São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2008

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CONEXÃO POP

Teoria da dependência


O circuito de festivais brasileiros está sendo bancado por corporações ou por dinheiro público

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

O MODELO de organização dos grandes shows no Brasil (particularmente o do circuito de festivais) é dependente. Dependente de eventos corporativos e dependente de dinheiro público.
Empresas de cerveja, de refrigerante, de celulares, de telefonia celular, portais de internet, enfim, empresas de todo o tipo (uma fabricante de pneus organizará um evento de jazz e world music em São Paulo, em junho...) não apenas emprestam o nome a um festival, como empurram sem parcimônia sua parafernália de marketing no ambiente do evento, criando uma concorrência com as próprias atrações artísticas.
Festivais corporativos existem no mundo inteiro. Mas, no Brasil, a ação das empresas é muito mais agressiva. Lá fora, na Escócia, há o T in the Park; na Inglaterra, o V Festival. O primeiro é bancado pela Tennents, marca de bebidas; o segundo, pela companhia Virgin. O nome das empresas é associado com discrição; os locais não são invadidos por merchandising abusivos. Bem diferente do que acontece por aqui.
Um outro efeito desse modelo de negócio é que o Brasil virou o paraíso dos cachês. Os produtores de shows buscam os mesmos artistas, e aí entram em uma espécie de leilão.
Os preços vão lá para cima e forma-se um ciclo: as bandas sabem que no Brasil paga-se cachês milionários; os únicos que podem pagar esses cachês são os festivais corporativos; assim, essas bandas só vêm ao Brasil para tocar em festivais corporativos. O Kaiser Chiefs estava em disputa. Fechou com o Planeta Terra.

 

Aí olhamos para o outro lado, o dos festivais "independentes". Não dá para chamar de "independente" um circuito de festivais que depende de dinheiro público para existir. Como acontece no cinema nacional, em que os filmes são bancados por leis de incentivo e não há a menor preocupação com bilheteria, os festivais "independentes" beneficiam-se de um edital da Petrobras que goteja até R$ 250 mil na mão dos produtores de cada evento.
Uma das "contrapartidas" exigidas pela Petrobras é que esses eventos tenham como finalidade "divulgar a música brasileira" e as cenas locais. Não entendo como pode haver divulgação da música brasileira quando esses eventos escalam bandas gringas de terceiro escalão ou grupos europeus de heavy metal cuja relevância artística é quase nula. E aqui ocorre mais uma anomalia.
Bandas indies péssimas, que não tocariam nem em matinês de pubs londrinos, arranjam lugares confortáveis nesses eventos devido à "brodagem" entre produtores de festivais, músicos, blogueiros etc. Triste.
 

O Radiohead iniciou turnê nesta semana, em West Palm Beach, na Flórida. O Ben Ratliff, do "New York Times", fez a crítica do show. Ela está, traduzida, no blog http://ilustradanopop.folha.blog.uol.com.br

thiago@folhasp.com.br


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