São Paulo, sexta-feira, 10 de abril de 2009

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Afro Pop

Produtores europeus buscam na África novas sonoridades, que já começaram a ocupar as pistas; a cantora M.I.A. é a principal divulgadora dessa tendência

Divulgação
Esau Mwamwaya, do Maláui, e a dupla de produtores Radioclit

LEANDRO FORTINO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há fortes sinais de que a África está prestes a oferecer para o mundo uma nova tendência da música eletrônica. Criando um novo afropop, com poderosas influências de tambores e com vocalistas/rappers originários do continente, produtores europeus têm buscado por lá os elementos que compõem faixas que, aos poucos, começam a colocar as pistas para ferver.
No caldo que está sendo cozido, entra um elemento catalisador fundamental, a artista inglesa M.I.A., que sempre fez questão de promover pelo mundo sons e estilos de países menos desenvolvidos -numa ideologia que ela chama de "democracia do Terceiro Mundo".
Em seu último disco, "Kala" (2007), há, por exemplo, a presença do rapper nigeriano Afrikan Boy, em "Hussel". Mas a vencedora do Oscar por "Quem Quer Ser um Milionário?" (ela está na faixa "O Saya", de A.R. Rahman) também tem prazer em colaborar com os outros.
Numa dessas, M.I.A. emprestou seu vocal -e influência- para o projeto Esau Mwamwaya & Radioclit Are the Very Best, que pretende lançar seu disco de inéditas neste ano.
Esau é original do Maláui e se encontrou com a dupla Radioclit, formada pelo sueco Johan Karlberg e pelo francês Etienne Tron, em Londres. Lançaram no ano passado uma "mixtape" que logo caiu nas graças da crítica indie inglesa e americana.
Em "Are the Very Best" -que pode ser baixado gratuitamente-, o Radioclit manipulou bases e batidas de outros artistas, como os indies Vampire Weekend e Architecture in Helsinki e até de uma cover dos Beatles, e soltou para Esau cantar letras sobre os costumes de sua tribo, a Angonde, e sobre os problemas, como o abuso contra mulheres (leia quadro ao lado).

Buraka Som Sistema
Um dos momentos mais interessantes é a base de "Paper Planes", de M.I.A., com uma letra cantada em chichewa (o idioma de Maláui). A artista ainda participa de "Get It Up".
O produtor sueco destaca a diferença de assunto nas letras de Esau, se comparadas às composições europeias. "É engraçado porque eles têm ensinamentos diferentes dos nossos. A letra de "Tengazako", por exemplo, significa pegue o que é seu e é sobre todos serem amigos, respeitando e ajudando o outro; tudo isso significa "tengazako"." Ou seja, você poderá dançar sem saber uma música sobre ancestrais enterrados nos quintais do Maláui.
O trabalho do Radioclit com africanos também pode ser ouvido em um remix da produção "Township Funk", do DJ sul-africano Mujava. "Na África do Sul, há uma cena chamada "pretoria house", da qual o Mujava faz parte. De lá, também gosto de um estilo chamado funama, que é uma dance music muito rápida, como o kuduro, mas com acordeão", diz Karlberg.
No estilo kuduro, mistura de dance music veloz e hip hop cantado na nossa língua, seu principal representante, o grupo angolano/português Buraka Som Sistema, deve finalmente mostrar seu requebrado para os americanos, na próxima sexta-feira, quando se apresenta no grande festival de música dos EUA, o Coachella.
O novo trabalho do Buraka, "Black Diamond" (lançado em dezembro passado e sem previsão de lançamento no Brasil), também conta, é claro, com a participação de M.I.A., na música "Sound of Kuduro".
"De uns dois anos para cá há uma maior aceitação do público europeu e americano para aquilo que está sendo produzido na África, ritmos que vêm do Zaire, do Congo, de Mali. A música eletrônica africana tem uma série de influências que não são muito comuns para quem vive na Europa", conta um dos três produtores do Buraka, o cubano Conductor, que mudou para Luanda, capital de Angola, quando era criança.
Ele explica o "efeito M.I.A.": "Há muitos produtores cansados do ciclo musical em que vivem, e M.I.A. tem estado à frente do que se tem feito. Ela está em uma constante busca".


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