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Aguinaldo Silva fala sobre "Senhora do Destino", a novela mais vista da história
O senhor das 8
Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
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O autor Aguinaldo Silva com o gato Tadeu, na borda da piscina de sua casa na Barra da Tijuca (RJ) |
DANIEL CASTRO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
O ex-repórter policial Aguinaldo Silva, 61, temia que "Senhora
do Destino", que termina amanhã, fosse um "desastre", porque,
apesar "de certinha", ela experimentou um "roteiro moderno" e
"acabou várias vezes".
Mas não. A novela que contou a
saga de uma retirante nordestina
que teve a filha seqüestrada por
uma megavilã foi um surpreendente sucesso. Com pelo menos
45 milhões de telespectadores, é a
mais vista de todos os tempos.
Para fazer de sua primeira novela solo (todas as anteriores, todas
das oito, ele dividiu a autoria com
alguém) um fenômeno, Silva tratou de promovê-la pessoalmente,
driblando a burocrática divulgação feita pela Globo.
Por causa dessa abertura a jornais e revistas, o último capítulo
só traz uma expectativa, se Maria
do Carmo (Suzana Vieira) termina com Dirceu (José Mayer) ou
Giovanni (José Wilker). Aguinaldo Silva diz que escreveu, e a Globo gravou, os dois finais. E que só
tomará a decisão de qual deles levará ao ar amanhã à tarde.
Na entrevista a seguir, o novelista fala da novela, de homossexualismo, de imprensa, de nordestinos e um pouco de política.
Folha - Você esperava que a novela fizesse tanto sucesso?
Aguinaldo Silva - Não. Achava
que podia ser um desastre, porque é diferente das outras. Mesmo
quando a novela é certinha, pode
não dar certo, imagine quando ela
não é. Tive muito medo disso.
Folha - Mas ela não é certinha,
com os elementos consagrados?
Silva - Sim, mas tem uma linguagem que as novelas nunca tiveram, um roteiro moderno, contemporâneo. Ela é muito rápida
para o telespectador. Essa é uma
novela que, na verdade, acabou
várias vezes. As pessoas ficaram
presas a ela, porque ela não dava
chance ao telespectador de respirar. Apostei todas as minhas fichas nessa novela, porque eu precisava fazer uma novela solo.
Folha - Nessa novela você foi mais
acessível à imprensa, não?
Silva - Sim, porque descobri que,
durante muitos anos, a novela foi
um trabalho meio amadorístico.
Era uma coisa poderosíssima,
mas feita aos trancos. A relação
do autor com a imprensa também
era uma coisa amadorística.
Sempre senti um certo desdém
da mídia pelo trabalho dos novelistas. Entendi que a culpa não é
da mídia. Os autores, amadores,
se colocavam num pedestal e não
falavam com fulano ou sicrano.
Você tem não só que escrever
sua novela, tem que promovê-la.
A única maneira de fazer isso, claro, é sabendo lidar com a mídia.
Então eu parti para isso. Isso me
tomou um tempo enorme, porque decidi que ia divulgar a novela da melhor maneira possível.
Folha - Você acha que essa divulgação gerou repercussão e, com isso, alguns pontos no Ibope?
Silva - Ah, sem dúvida. Mesmo
sabendo o que vai acontecer, o telespectador quer ver como é que
vai acontecer. E a palavra escrita
tem um peso que é fundamental.
O que está no jornal, na revista,
tem um peso que a televisão não
tem, porque ela se perde no éter.
Folha - Esta é a sua primeira novela que não tem nada de realismo
mágico, certo?
Silva - Sim. Porque acho que a
realidade ficou tão exacerbada e
intensa que realismo mágico não
faz mais sentido. O realismo mágico foi um modismo latino-americano, que passou. Recentemente, passei os olhos por "Cem Anos
de Solidão" [clássico do realismo
mágico, de Gabriel García Márquez] e achei uma bobagem.
Folha - O que você planejou e não
conseguiu fazer nessa novela?
Silva - A história de Iara Steiner
[Helena Ranaldi] era muito boa, a
da mulher independente que resolve ter um filho de produção independente e que depois se dá
mal e não tem a menor dúvida em
cobrar pensão do pai da criança.
Por várias razões, essa história
não foi utilizada como deveria.
Folha - E o que você não planejou
e acabou dando certo?
Silva - Essa novela foi milimetricamente planejada. Tem coisa como essa da Ranaldi que eu não fiz,
mas nada foi improvisado.
Folha - O público, que aceitou as
lésbicas de sua novela, está mais tolerante com o homossexualismo?
Silva - O Brasil sempre foi tolerante. Desde a época da colônia.
Os cronistas do começo do século
20, tipo João do Rio, eram homossexuais. Pelo menos o Rio sempre
foi uma cidade muito liberal. Mas,
quando você vai abordar um assunto desses numa novela, tem
que tomar certas precauções, porque você não está escrevendo só
para o público mais esclarecido,
está escrevendo para o país inteiro. Provavelmente, se as minhas
meninas não fossem duas pessoas
tão certinhas, e isso foi proposital,
acho que criaria um mal-estar.
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