São Paulo, sábado, 09 de abril de 2005

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LIVROS

ROMANCE

Estreante francês fala à Folha sobre o "hit" "Como Me Tornei Estúpido"

Martin Page ri de si, elogia a estupidez e faz sucesso

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Martin Page não é nada bobo. E como sujeito esperto que é sabe rir de si mesmo. Martin Page não tinha muitas opções senão a de rir de si mesmo. Depois de tentar sem sucesso estudar psicologia, lingüística, direito, história da arte, filosofia etc. havia encasquetado que seria um escritor.
Martin Page escrevera sete romances, do início ao fim, e os sete foram recusados por "todas as editoras de Paris". As gavetas da escrivaninha já não davam conta de tantos projetos "engavetados".
"Só me restava tirar sarro de mim mesmo", conta o escritor francês. Voilà. Martin Page criou, à sua imagem e semelhança, um personagem "inteligente incompreendido", um sujeito que, farto de sofrer com sua sabedoria mal-aproveitada, resolve virar um estúpido para se dar bem na vida.
"Como Me Tornei Estúpido" chegou lá. Primeira obra publicada por Page fez sucesso não só em Paris, como em toda a França; fez sucesso não só na França, como na Europa; espalhou-se em círculos concêntricos até lugares distantes como Japão e Brasil.
Publicado aqui há menos de um mês, o livro já teve esgotada sua primeira edição. "É um resultado surpreendente para um livro de um autor francês estreante", comenta seu editor brasileiro, Paulo Rocco. Mais 4.000 "Como Me Tornei Estúpido" estão sendo impressos pela Rocco. Mais 4.000 sujeitos chamados Antoine, protagonista do livro, serão liberados pelo Brasil, em sua "odisséia pessoal" rumo à estupidez.
Alguns desses Antoines em versão brasileira têm boas chances de encontrar com seu criador. Page é um dos convidados da Bienal do Livro do Rio, que acontece entre 12 e 22 de maio e tem a França como país homenageado.
O escritor de 30 anos não é propriamente um entusiasta da literatura que se faz em seu país. "Gosto dos franceses clássicos. Mas quando leio os de agora eu raramente fico satisfeito. Não vejo, também, ligação entre o que os autores franceses estão fazendo e o que faço", diz à Folha esse admirador do japonês Haruki Murakami, do americano Jim Morrison (não o do Doors) e do brasileiro Abrrô -como ele chama Caio Fernando Abreu (1948-94).
Não foi de nenhum deles que partiu a centelha inicial que motivou Page a escrever seu "Como Me Tornei Estúpido". A inspiração vem de mais longe. Um dia, o escritor estava com seu grosso par de óculos direcionado para a Bíblia, mais especificamente para o Eclesiastes, quando topou com a idéia de que quem pensa muito sofre mais. "Já na Antigüidade se estabelecia esse vínculo entre conhecimento e tristeza", expressa.
Antoine, o anti-herói do romancista, era assim, sabido e triste. Era um sujeito que traduzia aramaico, que sabia consertar aviões da Primeira Guerra, que conhecia cada detalhe sobre o cinema de Frank Capra. Mas Antoine sentia que sua massa cinzenta era "plúmbea", pesada demais, só impedia que ele avançasse.
"Ele era inteligente de uma forma e burro de outra. Não tinha uma inteligência fundamental que é a de querer viver a vida. Esta é uma doença moderna, muito comum em países ricos. Tenho vários amigos assim", diz Page.
Vivemos tempos mais estúpidos? "Não. Todos os tempos são estúpidos. Este só parece mais estúpido porque é o nosso tempo."
Martin Page não é nada estúpido e não perde seu tempo. Desde o sucesso de "Como Me Tornei" em 2001, já escreveu mais quatro livros e vem se saindo muito bem. E os sete romances inéditos? "Ficarão para sempre na gaveta. Eram horríveis." Martin Page não é nada bobo -e ele sabe sempre rir de si mesmo.


Como Me Tornei Estúpido
Autor:
Martin Page
Tradutor: Carlos Nougué
Editora: Rocco
Quanto: R$ 24 (160 págs.)


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