São Paulo, sábado, 10 de agosto de 2002

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Após recuperar a Pinacoteca, Paulo Mendes da Rocha volta ao centro de SP sob polêmica, com a nova praça do Patriarca

Um golpe no saudosismo

Raphael Falavigna/Folha Imagem
Vista da nova cobertura a partir do interior da praça; do lado esquerdo, a igreja de Santo Antônio, na rua Direita


FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Paulo Mendes da Rocha passeia pelas obras da nova praça do Patriarca. Vai de esquina a esquina, no afã de mostrar os recortes que criou na paisagem do centro da cidade com seu projeto.
A alva marquise metálica, de cerca de sete metros de altura, se ergue no largo onde funcionava um terminal de ônibus. Retirados os pontos, o piso de mosaico português foi refeito segundo o padrão original, de arabescos pretos, brancos e vermelhos.
O arquiteto, 73, volta a operar no centro de São Paulo, após uma aplaudida recuperação do edifício da Pinacoteca do Estado. Desta vez, porém, não chega cercado pela unanimidade.
A obra ainda não foi entregue -segundo a Empresa Municipal de Urbanização (Emurb), isso deve acontecer entre o final deste mês e o começo do outro, dependendo da agenda da prefeita Marta Suplicy (PT). No entanto a crítica já tamborila sobre a cobertura de Paulo Mendes da Rocha.
A marquise -que cobre a entrada para a galeria Prestes Maia, que liga a praça ao vale do Anhangabaú- desce em curva até quase tocar o chão, no lado em que desemboca o viaduto do Chá. Quem vem da direção do Teatro Municipal pode se indignar com o "roubo" da visão da igreja de Santo Antônio, na rua Direita.
Um dos que se intrigaram com a obra foi o promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo João Lopes Guimarães Júnior, 40.
Em abril, ele encaminhou um ofício ao Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo) para saber se a igreja era tombada -pela legislação, a visibilidade de um bem protegido não pode ser afetada. O Condephaat respondeu que sim, a igreja é tombada -mas também que autorizara a construção da marquise.
O promotor esclarece, porém, que o fato não encerra a questão. Ele informa que a investigação agora tramita na promotoria do Meio Ambiente e que, se a autorização for julgada ilegal, a prefeitura pode ter de desfazer a obra.
O arquiteto alinha argumentos anti-saudosistas, dizendo que, no lugar em que plantou sua estrutura, já havia uma "marquise aleijada", a qual, somada aos ônibus, é que era realmente daninha à visão da igrejinha cor-de-rosa.
A igreja, pontua Mendes da Rocha, é a "figura principal, extremamente delicada" da praça, "um monumento de sua época". (Um esclarecimento: apesar de a igreja ser do século 16, tendo sido até matriz da vila de São Paulo, a "fachada da discórdia" é um desenho de 1899, data em que a igreja passou por uma grande reforma.)
O arquiteto aponta, ainda, para o cuidado que teve ao plantar os pilares da marquise: o que está sobre a rua Direita cai exatamente sobre o alinhamento anterior de um palacete demolido para a construção do viaduto, em 1892.
O promotor Guimarães Júnior admite "certa subjetividade na questão da visibilidade", já que não há uma regra objetiva que determine, por exemplo, quão alta poderia ser a construção.
E afirma: "Não estou nem dizendo que o pórtico é feio ou bonito. Tenho o maior respeito pelo arquiteto". Para ele a questão é outra: "Não tem nenhum sentido ficar tombando bens se não é para cumprir a legislação".

Estar, e não passar
O ponto de partida do projeto era requalificar o espaço público de modo a tirar da praça do Patriarca a característica de local de passagem expressa. Ao fazer esse fechamento, estaria reconfigurando uma área que perdera a função de estar para a de passar.
A praça se encontra num ponto simbólico da região central, articulando o "centro novo" e o "centro velho". Na área, além do Teatro Municipal e do hotel Othon, iniciativas como o Centro Cultural Banco do Brasil e o shopping Light operam para o que se chama "revitalização" do centro.
O presidente da Emurb, Maurício Faria, 52, elogia o resultado do projeto e ressalta que a iniciativa partiu da associação Viva o Centro ("É produto de uma parceria"). Faria espera que a vocação da nova praça para atrair um público de usuários se afirme com ações conjuntas da administração municipal e dos equipamentos comerciais e culturais do entorno.
A própria filial do Masp que funciona na galeria Prestes Maia pretende dar seu quinhão para a revalorização do espaço.
Fechado por conta das obras da praça, o Masp-Centro será reaberto junto com ela, mostrando quadros de Gregório Gruber.
Tão logo seja possível, deve também passar por uma reforma -projeto do arquiteto Júlio Neves, diretor-presidente do Masp. Celso Vieira, 62, administrador do espaço, diz que a galeria ganhará auditório, biblioteca, café, elevador para deficientes físicos e ar-condicionado.
Tanto Vieira como o diretor da filial, Manoel Pires da Costa, 62, garantem que o uso da galeria pelo Masp não eliminará sua função de passagem viária: ela ficará fechada, "por segurança", só no período noturno, entre 18h e 7h.



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