São Paulo, domingo, 09 de abril de 2006

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AL JAZIRA INTERNACIONAL


Com estrelas do jornalismo, canal estréia em junho e promete dar voz à "periferia mundial"

TV árabe lança rede em inglês e vende ao Brasil

Associated Press
Equipe da Al Jazira na sede do canal, em Doha (Qatar)


RAFAEL CARIELLO
LAURA MATTOS

DA REPORTAGEM LOCAL

A rede de TV Al Jazira, conhecida mundialmente desde a Guerra do Afeganistão e apelidada de CNN árabe, programou para o mês de junho o lançamento de seu canal de notícias em inglês.
No Brasil, representantes da Al Jazira Internacional tiveram reuniões há duas semanas com as principais operadoras de TV paga e iniciaram negociações para incluir a emissora nos pacotes dos assinantes. Procuraram também a Globo a fim de discutir o fornecimento de conteúdo. Farão o mesmo com outras redes abertas.
A empresa Multipole, sediada em São Paulo, foi contratada para prestar consultoria à Al Jazira Internacional na América Latina, onde já conta com 3.000 assinantes para o canal em árabe. Nos encontros com as TVs pagas e com a Globo, foi apresentado um DVD de oito minutos ao qual a Folha teve acesso. O vídeo deixa claro que a Al Jazira não quer vender a imagem de TV do Oriente Médio, mas de porta-voz da "periferia" mundial. Um norte-americano afirma que "gostaria de conhecer o outro lado da história". Em tomadas da África, um narrador fala em "vozes raramente ouvidas".
David Frost, premiado jornalista inglês e estrela do novo canal, diz que a Al Jazira será distinta das redes "tradicionalmente centradas no Ocidente". O DVD apresenta o aparato tecnológico da estação e informa que a maior parte das imagens será em alta definição, com qualidade próxima à de cinema. Há ainda declarações de âncoras e diretores contratados, grande parte egressa da norte-americana CNN e da inglesa BBC, principais concorrentes da Al Jazira Internacional.

Fato "inédito"
Para o professor de mídia e comunicação da London School of Economics Roger Silverstone, o lançamento de um canal de notícias em inglês produzido a partir de um país não-ocidental é um fato "absolutamente inédito" e pode vir a provocar mudanças na mídia dos países "centrais". "Os canais atuais terão de registrar o que a Al Jazira disser e levar em conta a existência de perspectivas diferentes, não só sobre o mundo árabe, mas sobre nós mesmos."
Opinião semelhante tem Frost, único jornalista no mundo a ter entrevistado os últimos sete presidentes dos EUA e os últimos seis primeiros-ministros da Inglaterra. "Nós, no Ocidente, temos transmitido nossas opiniões e visões para o restante do mundo por muitos anos. É no mínimo justo que essas áreas não-ocidentais tenham agora a chance de retribuir o favor", disse, não sem alguma ironia, em entrevista ao "New York Times", em fevereiro.
Lucia Newman, chefe do escritório da CNN em Havana até ser contratada pelos árabes para atuar em Buenos Aires (leia ao lado), disse que a idéia da rede é aumentar a presença da América Latina na cobertura jornalística.
No Brasil, o lançamento é visto com simpatia por TVs. "O diretor da Al Jazira para as Américas esteve com [Carlos Henrique] Schroder [diretor da Central Globo de Jornalismo], mostrou o projeto e iniciou conversações para tenhamos uma parceria. Seria nos moldes das que mantemos com agências internacionais, para usar o material deles. Para nós, será muito interessante, temos todo o interesse de fechar um contrato", afirmou Ali Kamel, diretor-executivo de jornalismo da Globo.
Segundo ele, a Al Jazira colaborará com a "pluralidade" do jornalismo da Globo. "Fora o fato de ser bem mais presente no mundo árabe do que as TV ocidentais."
A Record também espera fechar acordo. "O lançamento é uma boa notícia, principalmente neste momento em que o mundo assiste à concentração dos meios de comunicação em poucas corporações", afirmou Douglas Tavolaro, diretor de jornalismo da Record.

Em busca de um bilhão
Fundada em 96 por um xeque do Qatar que destitui o pai do poder e institui a liberdade de imprensa, a Al Jazira se tornou uma das principais fontes de informação sobre conflitos no Oriente Médio. É conhecida por veicular mensagens de Osama bin Laden. Essas e outras imagens são reproduzidas por TVs no mundo todo, inclusive pelas poderosas CNN e BBC. Foi da rede britânica, aliás, que vieram os primeiros profissionais para a formação da rede.
A diferença entre a Al Jazira árabe e a internacional não será só a língua, mas a programação. Para o canal em inglês, que busca audiência potencial de um bilhão de telespectadores no mundo todo, promete uma cobertura mais ampla. Haverá cerca de 40 sucursais em vários países. Só em Washington, trabalham perto de cem profissionais. Na América Latina, além de Newman, o canal contará com correspondente em Caracas e tem planos futuros de escritório brasileiro.
O sinal será irradiado de quatro diferentes locais, alternadamente, ao longo das 24 horas de programação: Doha (Qatar), Kuala Kumpur (Malásia), Londres (Inglaterra) e Washington (EUA), de onde virá o conteúdo produzido no continente americano.
As cifras não são reveladas, mas o número de profissionais -e especialmente de "grifes"- já contratados impressionam.
Além de Frost e Newman, diversos expoentes dos jornalismos americano e inglês passaram a integrar a rede: Veronica Pedrosa, uma das principais apresentadoras da CNN; Stephen Cole, âncora da BBC; Riz Khan, que participou do lançamento do canal internacional de notícias da BBC, transmitindo o primeiro programa quando o canal foi ao ar, em 1991.
Silverstone, da London School of Economics, avalia as razões para recorrerem a nomes tão conhecidos: "Eles precisam da experiência e do estilo de discurso que esses profissionais serão capazes de prover. Além disso, a Al Jazira tem de parecer e soar como um canal ocidental para ser assistida e levada a sério, mesmo que sua visão de mundo seja distinta".


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