São Paulo, Sábado, 10 de Julho de 1999
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LIVRO
"Os Crimes de Charlotte Brontë", lançado no Reino Unido, traz à luz assassinatos e questiona autoria de obra
Algo de podre no lar das irmãs Brontë

SYLVIA COLOMBO
de Londres

O pântano próximo ao vilarejo de Haworth, no norte da Inglaterra, inspirou o cenário sombrio de um dos clássicos da literatura britânica: "O Morro dos Ventos Uivantes", de Emily Brontë.
Segundo o escritor e criminologista James Tully, porém, essa paisagem soturna também teria presenciado os encontros fortuitos e as intrigas criminosas que dinamitaram a literária e misteriosa família Brontë. É isso que o autor mostra em "Os Crimes de Charlotte Brontë", livro que acaba de ser lançado no Reino Unido.
Depois de pesquisar antigas cartas, testamentos e rascunhos, Tully levanta a teoria de que a família Brontë teria vivido envolta em assassinatos, traições e vinganças, além de questionar a autoria de algumas obras.
A família Brontë viveu no velho presbitério do vilarejo de Haworth, entre os anos de 1820 e 1861. Foi ali que as irmãs Charlotte, Emily e Anne, filhas do reverendo Patrick Brontë, escreveram algumas obras-primas da literatura do período vitoriano.
Charlotte, a mais velha, contribuiu com "Jane Eyre" e outros romances; Emily, com "O Morro dos Ventos Uivantes"; e Anne, com "The Tenant of Wildfell Hall".
Havia ainda um irmão, Branwell, que vivia bêbado e envolto em crimes de extorsão, para quem os familiares não pareciam dar muita atenção.
Vamos à história oficial: as três irmãs eram caladas, devotadas ao pai, gostavam umas das outras e não tinham grande interesse pelo sexo oposto. Apesar da pouca educação escolar, as irmãs possuíam o dom da narrativa e a paixão pela literatura, ambicionando apenas a pureza formal em seus romances.
O aparecimento de um homem na família, Arthur Bell Nicholls, trouxe uma grande alegria à primogênita, Charlotte. Nicholls, empregado em Haworth como assistente do reverendo Brontë, casou-se com ela depois da morte trágica de Emily e Anne, ambas abatidas pela tuberculose.
Charlotte, porém, também morreu poucos meses depois de seu casamento, consumida pelo mesmo mal.
Assim, em menos de uma década, todos os irmãos Brontë, inclusive Branwell, estavam mortos. Jovens, teriam sido vítimas das terríveis condições climáticas e da fragilidade agravada por doenças respiratórias.
Durante muito tempo, a narrativa acima ficou gravada como a verdade sobre o destino dos Brontë, ainda que alguns acadêmicos tivessem questionado a autoria de um ou outro livro e levantassem a hipótese de conspiração.
Agora, vamos à versão de James Tully. Em "Os Crimes de Charlotte Brontë", o escritor britânico aposta na possibilidade de que Arthur Nicholls tenha envenenado as duas irmãs Emily e Anne, interessado em embolsar os lucros de suas obras. Nicholls teria agido tendo Charlotte como cúmplice. O casamento de ambos teria, então, viabilizado a tomada da herança.
Tully acredita ainda que Nicholls também tenha sido o responsável pela morte da própria Charlotte, do irmão Branwell e do reverendo Patrick.
Como evidências, ele apresenta cartas que revelam novos ingredientes do imbróglio. Emily e Nicholls teriam tido um caso, e ele a teria estimulado a roubar a idéia da história de "O Morro dos Ventos Uivantes", que na verdade seria do irmão Branwell. Depois, Nicholls teria tratado de eliminar ambos. Ainda segundo Tully, Emily teria ficado grávida de Nicholls, que temia que isso pudesse estragar sua reputação.
Para apresentar suas descobertas, Tully escreveu "Os Crimes de Charlotte Brontë" em formato de romance, nos moldes da narrativa celebrizada pelos Brontë. A versão do escritor é relatada por meio de dois pontos de vista fictícios: o diário da governanta da casa e o relato de um advogado que encontra o diário anos depois.
A Sociedade Brontë protestou contra a publicação do livro: "Nem o senhor Tully, nem ninguém pode saber o que realmente aconteceu naquela época", disse Bob Bannard, um dos diretores da organização.
Tully responde: "É muito estranho que três moças tão jovens tenham se interessado por literatura ao mesmo tempo e morrido pouco depois. Tudo leva a crer que tenham sido manipuladas".


Livro: The Crimes of Charlotte Brontë
Autor: James Tully
Lançamento: Robinson Publishing
Quanto: US$ 22 (282 págs.)


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