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"A VIDA ME FEZ ASSIM"
Teresa Cristina dosa timidez e altivez
DA REPORTAGEM LOCAL
Após a estréia em 2002 com
um álbum todo dedicado à
obra de Paulinho da Viola, Teresa
Cristina, 36, vive agora sua hora
da verdade.
É tempo de se apresentar como
compositora, não mais apenas como a cantora sambista tímida e
precisa de dois anos atrás.
"A Vida me Fez Assim", segundo disco de Teresa com seu Grupo
Semente, vai sem sede ao pote.
Oito faixas são de punho próprio
(com ou sem parceiros), as demais pertencem ao domínio dos
clássicos do samba.
Apaixonada pelos sambistas da
antiga, Teresa canta Zé da Zilda (a
divertida "Um Calo de Estimação"), Silas de Oliveira ("Na Água
do Rio"), Zé Keti e Elton Medeiros
("Sorri"), Manacé ("Quantas Lágrimas"), Candeia ("Viver"), Wilson Moreira e Nei Lopes ("Peito
Sangrando") etc.
Quando canta a si própria, faz a
lição, soando como discípula daqueles nomes todos, notadamente de Paulinho da Viola.
O terreno, portanto, é o da tradição, de poesia de versos mansos, como a de "Acalanto" ("em
todo samba que faço/ tem espaço,
eu ponho o mar").
É o litoral do samba, mas aí há o
contraponto, que é um dos dados
intrigantes da obra ainda menina
de Teresa Cristina.
Como autora, ela tende a soar
interiorana, a parecer caipira ("A
Borboleta e o Passarinho"), a pesquisar as origens de seus pais, nos
sambas de roda do interior da Bahia. Indo mais fundo e mais longe,
visita origens de cativeiro, do passado escravo de sua linhagem.
"Pedro e Tereza" insinua um
vínculo sexual entre negro escravo e sinhazinha branca, com toda
a dor que isso pudesse implicar.
"Se negro soubesse o talento
que ele tem/ não aturava desaforo
de ninguém", condensa "Pedro e
Tereza", citando escravidão, crítica velada ao imaginário de Gilberto Freyre, canto baiano de terreiro
e reivindicação de igualdade e
dignidade.
O grupo miscigenado de Teresa
transforma dor em festa, fazendo
o ouvinte de "Pedro e Tereza" se
sentir na fazenda, no interior fundo do Brasil.
O significado do samba, nesse
momento, se dissocia de futilidades de Carnaval e de leis de Gerson ou malandros afins.
Teresa Cristina chegou tímida,
tímida ainda está. Mas a altivez
-de sambista, mulher, negra,
compositora etc.- é o ponto de
ganho de "A Vida me Fez Assim".
Deve vir mais por aí.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
A Vida me Fez Assim
Artistas: Teresa Cristina e Grupo
Semente
Lançamento: Deckdisc
Quanto: R$ 30, em média
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