Bíblia, sempre o intrigou. "Ele é quase um eunuco."
O diretor não teme a reação da Igreja Católica. "Acho que no Brasil as coisas são diferentes", diz. "O livro, na verdade, é extremamente religioso. Não nega, por exemplo, a figura de Cristo como filho de Deus. Só acaba com certos dogmas, como a virgindade."
A atriz Suzana Faini, que interpreta a mãe de Jesus pela primeira vez em sua carreira, acha "maravilhosa" a humanização dos personagens bíblicos feita por Saramago. "Estudei em colégio de freiras, e sempre me perturbou essa visão católica da concepção. Nunca aceitei a idéia do "pecado original'."
Na leitura, são apresentados três momentos: a Anunciação -quando Maria é informada de que será a mãe de Jesus-, a passagem meditativa (e tentadora) de Cristo pelo deserto e a manhã de nevoeiro, quando Jesus encontra Deus e o Diabo no mar.
A estrutura dramática da leitura foi concebida por Possi Neto e Julia Catelli, também atriz e co-produtora do espetáculo. A entrada é franca. Os interessados em assistir devem fazer reservas entre 14 e 17h pelo telefone (011) 224-3743.
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O evento tem os apoios da RioArte, da revista "Marketing Cultural" e do restaurante Antiquarius.



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