São Paulo, domingo, 10 de maio de 2009

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Crítica/"Utamaro e Suas Cinco Mulheres" e "Mulheres da Noite"

Mizoguchi volta em dois estilos

Diretor japonês tem lançados no Brasil o inovador "Mulheres da Noite" e o tradicional "Utamaro..."

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

O destino das mulheres, em particular o das mulheres pobres, era sombrio, no entender de Kenji Mizoguchi.
As casas de prostituição eram um destino frequente para elas e foram também um assunto frequente do grande cineasta. Ele não as conhecia apenas como artista. Consta que gastava ali todo o seu dinheiro. E que não devia ser pouco, já que era um dos três principais cineastas japoneses.
Mesmo com todo esse prestígio, Mizoguchi passou por momentos difíceis, e um deles foi o pós-guerra, quando seu estilo foi considerado fora de moda.
Pesavam para isso não apenas a ascensão de uma geração recente (Akira Kurosawa à frente, mas não sozinho) e os novos ares do mundo -e do Japão-, após a derrota militar.
É possível que "Utamaro e Suas Cinco Mulheres", de 1946, fosse um desses filmes vistos com reservas: trata-se de falar da paixão de um pintor por sua arte e, sobretudo, o empenho em captar a vida, integralmente, que punha em cada retrato de mulher que realizava.
É um filme sobre o cinema, em grande medida. Um filme "tradicional", para os padrões de 1946, talvez bastante alienado, o que não deixava de convir para um cineasta que havia estado muito próximo do governo durante a guerra. Mas um belíssimo filme, quando visto em 2009.
"Mulheres da Noite" participa do movimento de "atualização" de Mizoguchi. O filme é de 1948 e nos chega em sua versão internacional, de 72 min. (no Japão foi exibido em 100 min.), o que lhe confere uma agilidade maior do que a média do cinema nipônico e alguns saltos estranhos no tempo.
A partir do fim da guerra, Mizoguchi inteirou-se sobre o "novo estilo", em especial o neo-realismo italiano. Foi isso que pediu a seu fiel roteirista, Yoda Yoshikata: um filme nos moldes contemporâneos. Yoda escreveu e Mizoguchi filmou conforme os novos cânones: só em locações.
Isso, aliás, não prejudica em nada a história da viúva de guerra que, apesar dos enormes problemas econômicos, recusa-se a cair na prostituição. Consegue um emprego (tornando-se, na verdade, amante do chefe) e terá na irmã, mais tarde, uma rival.
Assim como em "Utamaro", Mizoguchi é brilhante em cada enquadramento, e em particular no trabalho de longos e elaborados planos, em que é um dos pioneiros no cinema sonoro. Ele cerra seu objeto com precisão quase maníaca, fiel a sua máxima, segundo a qual "é preciso lavar o olho após cada plano". Aprender a ver novamente, a ver o novo.
Kenji Mizoguchi é um desses diretores de cinema que, quanto mais se vê, mais se percebe a qualidade única: "Utamaro" e "Mulheres da Noite" são filmes com modos de produção, assuntos e até estilos diferentes, mas ambos admiráveis.


UTAMARO E SUAS CINCO MULHERES/MULHERES DA NOITE
Distribuição:
Lume
Quanto: R$ 49,90, em média
Classificação: não indicado a menores de 10 anos ("Utamaro...') e 14 anos ("Mulheres...')
Avaliação: ótimo



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