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Crítica/MPB
Cibelle se afasta da eletrobossa e busca personalidade própria
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Paulista radicada em
Londres, a cantora e
compositora Cibelle é a
voz da vez na cena da música
brasileira produzida no exterior. Seu segundo álbum, lançado em maio na Europa e nos
EUA, desembarca no Brasil trazendo elogios de influentes publicações estrangeiras.
Como de costume, no caso de
uma artista relativamente nova, não faltaram comparações.
Lá fora, a música e a voz de Cibelle já foram equiparadas às
das cantoras Björk, Beth Orton
e Madeleine Peyroux, ou mesmo à da banda Morcheeba, mas
nenhuma dessas referências se
sustenta, de fato.
Claro que é quase inevitável
lembrar de Bebel Gilberto.
Além de também ter trabalhado com o cultuado produtor
Suba, Cibelle grava pelo selo Ziriguiboom, o mesmo responsável pelo lançamento do álbum
"Tanto Tempo", que transformou a bossa eletrônica da filha
de João Gilberto em fenômeno
mundial, no início da década.
Também havia um quê de
Bebel Gilberto em "Cibelle"
(2003), seu álbum de estréia,
mas as semelhanças pararam
por aí. No CD de agora, "The
Shine of Dried Electric Leaves", Cibelle se afasta da onda
da eletrobossa, afirmando-se
como intérprete e compositora
de personalidade, que busca o
novo.
A primeira faixa já soa como
uma declaração de estilo próprio. Forçando um timbre vocal quase adolescente, Cibelle
interpreta de maneira delicada
a canção "Green Grass", do etílico norte-americano Tom
Waits. É acompanhada apenas
por harpa, sininhos e outras
percussões suaves, além da voz
soturna do DJ Spleen.
Outra criativa releitura é a de
"Por Toda a Minha Vida" (de
Tom Jobim e Vinicius de Moraes), que surge em uma versão
etérea, ambientada pelos teclados de Marc Hollander e da
cantora. Ruídos de copo de
plástico sugerem um disco de
vinil riscado.
Há também duas conhecidas
canções de Caetano Veloso no
álbum. Em "London, London",
Cibelle esquece a melancolia da
gravação original, transformando-a em uma descontraída
e acústica bossa nova, que conta com participação do cantor
neofolk Devendra Banhart.
Já a psicodélica releitura do
baião "Cajuína", que encerra o
álbum com brilho especial, destaca a guitarra de Felipe Pagani,
em meio a insólitos ruídos e
efeitos eletrônicos.
Cibelle também se destaca
como compositora, assinando
nove das 14 faixas, algumas em
parceria. E a idéia de dividir o
trabalho de produção com o
brasileiro Apollo Nove, o inglês
Mike Lindsay, o francês Yann
Arnaud e o suíço Spleen trouxe
variedade sonora para o álbum.
Assim nasceram faixas bem
originais, como a bela "City
People" (parceria com Apollo
Nove), que inclui participação
do guitarrista Lanny Gordin,
entre teclados, marimba, palmas e diversas percussões. Ou a
estranha "Mad Man Song"
(parceria da cantora com
Spleen), cujo arranjo é baseado
em ruídos de colheres, cubos de
açúcar e copos de café.
Ao final das 14 faixas, fica difícil resistir a um trocadilho
com o idiossincrático título do
álbum (o brilho das folhas secas
elétricas). Para brilhar, Cibelle
não precisou de muita eletrônica nem mesmo do batido modismo da eletrobossa.
CARLOS CALADO é jornalista e crítico de música, autor do livro "A Divina Comédia dos Mutantes", entre outros
THE SHINE OF DRIED ELECTRIC LEAVES
Artista: Cibelle
Lançamento: Ziriguiboom/ST2
Quanto: R$ 30, em média
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