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"RELÂMPAGOS"
Ferreira Gullar procura os vínculos entre arte e vida
TIAGO MESQUITA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Para Ferreira Gullar, faz tempo que a idéia de inovação se
tornou doença senil das artes
plásticas. Já no livro "Argumentação contra a Morte da Arte" (93),
ele tentava revisar suas posições
sobre a arte moderna, desvinculando-as de um movimento linear
de sucessão de procedimentos
criativos que se enfrentavam, sobrepondo uns aos outros, e procurava outros critérios.
O autor via sentido no esforço
inovador quando ele se identificava com o desinibir do gesto artístico. No meio do caminho, no entanto, a procura pelo novo se
transformou em obsessão. Parte
da arte apostou tudo na superação permanente. A sede de novidade se sobrepôs à qualidade dos
trabalhos. Com todas as armas
apontadas para a superação dos
antecedentes, a arte teria desistido
de sugerir relações mais vigorosas
com o mundo. Este vínculo mais
imediato da obra com outras instâncias da vida interessam Gullar
em seu novo livro, "Relâmpagos".
O poeta observa as relações internas dos trabalhos e procura
uma força poética que não aparece em sua mera inserção na marcha histórica da arte. Uma força
histórica se revela nos trabalhos,
mas se mostra mais em sua capacidade de modificar a nossa percepção do que na inscrição desses
artistas na história da arte.
Provavelmente, existe nessa
avaliação mais sincrônica da obra
uma certa ruptura com alguns
textos neoconcretos de Ferreira
Gullar. Sua defesa da vanguarda,
entre os anos 50 e 60, incluía a inserção do grupo na ponta de um
desenvolvimento evolutivo.
O interesse do autor naquele
grupo passava pela direção que
eles davam à abstração geométrica, como ele mesmo afirma no
texto sobre Lygia Clark em "Relâmpagos".
Lá, portanto, já havia o tal relampejo, que o escritor tenta agora capturar na fruição das obras
em forma de ensaio, verso ou depoimento. Trata-se do que ele
chama de "força semântica", uma
capacidade visual de sugestão de
relação do homem com as coisas
do mundo, independente de rupturas no interior da história.
Por isso escolhe artistas que não
promoveram grandes choques
como Klimt e Morandi e outros
que criaram suas obras à margem
dos grandes acontecimentos artísticos como Rousseau e Raphael. E, quando trata de grandes
renovadores, como Picasso, Matisse e Calder, interessa para Ferreira Gullar a capacidade imediata de sugerir uma nova lida com o
mundo.
Tiago Mesquita é crítico de arte
Relâmpagos
Autor: Ferreira Gullar
Editora: Cosac & Naify
Quanto: R$ 89 (176 págs.)
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