São Paulo, sexta-feira, 09 de junho de 2006

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Crítica/MPB

Cibelle se afasta da eletrobossa e busca personalidade própria

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Paulista radicada em Londres, a cantora e compositora Cibelle é a voz da vez na cena da música brasileira produzida no exterior. Seu segundo álbum, lançado em maio na Europa e nos EUA, desembarca no Brasil trazendo elogios de influentes publicações estrangeiras.
Como de costume, no caso de uma artista relativamente nova, não faltaram comparações. Lá fora, a música e a voz de Cibelle já foram equiparadas às das cantoras Björk, Beth Orton e Madeleine Peyroux, ou mesmo à da banda Morcheeba, mas nenhuma dessas referências se sustenta, de fato.
Claro que é quase inevitável lembrar de Bebel Gilberto. Além de também ter trabalhado com o cultuado produtor Suba, Cibelle grava pelo selo Ziriguiboom, o mesmo responsável pelo lançamento do álbum "Tanto Tempo", que transformou a bossa eletrônica da filha de João Gilberto em fenômeno mundial, no início da década.
Também havia um quê de Bebel Gilberto em "Cibelle" (2003), seu álbum de estréia, mas as semelhanças pararam por aí. No CD de agora, "The Shine of Dried Electric Leaves", Cibelle se afasta da onda da eletrobossa, afirmando-se como intérprete e compositora de personalidade, que busca o novo.
A primeira faixa já soa como uma declaração de estilo próprio. Forçando um timbre vocal quase adolescente, Cibelle interpreta de maneira delicada a canção "Green Grass", do etílico norte-americano Tom Waits. É acompanhada apenas por harpa, sininhos e outras percussões suaves, além da voz soturna do DJ Spleen.
Outra criativa releitura é a de "Por Toda a Minha Vida" (de Tom Jobim e Vinicius de Moraes), que surge em uma versão etérea, ambientada pelos teclados de Marc Hollander e da cantora. Ruídos de copo de plástico sugerem um disco de vinil riscado.
Há também duas conhecidas canções de Caetano Veloso no álbum. Em "London, London", Cibelle esquece a melancolia da gravação original, transformando-a em uma descontraída e acústica bossa nova, que conta com participação do cantor neofolk Devendra Banhart.
Já a psicodélica releitura do baião "Cajuína", que encerra o álbum com brilho especial, destaca a guitarra de Felipe Pagani, em meio a insólitos ruídos e efeitos eletrônicos.
Cibelle também se destaca como compositora, assinando nove das 14 faixas, algumas em parceria. E a idéia de dividir o trabalho de produção com o brasileiro Apollo Nove, o inglês Mike Lindsay, o francês Yann Arnaud e o suíço Spleen trouxe variedade sonora para o álbum.
Assim nasceram faixas bem originais, como a bela "City People" (parceria com Apollo Nove), que inclui participação do guitarrista Lanny Gordin, entre teclados, marimba, palmas e diversas percussões. Ou a estranha "Mad Man Song" (parceria da cantora com Spleen), cujo arranjo é baseado em ruídos de colheres, cubos de açúcar e copos de café.
Ao final das 14 faixas, fica difícil resistir a um trocadilho com o idiossincrático título do álbum (o brilho das folhas secas elétricas). Para brilhar, Cibelle não precisou de muita eletrônica nem mesmo do batido modismo da eletrobossa.


CARLOS CALADO é jornalista e crítico de música, autor do livro "A Divina Comédia dos Mutantes", entre outros

THE SHINE OF DRIED ELECTRIC LEAVES
   
Artista: Cibelle
Lançamento: Ziriguiboom/ST2
Quanto: R$ 30, em média


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