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Crítica/narrativa
Autor desvirtua Proust em pseudobiografia
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Epopéia. Numa de suas
acepções, é uma sucessão de eventos extraordinários, capazes de provocar
admiração e surpresa. Tragédia. Numa acepção coloquial, é
uma série de acontecimentos
funestos, capazes de despertar
terror ou piedade. A vida de
Marcel Proust foi uma epopéia
e uma tragédia, vivida em nome
da produção de um romance gigantesco em todos os sentidos,
"Em Busca do Tempo Perdido".
Romance. Prosa na qual se
narram fatos imaginários ou
reais, cujo interesse pode ser a
aventura, o estudo de costumes
ou tipos psicológicos ou a crítica social. "Em Busca do Tempo
Perdido" é um romance que, ao
narrar a decadência da aristocracia francesa, questiona o significado do tempo, da memória
e da solidão e recalques incontornáveis de cada um. É uma
das pontes que introduzem a
modernidade na literatura.
Farsa. Ação ou representação que induz ao logro. É isso o
que se lê no livro "Uma Noite
no Majestic". Usando a extraordinária vida de Proust e
seu romance como iscas, o livro
é uma espécie de revista "Caras" sobre a alta sociedade parisiense da década de 20. O título
do livro e sua chamada de capa,
"Proust, Picasso, Joyce, Stravinsky e Diaghilev no grande
jantar modernista de 1922", são
um embuste.
Picasso e Stravinsky simplesmente estavam neste jantar.
Diaghilev o organizou. Joyce e
Proust não trocaram mais do
que três frases suspeitas. São
40 páginas descrevendo uma
pequena conversa e mais todos
os outros convidados desinteressantes de uma festa malsucedida. As outras 260 praticamente não se referem mais ao
encontro. E parte-se para uma
pseudobiografia de Proust,
quando na verdade arrolam-se
eventos curiosos e semipicantes sobre nomes infindáveis da
sociedade. O livro chega até a
cogitar que o verdadeiro tema
de Proust seja o seu homossexualismo problemático e dá ao
tema um tom de fofoca tão flagrante que chega a depor sobre
os recalques do próprio autor.
Felizmente, a vida do personagem é tão fascinante, que
transborda a atmosfera ligeira
do livro. Mas, para isso, há muitas biografias melhores.
UMA NOITE NO MAJESTIC
Autor: Richard Davenport-Hines
Tradução: Berilo Vargas
Editora: Record
Quanto: R$ 48 (350 págs.)
Avaliação: ruim
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