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LIVROS
ROMANCE
Estreante francês fala à Folha sobre o "hit" "Como Me Tornei Estúpido"
Martin Page ri de si, elogia a estupidez e faz sucesso
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Martin Page não é nada bobo. E
como sujeito esperto que é sabe
rir de si mesmo. Martin Page não
tinha muitas opções senão a de rir
de si mesmo. Depois de tentar
sem sucesso estudar psicologia,
lingüística, direito, história da arte, filosofia etc. havia encasquetado que seria um escritor.
Martin Page escrevera sete romances, do início ao fim, e os sete
foram recusados por "todas as
editoras de Paris". As gavetas da
escrivaninha já não davam conta
de tantos projetos "engavetados".
"Só me restava tirar sarro de
mim mesmo", conta o escritor
francês. Voilà. Martin Page criou,
à sua imagem e semelhança, um
personagem "inteligente incompreendido", um sujeito que, farto
de sofrer com sua sabedoria mal-aproveitada, resolve virar um estúpido para se dar bem na vida.
"Como Me Tornei Estúpido"
chegou lá. Primeira obra publicada por Page fez sucesso não só em
Paris, como em toda a França; fez
sucesso não só na França, como
na Europa; espalhou-se em círculos concêntricos até lugares distantes como Japão e Brasil.
Publicado aqui há menos de um
mês, o livro já teve esgotada sua
primeira edição. "É um resultado
surpreendente para um livro de
um autor francês estreante", comenta seu editor brasileiro, Paulo
Rocco. Mais 4.000 "Como Me
Tornei Estúpido" estão sendo impressos pela Rocco. Mais 4.000 sujeitos chamados Antoine, protagonista do livro, serão liberados
pelo Brasil, em sua "odisséia pessoal" rumo à estupidez.
Alguns desses Antoines em versão brasileira têm boas chances de
encontrar com seu criador. Page é
um dos convidados da Bienal do
Livro do Rio, que acontece entre
12 e 22 de maio e tem a França como país homenageado.
O escritor de 30 anos não é propriamente um entusiasta da literatura que se faz em seu país.
"Gosto dos franceses clássicos.
Mas quando leio os de agora eu
raramente fico satisfeito. Não vejo, também, ligação entre o que os
autores franceses estão fazendo e
o que faço", diz à Folha esse admirador do japonês Haruki Murakami, do americano Jim Morrison (não o do Doors) e do brasileiro Abrrô -como ele chama
Caio Fernando Abreu (1948-94).
Não foi de nenhum deles que
partiu a centelha inicial que motivou Page a escrever seu "Como
Me Tornei Estúpido". A inspiração vem de mais longe. Um dia, o
escritor estava com seu grosso par
de óculos direcionado para a Bíblia, mais especificamente para o
Eclesiastes, quando topou com a
idéia de que quem pensa muito
sofre mais. "Já na Antigüidade se
estabelecia esse vínculo entre conhecimento e tristeza", expressa.
Antoine, o anti-herói do romancista, era assim, sabido e triste. Era um sujeito que traduzia
aramaico, que sabia consertar
aviões da Primeira Guerra, que
conhecia cada detalhe sobre o cinema de Frank Capra. Mas Antoine sentia que sua massa cinzenta
era "plúmbea", pesada demais, só
impedia que ele avançasse.
"Ele era inteligente de uma forma e burro de outra. Não tinha
uma inteligência fundamental
que é a de querer viver a vida. Esta
é uma doença moderna, muito
comum em países ricos. Tenho
vários amigos assim", diz Page.
Vivemos tempos mais estúpidos? "Não. Todos os tempos são
estúpidos. Este só parece mais estúpido porque é o nosso tempo."
Martin Page não é nada estúpido e não perde seu tempo. Desde
o sucesso de "Como Me Tornei"
em 2001, já escreveu mais quatro
livros e vem se saindo muito bem.
E os sete romances inéditos? "Ficarão para sempre na gaveta.
Eram horríveis." Martin Page não
é nada bobo -e ele sabe sempre
rir de si mesmo.
Como Me Tornei Estúpido
Autor: Martin Page
Tradutor: Carlos Nougué
Editora: Rocco
Quanto: R$ 24 (160 págs.)
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