São Paulo, sábado, 09 de junho de 2007

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Crítica/narrativa

Autor desvirtua Proust em pseudobiografia

NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Epopéia. Numa de suas acepções, é uma sucessão de eventos extraordinários, capazes de provocar admiração e surpresa. Tragédia. Numa acepção coloquial, é uma série de acontecimentos funestos, capazes de despertar terror ou piedade. A vida de Marcel Proust foi uma epopéia e uma tragédia, vivida em nome da produção de um romance gigantesco em todos os sentidos, "Em Busca do Tempo Perdido".
Romance. Prosa na qual se narram fatos imaginários ou reais, cujo interesse pode ser a aventura, o estudo de costumes ou tipos psicológicos ou a crítica social. "Em Busca do Tempo Perdido" é um romance que, ao narrar a decadência da aristocracia francesa, questiona o significado do tempo, da memória e da solidão e recalques incontornáveis de cada um. É uma das pontes que introduzem a modernidade na literatura.
Farsa. Ação ou representação que induz ao logro. É isso o que se lê no livro "Uma Noite no Majestic". Usando a extraordinária vida de Proust e seu romance como iscas, o livro é uma espécie de revista "Caras" sobre a alta sociedade parisiense da década de 20. O título do livro e sua chamada de capa, "Proust, Picasso, Joyce, Stravinsky e Diaghilev no grande jantar modernista de 1922", são um embuste.
Picasso e Stravinsky simplesmente estavam neste jantar. Diaghilev o organizou. Joyce e Proust não trocaram mais do que três frases suspeitas. São 40 páginas descrevendo uma pequena conversa e mais todos os outros convidados desinteressantes de uma festa malsucedida. As outras 260 praticamente não se referem mais ao encontro. E parte-se para uma pseudobiografia de Proust, quando na verdade arrolam-se eventos curiosos e semipicantes sobre nomes infindáveis da sociedade. O livro chega até a cogitar que o verdadeiro tema de Proust seja o seu homossexualismo problemático e dá ao tema um tom de fofoca tão flagrante que chega a depor sobre os recalques do próprio autor.
Felizmente, a vida do personagem é tão fascinante, que transborda a atmosfera ligeira do livro. Mas, para isso, há muitas biografias melhores.


UMA NOITE NO MAJESTIC
Autor:
Richard Davenport-Hines
Tradução: Berilo Vargas
Editora: Record
Quanto: R$ 48 (350 págs.)
Avaliação: ruim


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