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MÚSICA
Universal reedita discos cruciais do revolucionário violonista fluminense, mas erra datas e informações básicas
Beleza e balbúrdia guiam caixa de Baden
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
A sempre precária discografia brasileira em CD do violonista e inventor fluminense Baden Powell ganha reforço tardio
com o lançamento de caixa de luxo com 13 títulos que ele gravou
entre 59 e 71 (leia quadro ao lado).
Em uma de suas últimas entrevistas, em 99, Baden reclamou à
Folha da gravadora Universal,
que jamais havia relançado em
CD títulos de prestígio mundial.
"Não existe um na praça, quero
até mover um processo", disse.
Baden morreu em 2000, aos 63
anos, e só agora a Universal paga a
dívida. Na elegante caixa, está tudo que foi lançado desde a estréia
solo de Baden em LP (no ainda
convencional "Apresentando Baden Powell e Seu Violão") até sua
saída da Philips (hoje Universal).
Isso inclui suas grandes obras-primas, gravadas em meados dos
anos 60 pelos selos independentes
Elenco e Forma, cujos catálogos
também pertencem à Universal.
Pela Forma, ele concebeu, com
Vinicius de Moraes, o revolucionário "Os Afro-Sambas de Baden
e Vinicius" (66), que remeteu a
bossa nova ao candomblé e à pulsão rítmica do samba, ao mesmo
tempo em que desfolclorizava os
sons tradicionais da Bahia.
Quando morreu, Baden havia se
tornado evangélico e já não aceitava mais os versos "profanos" de
Vinicius para "Canto de Iemanjá"
nem os "saravás" do "Samba da
Bênção". Mas permanecia -e
permanece- a colossal influência dos afro-sambas sobre a música brasileira, erudita ou popular.
Antes e depois da passagem pelo Forma, Baden fixou residência
longa no mítico selo Elenco, de
Aloysio de Oliveira, um dos homens por trás da bossa nova.
Dessa associação, que persistiu
entre 62 e 70 (quando a Elenco já
virara selo da Philips), resultaram
outros dos discos inquestionáveis
de Baden, mas resulta também a
balbúrdia documental em que a
caixa de CDs chega mergulhada.
Pode-se argumentar que a própria discografia de Baden era confusa. Em 63, ele se mudou para
Paris, de onde começou a gravar e
lançar abundante discografia internacional. Muitos desses discos
só vinham a ser lançados pela Philips com anos de atraso e títulos
modificados -mas com repertório idêntico. Nesse caso, está o fortíssimo "Baden", que a Universal
data em 68, mas que em 66 fora
"Tristeza on Guitar", em histórica
primeira edição européia.
A gravadora se justifica afirmando que optou por manter as
datas do primeiro registro de cada
disco na companhia, e não necessariamente sua edição original.
Mas a presença de dois especialistas -Carlos Alberto Sion e Tárik de Souza- na condução do
projeto de reedição desautorizaria equívocos elementares, como
datar em 67 os dois mais importantes discos de Baden pela Elenco, "Baden Powell Swings with
Jimmy Pratt" e "À Vontade".
O primeiro é um dos títulos
inaugurais da Elenco. Biógrafos se
debatem em definir a abertura da
gravadora entre 62 ou 63 -em 67
não foi, pode ter certeza. A biógrafa oficial de Baden, Dominique
Dreyfus, crava em 63 o crucial "À
Vontade", em que o artista revelava "Consolação" e "Berimbau".
A história da Elenco é mesmo
nublada pela falta de documentação à época, mas a Universal e
seus pesquisadores se atrapalham
pelas próprias pernas. Os textos
explicativos tentam escapulir pela
tangente, mas criam confusões
paralelas: até ali se insinua que o
velhusco "Apresentando Baden
Powell" é de 59, mas a data de registro é 61. E pronto, deixa para lá
se houve uma revolução bossa-novista separando as duas datas.
Felizmente, o vexame documental sabota, mas não ofusca a
grandeza artística da obra reeditada. Essa se estende não só à volumosa produção de violão e aos
afro-sambas cantados por Vinicius com o Quarteto em Cy mas
também às diretrizes de sambão
que marcaram a parceria posterior com Paulo César Pinheiro.
A redescoberta, aqui, é um disco
creditado aos Cantores da Lapinha -na verdade dois membros
do MPB-4 e duas integrantes do
Quarteto em Cy. Elizeth Cardoso
devia protagonizar esse disco,
mas sua gravadora desautorizou.
Sambas ali contidos, como
"Aviso aos Navegantes" e "Quaquaraquaquá", logo a seguir se
tornariam emblemas para Elis
Regina, que já namorara a nova
dupla em 67 (com "Lapinha").
Voltam à história agora, tardiamente, em versão menos glamourosa, bem ao gosto de Baden.
Baden Powell
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 150 (caixa com 13 CDs),
preço sugerido pela gravadora
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