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Mautner lança sua ode à "brasilificação"
Em "O Filho do Holocausto", escritor fala de sua vinda para o Brasil e da reconstrução pessoal por que teve que passar
Primeiro encontro com a
brasilidade aconteceu com
a babá filha-de-santo, que
o embalava na pensão onde
morava, no Rio de Janeiro
DA REPORTAGEM LOCAL
O livro de memórias que o
cantor, músico, compositor e
escritor Jorge Mautner, 65,
lança hoje, em São Paulo, é uma
ode à "brasilificação" do mundo, como o próprio autor define. Ou mais um samba-exaltação ao país de uma "vítima salva pela generosidade natural de
um país-continente", como diz
Caetano Veloso, no prefácio.
Em "O Filho do Holocausto",
Mautner narra suas memórias
de filho de pais refugiados do
nazismo, no Brasil, depois de
passagens pela Itália e por Portugal. E o histórico do abrigo
caloroso, no país distante da
Áustria natal de sua família, seria, diz ele, uma reafirmação da
gênese das idéias do artista.
"Toda a minha obra é um
caos. Uma visão de um poeta
que foi desconstruído pelo Holocausto e teve que se reconstruir com todos os dados maravilhosos do Brasil, e essa é a essência do livro", diz Mautner à
Folha. "O que seria para alguns
uma desconstrução conceitual,
no meu caso foi necessidade
pessoal. Uma reconstrução a
partir das ambivalências e contrastes de família européia refugiada no Brasil."
O marco inicial do encontro
de Mautner, filho de pai judeu
(Paul) com mãe católica (Ana),
com a brasilidade, se dá ainda
muito pequeno, com a babá Lúcia. Filha-de-santo do candomblé, ela o embalava na pensão
em que moravam na rua Cândido Mendes, no Rio de Janeiro,
onde nasceu no dia 17 de janeiro de 1941. Foi dali que George
Henrique Mautner, aos quatro
anos, partiu para ver as comemorações do fim da Segunda
Guerra, em 18 de julho de 1945.
A lembrança deste dia é ponto de partida para Mautner fazer sua ode ao Brasil. Do Rio,
onde recebia acenos do presidente Getúlio Vargas, do Palácio do Catete, Mautner foi para
São Paulo, em 1948, com pais
separados, e agora vivendo com
um padrasto alemão ("o inimigo, entre aspas, porque era pessoa boníssima, um pacifista").
Chuva cinza
Na Paulicéia, ele tem novamente que se reconstruir e
aprender a amar a cidade cuja
"chuva e cor cinza" ele inicialmente odiava.
"Tinha apenas sete anos e superei um pessimismo abismal",
conta Mautner, que anos depois, em 1956, começava a escrever seu primeiro livro,
"Deus da Chuva e da Morte",
que lhe valeu o Prêmio Jabuti
de autor-revelação em 1962, e
em que ele "saudava a tristeza e
a chuva como sendo minhas irmãs, e a melancolia da cor cinza
e o despedaçamento kaótico,
como meus irmãos".
Com a gênese da sua filosofia
do Kaos, Mautner encerra o fio
das suas memórias, de infância
e adolescência, ilustrado com
fotos de seu álbum de família.
"O resto eu já escrevi em termos de ficção ou diários", diz o
escritor, sem descartar novo livro autobiográfico. "Vivendo
no caos, nunca se sabe."
O livro termina com letras de
canções "harmônicas e dissonantes", que Mautner compôs
entre 1956 e 1958, entre elas
"Vampiro". E um posfácio assinado pelo amigo Gilberto Gil,
em que ele diz que, ainda que a
ciência e a arte pudessem representar a complexidade da
presença humana na vida, "seria difícil que elas pudessem
(...) representar a complexidade que se reúne nesse homem".
(EDUARDO SIMÕES)
O FILHO DO HOLOCAUSTO
Autor: Jorge Mautner
Editora: Agir
Quanto: R$ 34,90 (190 págs.)
Lançamento: segunda-feira, dia 11/9,
às 20h, na Livraria da Vila
(r. Fradique Coutinho, 915,
tel. 0/xx/11/3814-5811)
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