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COMIDA
Governo estuda transformar prato nordestino em patrimônio
Baião faz história
ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois que o acarajé e o ofício
das baianas receberam registro de
patrimônio cultural do país no último ano, o baião-de-dois pode
ter sua chance de entrar para o
"hall da fama" das comidas brasileiras, tornando-se patrimônio
imaterial do Brasil.
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(Consea) do governo federal discutirá neste mês a possibilidade
de tornar a receita cearense, feita a
base de arroz, feijão e queijo de
coalho, um bem cultural registrado no Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) durante a sessão anual do
Comitê Permanente de Nutrição
das Nações Unidas em Brasília.
Com a iniciativa, o prato poderá,
por exemplo, entrar no cardápio
da merenda escolar.
Mas se o baião-de-dois, de fato,
receber o registro de bem cultural,
isso não significa que a receita será "tombada" e não poderá jamais ser feita de maneira diferente da original, criada no sertão
nordestino. Ela passará por pesquisa e documentação, e as versões adaptadas ainda poderão ser
produzidas.
Em São Paulo, é possível conhecer diferentes tipos de baião-de-dois: desde o baião "raiz", feito
com arroz, feijão verde fresco,
queijo de coalho, nata de leite, cebolinha e coentro -um tempero
comumente preterido no Sudeste-, até variações com bastante
salsinha, carnes e outras iguarias
aparentemente estranhas para a
combinação, como o dendê. Para
os puristas a idéia pode assustar,
mas uma vez que a oportunidade
é dada, a surpresa tem boas chances de agradar.
O restaurante com cara de boteco Biu, em Pinheiros, tem uma receita bem diferente. A proprietária Edinólia da Silva, 48, que comanda a cozinha do restaurante
desde a inauguração, há 23 anos,
usa lingüiça curada, carne seca
desfiada, manteiga de garrafa e
até leite de coco. O processo de
preparação também foi adaptado
por ela. Os ingredientes são cozidos separadamente e depois unidos em um refogado. "Faço de
um jeito que eu inventei aqui, diferente do que a minha mãe fazia
na Bahia", diz Silva, que sugere rabada, carneiro ou picanha como
acompanhamentos.
A produtora de internet Tereza
Cândida, 24, cearense radicada
em São Paulo, conta que passou
por uma saga que batizou de
"baião intuitivo" em busca do
prato perfeito: foi em nove diferentes restaurantes e ainda não
encontrou um semelhante ao feito no Ceará. "As pessoas têm muita boa vontade para acertar, mas
incrementam, deixam de usar
coisas essenciais como o feijão
verde, que é difícil de achar, e
usam carne e calabresa. Eu já comi baião até com açafrão", conta.
Mesmo assim, Cândida não se decepcionou. "Todos são gostosos,
mas não acho que são baião-de-dois. Deveriam ter outro nome, tipo baião paulista", sugere.
No restaurante Colher de Pau,
no Itaim, com um pouco de sorte,
até o feijão verde entra no prato.
"O sabor do prato fica mais fresco. Mas às vezes não encontramos
e substituímos pelo feijão de corda", explica a chef Rosele Tejada.
O prato é servido com carne-de-sol, paçoca (preparado de farinha
com carne seca pilada), banana
frita, batata doce e mandioca.
No Tordesilhas, em Cerqueira
César, o baião-de-dois entra no
bufê do fim de semana. A chef
Mara Salles prefere a receita mais
tradicional. "Filosofando um pouquinho, eu acho
que nós brasileiros gostamos
muito das misturas. Essa misturinha de arroz com
feijão mostra um
pouco da nossa
característica."
BIU. Onde: rua Cardeal Arcoverde, 776,
Pinheiros, tel. 0/xx/ 11/ 3081-6739.
COLHER DE PAU. Onde: rua Dr. Mario
Ferraz, 563, Itaim, tel. 0/xx/11/3168-8068.
TORDESILHAS. Onde: rua Bela
Cintra, 465, Cerqueira Cesar, tel. 0/xx/
11/3107-7444
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