São Paulo, sábado, 10 de setembro de 2005

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MÚSICA/CRÍTICA

"Chaos and Creation in the Backyard", novo CD do músico, tem lançamento mundial na segunda-feira

McCartney vagueia entre e melodia e sombra

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

É comum , ao falar de novos discos de artistas que já estão há séculos por aí, comentar que o tal álbum é a volta por cima da banda, que é o melhor disco do grupo desde... bem, desde algum ano do qual ninguém mais se lembra. Aconteceu com "A Bigger Bang", o último dos Stones, e talvez aconteça com este "Chaos and Creation in the Backyard", de Paul McCartney, que tem lançamento mundial na segunda-feira.
Mas há algumas diferenças. O argumento de que "A Bigger Bang" é o melhor disco dos Stones em 25 anos não quer dizer muita coisa, já que a banda não fez nada que prestasse realmente nos últimos 25 anos. McCartney, por outro lado, até que produziu coisa de qualidade nesse tempo, como "Run Devil Run" (tudo bem, um disco cheio de covers, mas são covers com personalidade toda própria), "Flaming Pie", "Tug of War", "McCartney 2"... E dá até para cair na armadilha: se não é o melhor, "Chaos and Creation" faz bela companhia a eles.
O álbum não vai converter ninguém a fã de McCartney, 63, mas vai agradar bastante quem acompanha e gosta deste beatle, hoje a maior lenda viva da música.
"Chaos and Creation" é o 20º álbum de estúdio de McCartney desde o fim dos Beatles, em 1970. Foi produzido por Nigel Godrich, o homem por trás dos melhores discos do Radiohead, mas que não é nenhum milagreiro, vide os CDs que produziu para o Travis.
Godrich viajou entre Los Angeles e Londres para ajudar McCartney no disco, durante dois anos. Sua mão é visível nas variações rítmicas de algumas canções, nas pontuações eletrônicas, no clima sombrio de certas baladas. A maioria das músicas tem em torno de três minutos; é álbum rápido, que não cansa, melódico, bem McCartney. Mas é um disco que vale pelo instrumental; as letras, várias delas, são sofríveis.
O primeiro single, "Fine Line", abre o álbum com classe. McCartney sabe construir melodias que grudam no ouvido. A música poderia ser um bom pop descartável, mas ganha contornos não óbvios de guitarra e teclados.
Já "How Kind of You" é uma bonita declaração de amor. "Pensei que tudo estava perdido/ Pensava que nunca encontraria alguém tão generosa quanto você". A melancolia logo toma as rédeas, em "Jenny Wren": "Como tantas outras garotas/ Jenny Wren podia cantar/ Mas um coração partido levou sua alma embora".
Em "Friends to Go", McCartney canta, quase suplica: "Estive esperando do outro lado/ Para que seus amigos saiam/ Então não terei que me esconder/ Prefiro que eles não saibam". "English Tea", de letra terrivelmente nonsense, sobre como seria passar manhãs tomando chá, é levada por um violino e piano -é a mais Beatles do álbum, e lembra muita coisa que está em "Let it Be".
"Riding to Vanity Fair" começa quase taciturna, bem lenta, mas vai ganhando corpo; parece que McCartney incorporou um Massive Attack. Outra boa surpresa é "Promisse to You Girl", em que o beatle canta: "Dei minha promessa para você, garota, Não quero quebrá-la/Você e eu, lado a lado, nós sabemos como mudar o mundo/ Por isso fiz a promessa a você, garota", e a harmonia alterna entre um rock de guitarra e um refrão com coro a la Beach Boys.
Mas há canções nada inspiradas. "At the Mercy" é uma típica música mccartiniana, com as inflexões vocais, introspectiva. Mas ele não ajuda quando canta "Se você me mostrar o amor, eu não vou recusar". "This Never Happened Before" e "Too Much Rain" são baladas redondas, de melodia fofa, mas que não chegam a empolgar. "Anyway" tenta encerrar o disco com alguma surpresa, trazendo barulhos, muitos efeitos psicodélicos, mas parece perdida, sem nada a dizer.
"Chaos and Creation" não é perfeito, mas quando McCartney acerta, ele pega fundo.


Chaos and Creation in the Backyard
   
Artista:
Paul McCartney
Lançamento: EMI
Quanto: R$ 35, em média



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