São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2006

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"Aprendi a fazer crítica nos jornais", diz Candido

Crítico diz que costume da "fluência jornalística" influenciou o seu estilo

Para Candido, avaliação literária na imprensa sofreu com o desaparecimento progressivo do "crítico titular" e suas colunas fixas


DA REPORTAGEM LOCAL

A seguir, Antonio Candido fala sobre a influência do jornalismo em seu estilo e as mudanças na crítica literária no país.

 

FOLHA - O sr. chegou a ser criticado por esse seu estilo?
ANTONIO CANDIDO -
Há muito tempo um colega do Rio disse que sou claro por ser superficial, pois as coisas profundas são necessariamente complexas e só podem ser expressas de maneira equivalente. Quem sabe? É preciso notar que em matéria de estudos literários sou autodidata, formado, não em letras, mas em ciências sociais. Aprendi a fazer crítica na imprensa, sobretudo neste jornal, depois de um início em nossa revista "Clima", de modo que me acostumei à fluência jornalística. Mas no fundo não gosto mesmo de termos difíceis, como os que predominaram no tempo da moda estruturalista. Freqüentemente eles são um jeito de dar aparência profunda a coisas simples.

FOLHA - O sr. acompanhou a quente a produção do que houve de melhor na literatura no século 20, registrando suas idéias e avaliações nos jornais. Como vê o trabalho da imprensa e o espaço da crítica de artes e literatura nos grandes jornais de hoje? A que se devem as diferenças entre esse trabalho na atualidade e na segunda metade do século 20 no país?
CANDIDO -
Vou responder apenas a uma parte, ressalvando que não sou muito qualificado no caso, porque leio pouco os jornais e na verdade me limito a dar uma olhada nesta Folha.
Mas acho que na segunda metade do século 20 houve uma modificação acentuada no que se refere à atividade crítica, com o desaparecimento progressivo do "crítico titular", que era como se costumava designar o encarregado de uma seção, situada muitas vezes na parte inferior da página e denominada "rodapé" ou "folhetim". Quase sempre ela tinha um título permanente, abaixo do qual vinha o do artigo do dia, e o encarregado devia fornecer um artigo por semana, tendendo ao tipo ensaio.
Era a velha tradição francesa do jornalismo crítico, que no Brasil teve representantes de qualidade, e a começar por José Veríssimo, prolongando-se por Alceu Amoroso Lima, Álvaro Lins e outros. Essa linhagem assegurava um nível elevado e o leitor se habituava ao critério de um esmo crítico, dando lugar ao que se pode denominar "efeito de continuidade", importante para configurar a atuação cultural da crítica. Neste sentido, é preciso destacar o caso, creio que o único, de um grande crítico, Wilson Martins, que persistiu nesta tradição sem quebra de nível.


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